Pub.
Opinião
Tendência

EUA, a capital da 11ª Ilha!

Pub.

João Henrique Delgado da Cruz

A primeira parte do sonho já está confirmada. Era um sonho que antevia, com uma distância de anos luz. Mais parecia uma quimera!

Publicidade

Seguia entusiaticamente a Taça Amílcar Cabral, era a nossa máxima competição e fazia as nossas alegrias. Ouvia e lia notícias aqui e ali e publicava jornais de parede no Agá Doce, Ribeira Bote. Era o nosso ponto de encontro para os grandes debates futebolísticos.

Havia sempre jogadores da nossa zona na seleção – Zeca Marinho, Jon Bubu, Jorge Bocage, Lulu, Cau Bolo, Ducha, Sidónio, Djobla, Arlindo, Chalana, Virisse, Bissau, Delgado, Djô Brocô, Maiuca, Artur, Degolin – e convivíamos de perto com os craques da Bela Vista e arredores – Baiassa, Nimanda, Bassana, Gustavo, Gabs, Fefa, Prigoso, Quim, Almara, Dario, Ica, Tita, Agostinho, Berona, Jon d’Júlia, Cadino, Djack, Guto, Djon Guguta, Tchindin, Abel, Gabs, Cai, Fifip, Nha Capa, Calu Pitão, Djila, César Body, Jorge Regae, Toy d’Sal… e era amigo pessoal de três craques diferenciados – Zé d’Angola, Cula Frabola e Luís d’Fogo.

Publicidade

Sempre acompanhei a seleção! Lembro das extravagâncias de Du Fialho, o realismo do Toca, o pragmatismo de Armandinho, o elevar da fasquia com Platchakov… Entusiasmei-me com o projeto de Carlos Alhinho, a nova visão do Alberto, a resistência do Oscar, a efemeridade da passagem do Janito, do insucesso do meu amigo professor Beto, o profissionalismo de Alexandre Alhinho, o desconhecimento da nossa realidade do Ricardo da Rocha, a experiência fracassada com o Zé Rui, a elevação do Rui Águas, a transcendência do Lúcio, a excelência do João de Deus… mas quem me surpreendeu foi o Bubista num momento de descrédito em que a seleção se afastou de Mindelo e de muitos adeptos.

Percorri esses caminhos sempre com um sonho, sempre acreditei na potencialidade do jogador cabo-verdiano. Tive uma lista com todos os cabo-verdianos que jogavam em Portugal e seguia-os através do jornal ABola – Mariano, Paris, João Cabral, Spencer, Neno, Simão, Alexandre Alhinho, Zé Alhinho, José Rui, Álvaro Freitas, Jon Bubu, Zé da Rocha, Zé Maria, Abel, Dany, Kiki, Balalan (Itália), Delgado, Pinha, Hipólito, Zé d’Angola, Piguita, Brieguel, Bala, Box, Baroty,Tony Ravy, Nha Capa, Fefa, Peter, Zé Piguita, Raul, Celestino, Chico Niquita, Djô Brocô, Bissau, Hélio, Vinha, Berrá, Nilton, Toy d’Sal, Djaca, Tchindin, Fuminha, Cau, Tinaia, Cadu, Patch…

Publicidade

Exultei-me com com a proeza do Académico de Viseu, a equipa mais cabo-verdiana que Portugal já viu, obra do inolvidável Carlos Alhinho, que mostrou-me o que eu já tinha vislumbrado. Ganhou o campeonato da segunda divisão com nove cabo-verdianos. O cabo-verdiano tem jeito para o desporto e ama o futebol!

Desde o momento que a FIFA anunciou os EUA como um dos anfitriões da Copa 2026 “o primeiro país a acolher emigrantes cabo-verdianos” o sonho começou a enformar-se. Pensei, “será o país que nos vai acolher na nossa primeira copa!” Se há duzentos anos fomos pescar baleias, agora vamos caçar reconhecimento e eternidade!

O dito será feito!

Um jogo de Cabo Verde em qualquer estado do Golfo de Maine terá o estádio lotado de cabo-verdianos e descendentes. Estima-se que existam mais cabo-verdianos e descendentes nos EUA do que no território nacional. “Os deuses reuniram em Consílio e determinaram um jogo em Massachusetts, Foxborough, entre Cabo Verde e Estados Unidos na inauguração do certame”.

Assim começa a segunda parte do meu sonho! No Gillette Stadium, a vinte e tal quilómetros de Boston. Estive nesse estádio a 28 de julho de 2019, num jogo de pré-época entre o Benfica e o Milan. Morava a cinco minutos a pés desta maravilhosa obra arquitetónica, casa da equipa de futebol americano New England Patriots e do clube de futebol New England Revolution. O estádio estava repleto de italianos, portugueses e cabo-verdianos. Comentei com o meu irmão “um dia Cabo Verde vai jogar aqui”.

Emocionante…

Estar no Gillette é uma sensação de leveza insustentável. O estádio é lindo, super organizado, com muitos banheiros e lugares para venda de comida e bebida. Muita organização para entrar e sair, sem tumulto.

Assim… nesse jogo inaugural a 11 de junho de 2026, a lotação de 65.878 lugares está esgotada… estranhamente, ou não, parece que tem mais cabo-verdianos que americanos. Trump queria mudar os Estádios para estados republicanos, mas a FIFA foi intransigente. Estamos em casa, na região mais populosa da 11ª ilha – Golfo de Maine, portos de baleeiros.

Se os deuses continuarem favoráveis, o segundo jogo será no MetLife Stadium, em New Jersey. Localizado perto de Nova York, o estádio é a casa das equipas de futebol americano New York Jets e New York Giants. De novo em casa… e os meus amigos dizem maravilhas deste estádio e do ambiente que cria. A terceira parte fica para depois…

Agora um pouco de REALIDADE.

O feito de Cabo Verde tem maior relevância quando se comparam o valor dos planteis. Segundo o Transfermark, nosso plantel vale 27M€. Somos o 19º de África. Somos a única seleção africana estreante e a 14ª seleção africana a participar numa copa.

Dos apurados, só ultrapassamos a África do Sul que no onze titular só tem jogadores que jogam nas equipas locais. Somos a única seleção africana estreante e a 14ª seleção africana a participar numa copa.

1. Marrocos – 7 participações

2. Senegal – 4 participações

3. Costa do Marfim – 4 participações

4. Gana – 5 participações

5. Argélia – 5 participações

Artigos relacionados

6.Egito – 4 participações

7. Tunísia – 7 participações

8. Cabo Verde – primeira participação

9. África do Sul – 4 participações

Até agora, de todas as seleções apuradas, os únicos estreantes são Jordânia, Uzbequistão e Cabo Verde. O nosso treinador tem o menor salário entre as seleções apuradas.

Das seleções apuradas, somos o único país com um único estádio em condições de receber jogos internacionais! Somos a seleção mais cosmopolita com jogadores atuando em mais de vinte países diferentes. Na última convocatória, Portugal foi o maior fornecedor com 6 convocados, seguido da Bulgária e Israel com 3. Dependemos 100% da diáspora na constituição do plantel.

Além do amadorismo, o campeonato interno tem o calendário menos duradouro do mundo (os campeonatos regionais variam entre 6, 14 e 18 jogos anuais, mais 8 a 10 jogos para os finalistas nacionais). Em dimensão territorial somos o mais pequeno país a participar numa copa. Somos o segundo menos populoso, seguidos da Islândia. Por isto e muito mais, de certeza, somos os mais felizes!

Mostrar mais

Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

Artigos relacionados

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo