CVT recupera relógio do Ex-Telégrafo do Mindelo: Regresso ao futuro das memórias de um itém emblemático

O relógio antigo fixado no edifício do ex-Telégrafo do Mindelo (Western Telegraph C°) desde os finais do século dezanove foi recuperado e funciona como novo. Item emblemático da cidade, o relógio guarda histórias no tic-tac dos seus ponteiros e agora dá vida às memórias daqueles que ainda sobrevivem ao seu tempo. Numa época em que a energia eléctrica era um recurso escasso e inacessível a muitas famílias, estudantes mindelenses aproveitavam da luz do relógio para estudar, sentados no chão até de madrugada, num espaço que era reduzido e ocupado por aqueles que conseguissem chegar primeiro.

Para Daniel Conceição, emigrante reformado na Holanda, para além de ajudar nos estudos, o local era para os jovens um ponto de contacto social. Por outro lao, os rapazes aproveitavam a oportunidade para “reparar nas colegas do sexo feminino, mas sem outras intenções”, explica. “Antes, quando vinha de férias para Cabo Verde, sentia uma pontada de tristeza ao constatar que o relógio, degradado, não funcionava mais. A sua recuperação é um prazer para nós e traz um quê de emoção e nostalgia”, assume, que vê esse relógio como um património que influenciou o imaginário de uma geração.

O relógio também era consultado por pessoas que queriam regular os seus relógios pessoais. O emigrante Valdemar Pereira conta, com saudades, que o local foi um ponto de encontro  diário, onde se podia encontrar (quase a hora certa) cada um a cronometrar os relógios baratos que teimavam a não marcar as horas devidamente, razão pela qual tinham de ser ajustadas. “Em determinada altura, negociantes de bordo apareceram com relógios que vendiam a 25$00, obtidos, não se sabe bem como, a bordo de barcos. Evidentemente que, por esse preço, não podiam ser nenhum Ómega. Por isso, os rapazins que teimavam em marcar pontos junto das mocinhas, não podiam fazer outra coisa senão ir ficar olhando para o célebre ‘relógio do Telégrafo’ até os ponteiros do adorno ficarem justinhos”, relembra.

Depois de muito tempo sem funcionar e praticamente esquecido, o grupo CV Telecom resolveu proceder à sua recuperação, assim como de todo o quarteirão, que inclui ainda o edifício do Ex Telégrafo do Mindelo. “Estamos no processo de recuperação de todo o quarteirão, com pinturas e recuperação de paredes. Neste sentido, a recuperação do relógio era um dos objectivos, tendo em conta que já estava avariado há bastante tempo e faz parte da própria história da cidade do Mindelo”, explica a directora da região norte da CV Telecom, Isa Neves, que diz ainda terem recebido vários pedidos de pessoas que conhecem a história do relógio e que não queriam ver perdido esse “monumento”. “Pensamos que seria interessante devolver o edifício para a cidade, incluindo o relógio funcional. Portanto, lançamos um desafio aos nossos técnicos para procederem à restauração da parte mecânica, eléctrica e exterior da caixa.”

Segundo Isa Neves, na altura da retirada do relógio do local para a sua recuperação, a CV Telecom recebeu várias reclamações de pessoas que não sabiam o por quê da sua ausência, o que confirma a importância dessa peça para a história do Mindelo. Agora, o que a empresa tem recebido, segundo a directora, são demostrações de satisfação por parte das pessoas, o que deixa claro o carinho que têm pela sua história e pelas suas memórias.

As obras em todo o quarteirão estão na sua fase final, faltando apenas a reposição de algumas janelas e vidros quebrados, que já estão a se confeccionados, portanto, tudo deve ficar pronto dentro de um mês, conforme avança Isa Neves. O grupo ainda está a estudar o novo destino para o edifício do Ex Telégrafo. Antes disso, serão ainda realizados trabalhos na parte interior do edifício, numa outra fase das obras.

A directora da CV Telecom Norte faz ainda um apelo ao civismo das pessoas, no sentido de não colar cartazes nas paredes do edifício. “Das outras vezes que pintamos as paredes, as pessoas voltaram a colar cartazes logo de seguida. Desta vez já afixamos algumas placas de proibição para ver se as pessoas respeitam as regras. Elas reclamam que as instituições não fazem a recuperação dos edifícios, mas depois não colaboram.”

Natalina Andrade (Estagiária)

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