Presidente da Associação Pro-Praia: “Quando vejo a intervenção do Sokols sinto-me mais forte”

O presidente da Associação Pro-Praia considera normal e até salutar a movimentação cívica em S. Vicente liderada pelo movimento Sokols, apesar de entender que muitas vezes acaba-se por atirar farpas à Capital por causa da centralização. Para José Jorge Pina, a sociedade civil precisa de espaço para se exprimir e não há incompatibilidade entre o trabalho desenvolvido pelos “falcões” em S. Vicente e a organização Pro-Praia. No entanto, entende que as intervenções dos dois grupos não se complementam, pelo simples facto de o Sokols ter no seu seio membros com a pretensão de conquistar o poder autárquico, quando isso já não é permitido na organização praiense. Para esse dirigente, a centralização existe de facto em Cabo Verde e entende que a concentração de investimentos num único espaço é prejudicial para o país. “Somos contra esse princípio, mas nos acusam de querermos tudo para Praia”, frisa José Jorge. Nesta conversa com o Mindel Insite, o representante da Pro-Praia revela que a proposta do Estatuto Especial da Praia já está pronta para ser levada ao Parlamento em Agosto, mas mostra-se receoso sobre o resultado da votação. Como diz, o PAICV e o MpD são a favor, a UCID ainda é uma incógnita, mas reina uma certa contestação social que poderá influenciar a posição dos deputados. Confirma que o documento prevê a alocação de verbas à Capital proveniente do OGE e a equiparação do estatuto do edil da Praia ao de um Secretário de Estado. Ele próprio, no entanto, faz tábua-rasa desse poder que se pretende atribuir ao presidente da CMP por entender que não será por aí que se vai resolver os problemas da cidade da Praia.

Por Kim-Zé Brito

Mindel Insite – Como a Pro-Praia encara as movimentações que acontecem por esta altura em S. Vicente, nomeadamente os protestos organizados pelo movimento Sokols?

José Jorge – Estou do mesmo lado do Sokols, portanto acho bem essas acções. Digo que estou do mesmo lado na medida em que a sociedade civil tem de conquistar o seu espaço para se expressar. É importante isso acontecer porque há aspectos e situações que não interessam aos políticos, mas que precisam ser vistas.

MI – Vê alguma complementaridade entre o trabalho que o Sokols faz em S. Vicente e o da Pro-Praia aqui na Capital?

JJ – Não há complementaridade porque cada tem os seus métodos e a sua natureza. A Pro-Praia tem as suas atribuições e balizas. Por exemplo, nós não temos pretensões políticas enquanto que o Sokols visa atingir patamares políticos.

MI – Qual a pretensão política do Sokols?

JJ – Por aquilo que percebo, alguns elementos do grupo vão estar na corrida para a Câmara de S. Vicente.

MI – Está a falar de membros, de pessoas particulares, e não do movimento em si.

JJ – Sim, mas são pessoas que representam o Sokols e que defendem a intervenção na vida política de não-partidários.

MI – Acha que isso é mau?

JJ – Muito pelo contrário, acho que estão certos. É pena que não haja essa possibilidade nas eleições Legislativas, pois tem que se concorrer num partido. Na Singapura há um esquema que permite o recrutamento para funções políticas de pessoas que não concorreram, mas que têm reconhecidas competências. Se esses tais membros do Sokols querem assumir a Câmara de S. Vicente é porque acham que quem está no poder não está a fazer um bom trabalho.

MI – Na Pro-Praia não têm a pretensão de assumir o poder autárquico?

JJ – Não, não temos esse objectivo. Queremos é fazer o nosso trabalho, senão, às tantas, haverá uma crítica legítima dos outros membros de que usurpamos a natureza da organização e estragar tudo aquilo que fizemos até agora.

MI – A Pro-Praia, sendo uma associação de intervenção cívica, não está também a fazer política?

JJ – Sim, afinal o homem é um animal político. Estamos a fazer política, não nego isso, mas com o intuito de contribuir para a resolução dos problemas socioeconómicos e não no sentido partidário. Na nossa associação rege o princípio segundo o qual um membro da direção de um partido não pode fazer parte da direcção da Pro-Praia. Pode apenas ser membro.

MI – A Pro-Pria tem tido alguma atitude crítica em relação ao poder Executivo e à Câmara da Praia ou é uma organização que se posiciona sempre como um aliado?

JJ – Quando as coisas correm bem somos aliados porque o nosso objectivo é intervir para que as decisões e intervenções sejam em prol do desenvolvimento integral e sustentável da Praia.

MI – A organização defende a ideia de “tudo” para Praia?

JJ – A nossa visão não se restringe ao desenvolvimento da Praia, mas sim que isso ocorra dentro de um contexto nacional. Queremos estar na agenda dos assuntos prioritários de Cabo Verde e receber a nossa quota-parte. Entendemos que é preciso haver um equilíbrio em Cabo Verde para promover o desenvolvimento das várias ilhas e cidades. O crescimento de uma única cidade, onde tudo está concentrado, não funciona e não assegura o desenvolvimento de um país inteiro. Somos contra esse princípio, mas ás vezes nos acusam de querer tudo para Praia.

A centralização existe “de facto”

MI – Quando acontecem protestos em S. Vicente há sempre uma tendência em se pensar que são contra os praienses e a cidade da Praia. Como vê essa questão?

JJ – De facto há manifestantes que se expressam de tal forma que passam essa ideia, pessoas que acabam por agir no calor do ambiente ou porque estão incomodadas e saturadas com certas coisas. Pessoas que entendem que S. Vicente tem estado a ser prejudicada de propósito pela cidade da Praia, nomeadamente com o bloqueio e o desvio de investimentos e projectos.

MI – A referência “Praia” é entendida como a cidade da Praia e os seus cidadãos ou como um sistema político-administrativo instalado na Capital?

JJ – Tenho a impressão de que as pessoas criticam aquilo a que chamam Centralização, algo que de facto existe. O Estado aqui em Cabo Verde e noutras partes do mundo instala certas instituições na Capital, como acontece em Lisboa, Paris ou Washington. Mas vejo que os cabo-verdianos acham que isso não tem de ser assim no arquipélago e reclamam.

MI – Se a Capital estivesse no Sal e houvesse uma manifestação na Praia contra a centralização isso seria visto como um ataque aos cidadãos salenses ou contra o sistema?

JJ – Como eu disse, as pessoas criticam a centralização que, por acaso, acontece na Praia. Algumas resvalam-se e atacam, por exemplo, a construção de um hospital. Ainda ontem recebi a confirmação de que vai haver, realmente, um hospital de referência.

MI – Concorda ou não que continua a haver investimentos na Praia e que tendem a aumentar o nível de centralização dos poderes político, económico e administrativo, apesar das críticas contundentes e manifestações populares?

JJ – Acho o seguinte: vive na cidade da Praia um grande contingente populacional, à volta de 300 mil habitantes e é preciso criar condições para apoiar o crescimento. Sem crescimento não há emprego para tanta gente que reside aqui. Não acho que se deva parar o ritmo de crescimento de uma ilha com medo das acusações de centralização. Deve-se é apoiar aquilo que está a crescer para poder dar suporte a esse processo de desenvolvimento. Agora, eu acho que se deve dar também aos outros as suas possibilidades. A solução não será parar uma ilha para as outras poderem desenvolver. Eu penso que o governo actual está a fazer isso.

Temos a lista dos investimentos para S. Vicente como o Terminal de Cruzeiros, melhorias no hospital, estradas… e consideramos que são boas obras. Da mesma forma há uma lista de investimento para Praia e acho que são equilibrados. Cada ilha tem de ter uma estratégia de desenvolvimento abrangente. Se é isso que o Sokols defende estamos do mesmo lado. Quando vejo a intervenção do Sokols sinto-me mais forte.

MI – Para si não há então incompatibilidade entre as duas organizações?

JJ – Nem por isso, apesar de às vezes acontecerem desvios e a tendência para se atacar a Praia em vez de se colocar o foco na questão da centralização.

MI – Se reparar, a direcção do Sokols costuma dizer que defende um Cabo Verde equilibrado e justo e que a própria Praia tem problemas bicudos na periferia e que merecem atenção.

JJ – Como eu disse há excepções, pessoas que atacam a instalação de determinados projectos em Santiago por causa da centralização. É preciso entender que não se pode construir um hospital de referência em cada ilha e ter em consideração a quantidade de pessoas que residem nesta ilha.

MI – Faz referência aos milhares de pessoas que vivem na Praia, mas concorda ou não que isso resulta da centralização dos poderes e das oportunidades de emprego criadas pelo Estado na Capital. É ou não verdade que esse aspecto é sistematicamente usado como justificativa para mais investimentos aqui, em vez de se criar condições para as pessoas ficarem nas suas cidades ou até regressarem às suas ilhas?

JJ – Há que se levar em conta que, de facto, há ilhas mais bem equipadas do que outras. A tal assimetria e que é um problema reconhecido pelo próprio governo. No entanto, é preciso reconhecer que o Executivo está a tentar equilibrar a balança, criando uma agenda para as ilhas. A cidade da Praia tem também as suas necessidades. Por exemplo, não temos ainda um parque industrial, quando todos os dias chegam cá investidores. Chegamos a enfrentar sérias dificuldades com a Electra no tocante ao abastecimento de água e energia; por outro lado a nossa taxa de saneamento é de apenas 40 por cento…; enfim, não andamos a pedir projectos de luxo, como Terminal de Cruzeiros.

“Ainda Santiago não foi dotado do aeroporto que merece”

MI – Como classifica a obra no Aeroporto da Praia, que há anos vem recebendo melhorias sucessivas?

JJ – Acha que o aeroporto da Praia é uma obra de luxo?

MI – Comparativamente a realidade dos aeródromos e mesmo, por exemplo, do aeroporto de S. Vicente que sequer consegue receber voos quando há bruma…

JJ – Se for ver, os investimentos feitos no aeroporto de S. Vicente versus tráfico são superiores ao do aeroporto da Praia. Como sabe, a nossa pista tem pouco mais de 2000 metros de comprimento e ainda Santiago não foi dotado do aeroporto que merece, uma infraestrutura para servir agora e no futuro. Portanto, há muito que se lhe diga. Em relação ao Porto da Praia é bom referir que ainda não temos um porto de cabotagem nem de pesca. Neste sector do mar não dispomos de coisas elementares e que existem em S. Vicente. Não vou agir contra S. Vicente, mas sim a favor daquilo que a nossa actividade económica reclama. Precisamos de muitos investimentos pois a cidade da Praia ainda não tem condições de capitalidade, sequer tem o devido saneamento, um porto que vale, um centro para grandes reuniões como há em todas as capitais. Santiago recebeu a Capital, mas não recebeu condições para exercer a função.

Estatuto Especial para reorganizar as “cidades” dentro da Praia

MI – Diz que Praia não recebeu as condições para exercer a capitalidade, daí que lhe pergunto como é que o Estatuto Especial vai resolver os problemas que diz existirem na cidade?

JJ – Há uma vertente no Estatuto que nunca se fala, que é a organização administrativa. O nome correcto é Estatuto Especial Administrativo da Praia. Primeiro é preciso organizar a cidade porque os poderes já deram conta que estão a ser criadas várias cidades dentro da cidade da Praia, caso do Palmarejo e da Cidadela. Neste último local está a acontecer uma situação explosiva porque devia ser infra-estruturado e ainda isso não aconteceu. Os inquilinos estão a viver sem saneamento concluído, com deficiências na iluminação pública, uma asfaltagem de porcaria e sem água.

MI – Como é que o Estatuto Especial vai resolver esse e outros problemas?

JJ – Em primeiro lugar vai criar estruturas administrativas para dividir a cidade em cinco regiões, conforme a última versão da proposta, e criar órgãos para administrar essa imensidão que são as cidades dentro da própria Praia. Está previsto um montante para ser aplicado em equipamentos urbanos que deixam falta para a própria capitalidade, como a ETAR, o serviço de cabotagem, o saneamento, o ordenamento da cidade… A Pro-Praia propôs ao Governo um programa especial de habitação social porque aqui na Praia não há casas para pobres. Basta ver a quantidade de casas penduradas nas rochas.

MI – Este cenário acontece em todas as ilhas.

JJ – É verdade, mas em S. Vicente esse lado social é trabalhado muito bem, pois estão a aproveitar o programa do Governo para reabilitar as zonas carentes, mas aqui na Praia não temos nada disso.

MI – Como diz, o Estatuto determina a alocação de um determinante montante para a cidade da Praia poder aplicar na resolução dos problemas. As pessoas criticam esse Estatuto por entenderem que o objectivo é “desviar” mais dinheiro para a Praia. Isto corresponde?

