Gilda Monteiro desafia os jovens mindelenses a sonhar, ousar e pegar o destino nas suas mãos

A cabo-verdiana Gilda Monteiro, emigrante na Bélgica, incitou os jovens mindelenses a sonhar, listar projectos e a agarrar o seu futuro, numa entrevista exclusiva ao Mindelinsite e testemunhada por alunos do 2º e 3º ano do curso de Ciências de Comunicação da Universidade Lusófona. Esta foi, aliás, a mensagem que esta jovem, que é líder associativo e activista político no seu país de acolhimento, trouxe para o primeiro Tedx Mindelo, que aconteceu na semana passada em São Vicente. Gilda aproveitou ainda para relatar a sua experiência, que começou ainda criança no campo de Golfe na Ribeira d’Julião em São Vicente, onde morava, passando por uma licenciatura em Portugal, um mestrado na Bélgica, seguido de uma carreira profissional de sucesso, que lhe garantiu o prémio “Best Manager of The Year”. Outra experiência positiva, que não podia deixar de falar, foi a sua candidatura, enquanto conselheira, à Câmara Municipal de UCCLE.

“Sempre fui uma pessoa de iniciativa, activa, interessada e sem medo do desconhecido. Nasci e cresci em São Vicente, de uma família de parcos recursos – meu pai era guarda. Fiz o meu percurso académico – primária e secundária – aqui nesta ilha. Aos 19 anos, parti para Portugal, com uma bolsa. Fiz uma licenciatura em Gestão Hoteleira. No quadro do programa Erasmus – intercâmbio de alunos e professores das universidades europeias -, conheci o meu marido e viajei para Bélgica. Lá fiz um mestrado e iniciei um estágio de seis meses numa agência que se ocupa de internacionalização de empresas para todo mundo”, apresenta-se Gilda Monteiro.  

Com dois diplomas em mãos – licenciatura e mestrado – foi procurar emprego. Sem experiência profissional, começou por baixo, mas sempre de cabeça erguida porque, lembra “o caminho faz-se caminhando“. “Tive uma oportunidade numa empresa flamenga – na Bélgica fala-se duas línguas: flamengo e francês -, que não era propriamente na sua área. Trabalhei como comercial, sendo que tinha três áreas importantes sob a minha responsabilidade: energia, telecomunicações e seguros. A minha função era desenvolver a carteira de clientes da agência, mas fui muito além das minhas funções. Quando a empresa ia abrir um novo escritório na cidade de Liége, fui convidada para ser a responsável. E, menos de dois anos depois, fui recompensada. Fui distinguida com o prémio ´Best Manager of de Year`”.

Incentivada, resolveu ousar e abriu a sua empresa. Paralelamente, iniciou uma carreira política na Bélgica, concorrendo ao cargo de conselheira da Câmara Municipal de UCCLE. “Acho que sou política por natureza. Em 1991, ainda em Cabo Verde, não podia votar, mas acompanhei toda a movimentação política. Na minha casa também sempre havia jornais e discussões políticas. Identificava-me com a ideologia do MpD. Na Bélgica, fui mandatária da candidatura de Jorge Carlos Fonseca. Também fiz parte da comissão política do MpD nas legislativas de 2016. Mas, no país onde vivia, procurei também uma família política próxima da minha ideologia. Hoje sou do Movimento Reformador, partido de centro-direita liberal. Tudo isso para dizer que somos nós que temos de fazer o nosso percurso e ganha-pão.”

TEDx Mindelo

Foi esta rica experiência, os desafios e projectos que esteve envolvida, inclusivo os que fracassou, que Gilda Monteiro trouxe ao TEDx Mindelo. Foi uma das oradoras convidada desde evento, que considera uma das grandes actividades realizadas nesta ilha. “O TEDx Mindelo foi muito importante. Estamos a falar de um evento mundial, que chegou a São Vicente. Espero que haja mais iniciativas do género em São Vicente. Esta ilha precisa de uma nova dinâmica. Felizmente, passa a ser anual. É triste ver esta ilha assim, estagnada. A meu ver, os emigrantes têm um papel importante a desempenhar no processo de sacudir esta ilha. Sinto-me um bocadinho revoltada com a frase que virou moda ´tud manera ê bá dvagar’. Precisamos quebrar este ciclo. Temos muitas potencialidades. Temos jovens poderosos. Cada um pode criar a sua actividade, sonhar e ousar, sem medo de errar.”

Nesta óptica, esta emigrante está a costurar uma geminação entre as Câmaras de Uccle, um dos 19 municípios da Bélgica, e a de São Vicente, dois municípios com a mesma dimensão e uma densidade populacional muito próxima, 85 mil habitantes. Esta tem também uma forte componente desportiva, à semelhança de São Vicente, onde se pratica, a par dos desportos tradicionais, o golfe e o cricket. “Contei esta história ao burgomestre de Uccle, com quem tenho uma grande proximidade. É um individuo jovem, de 45 anos, e mostrou interessado. É isso que faço lá fora. Falo de Cabo Verde em qualquer lugar. Digo sempre que cada crioulo no estrangeiro é um embaixador do país. Tentei falar com o presidente Augusto Neves em Março, quando estive aqui para ver o carnaval, mas não foi possível. Agora infelizmente também não. Mas encontrei com a presidente da Assembleia Municipal. Estou confiante.”

Em carteira tem ainda um projecto, enquanto presidente da Associação Morabeza, formada por cabo-verdianos na Bélgica, para apoiar as Aldeias SOS. Neste sentido, aproveitou a estada em São Vicente para visitar este espaço na Ribeira d’Julião, realçando que decorre neste momento no país de acolhimento uma campanha de recolha de donativos para enviar para esta ilha. “Fizemos uma comunicação em vários idiomas, porque não recebemos apoio apenas de crioulos. A resposta foi imediata. Neste momento já estamos na fase de empacotamento dos donativos para enviar para Cabo Verde. Também estamos a ajudar a Aldeia com o apadrinhamento de algumas crianças. E estou a levar na minha bagagem mais alguns projectos para ver como os podemos financiar”, revela esta líder-nata.

Ainda em São Vicente, Gilda conta que visitou e pernoitou na Casa d´Tambor, acompanhada de uma outra cabo-verdiana muito dinâmica que reside na Holanda, Alice Judite Fortes, para vivenciar a experiência deste projecto. De regresso a Bélgica, promete fazer a promoção deste projecto por onde passar. Enquanto isso, diz, a associação que preside está a preparar a tradicional festa de São João, que anualmente junta a comunidade cabo-verdiana residente em Antuérpia e Bruxelas. Esta festa vai acontecer nos dias 6 e 7 de Julho, uma semana depois da celebração de San Jon na Holanda, uma forma de rentabilizar os artistas e instrumentos.

Constânça de Pina

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