JJ – O Estatuto estabelece o direito a uma pequena percentagem do Orçamento do Estado a ser canalizado para o poder local, mas acho que, se é para provocar conflitos e críticas sobre a pretensão da Praia em açambarcar mais meios financeiros, seria preferível encontrar outras vias como as derramas municipais. Para que o próprio município, com a sua actividade económica, possa cobrar taxas para alimentar um fundo próprio de financiamento. Portanto, os dois pontos salientes do Estatuto relacionam-se com o aspecto administrativo e a disponibilização de um pouco mais de recursos financeiros.

MI – E se, decorrido uns pares de anos, o Estatuto revelar-se ineficaz para o propósito a que foi atribuído, ou seja, a resolução dos problemas que se diz serem derivados do peso da capitalidade e da concentração populacional? O que virá a seguir?

JJ – Outros métodos. O Estatuto Especial existe em muitas cidades do mundo, nomeadamente no Brasil. Por exemplo, se estamos numa cidade sem lotes para pobres, o Estatuto possibilita a criação de espaços para assentamentos. De outra forma fica difícil porque o mercado rege-se pela lei da selva e corta as hipóteses. A Constituição dá a cidade da Praia o direito a esse Estatuto, mas creio que irá vigorar por uns tempos.

MI – Há quem defenda que o Estatuto Especial deveria ser sim atribuído a ilhas como S. Nicolau, Brava, Maio, e não à cidade da Praia que já usufrui da presença do aparelho do Estado, dos serviços diplomáticos, além de concentrar os poderes das máquinas partidárias.

JJ – Acho que essas ilhas estão realmente mal equipadas e merecem uma atenção especial. E têm vindo a merecer essa atenção deste e dos governos anteriores. Veja que a ilha do Maio vai ter o seu porto. Gostaria de ver um projecto num outro local, mas a infraestrutura vai ajudar a desenvolver o seu turismo…; Acredito que os cabo-verdianos estejam com medo do custo financeiro resultante do Estatuto, mas Praia não vai receber assim tanto dinheiro. Na minha opinião esse montante nem deveria vir do Orçamento do Estado. É possível criar impostos para que a própria cidade consiga sustentar o seu desenvolvimento.

Equiparar status do edil da Praia a Secretário de Estado

MI – Disse que já tem conhecimento da última versão do EEAP, confirma que o documento estabelece que o Presidente da Câmara Municipal da Praia passa a ter um estatuto equiparado ao de um ministro?

JJ – Seria uma equiparação a um Secretário de Estado.

MI – O que justifica isso, qual o argumento?

JJ – Repare, vai-se governar uma cidade com uma organização mais complexa e que vai dispor de condições financeiras especiais. Entende-se que, para o autarca poder exercer essa função numa condição de especialidade, deva ter um estatuto ou poder um bocadinho acima de o do Presidente da Câmara.

MI – Como é que essa equiparação vai ajudar a resolver os problemas “estruturais” da capitalidade?

JJ – Vamos passar a ter um presidente de câmara que terá mais força de negociação. Neste ponto, no entanto, faço tábua-rasa; isso é trabalho para análise dos cientistas da administração. Há gente na cidade da Praia que não faz questão da equiparação do Presidente a Secretário de Estado, pois não será por aí que se vai resolver os problemas.

MI – Como acha que os Presidentes das outras Câmara vão ver esse status especial do edil da Praia, esse aumento de notoriedade e de poder?

JJ – Como cabo-verdiano sei que não vão encarar isso de ânimo leve, mas ainda não sei se haverá essa equiparação. Por mim, não será por causa disso que os problemas serão mais facilmente solucionados. A questão é de carácter administrativo e financeiro: haver um fundo e uma reorganização administrativa.

MI – Neste momento não é possível fazer essa tal reorganização administrativa, sem esse estatuto?

JJ – Penso que é sempre possível, mas o estatuto é para enquadrar as motivações e estamos perante um preceito constitucional. Podia-se fazer essa reorganização, mas com um amparo legal é mais adequado para precisamente se estabelecer as condições, neste caso uma condição especial e que apela a um enquadramento legal.

MI – Esse Estatuto não poderá criar um precedente e outras regiões virem reclamar algo similar, embora, no caso da Praia conste da Constituição?

JJ – É a mesma coisa que defendi quando se falou num debate na rádio sobre a criação de duas regiões em Santiago. Eu defendo as duas regiões quando vejo a particularidade de Santiago Norte, que é uma das zonas mais pobres de Cabo Verde. No dia em que Santo Antão alcançar essa complexidade, dispor de 100 mil habitantes no Norte ou no Sul, deve merecer ser “cortada” ao meio. A ilha de S. Vicente também pode merecer um pouco mais que uma região?! Estamos de acordo, mas não somos políticos para decidir. Repare que o estatuto especial foi aprovado pela unanimidade dos deputados, está escrito na Constituição e devemos respeitar. Ainda há dias o Sr. Primeiro-ministro confirmou que o diploma será levado ao Parlamento no mês de Agosto.

Estatuto Especial sob risco de chumbo na AN

MI – E se a proposta for chumbada, uma vez que precisa do voto de 2/3 dos deputados, tal como a Lei da Regionalização? Como é que a Associação Pro-Praia iria reagir?

JJ – Não sei dizer-lhe neste momento, mas não espero que isso venha a acontecer. Os dois partidos do arco do poder, com excepção da UCID – que vejo ter reticências sobre essa matéria – já mostraram estar a favor da aprovação. Repare que o PAICV chegou a apresentar uma proposta, entretanto chumbada porque o MpD na altura nem quis ouvir falar do assunto porque diz que não estava de acordo com o figurino. Agora é o próprio MpD que está a levar uma proposta. Logo, não vejo por que motivo iriam votar contra.

MI – O PAICV apresentou essa proposta no tempo em que José Maria Neves era presidente do partido. Entretanto houve mudanças no partido, é certo que Janira H. Almada é a favor do EEAP, mas está-se perante uma pressão social contra esse documento. Acha que não poderá haver alguns deputados contra esse estatuto?

JJ – Houve uma evolução clara, por isso, quando me perguntaram na rádio a minha perspectiva sobre o Estatuto Especial, reconheci que a situação actual não é tanto assim favorável. A situação mudou, hoje fala-se na Regionalização, há mais sensibilidade para que as regiões tenham as condições para se organizarem e tratarem do seu próprio desenvolvimento.

MI – A proposta da Regionalização foi reprovada, hoje está suspensa e não se sabe quando será ressuscitada. Esse chumbo não poderá contrariar a aprovação do Estatuto Especial?

JJ – Pode ser, reconheço, porque estamos numa maré de dúvidas. Há uma tendência para que cada ilha seja vista na sua singularidade e neste momento não estamos diante dos mesmos políticos que outrora estavam seguros da pertinência do Estatuto Especial. Hoje, é certo, nem todos pautam por essa lógica.

Desmistificar a Regionalização

MI – A bandeira da Regionalização foi hasteada a partir de S. Vicente, mas inicialmente essa ideia foi malvista aqui na Praia. Houve controversas, que, entretanto, foram em boa parte dissipadas. O que mudou para a ilha de Santiago passar a ser neste momento uma acérrima defensora da Regionalização?

JJ – Acho que é preciso explicar as pessoas determinados conceitos e nem toda a gente em Cabo Verde ainda tem a plena consciência das implicações da Regionalização. Em Santiago viu-se que essa matéria traz vantagens. Fomos discutindo o assunto e a mostrar as pessoas que é bom que cada região tenha um tipo de governo. Eu defendo isso. A Regionalização que esteve em votação é administrativa, mas defendo até um governo regional.

MI – A Pro-Praia não era inicialmente a favor da Regionalização…

JJ – Tal como outros cabo-verdianos precisávamos entender o alcance do sistema e achávamos que ainda o municipalismo tinha um espaço de progressão. Podia-se dar mais poder e dinamizar as coisas se a preocupação era levar o poder para mais junto das pessoas. Hoje em dia estou na posse de mais dados sobre a Regionalização, tive a oportunidade de estudar a Lei da Regionalização e achei que não havia problema nenhum. A Regionalização pode ajudar a solucionar problemas locais e um dos assuntos que nos preocupa na cidade da Praia tem a ver com o sector marítimo. Há marinheiros que não podem navegar porque não têm dinheiro para ir a S. Vicente fazer uma formação que acontece de vez em quando. A situação está péssima, as pessoas não conseguem formar-se na área do mar.

MI – Quer dizer que há queixa de centralização de um lado e do outro?

JJ – Exactamente, nós também precisamos de ter certos serviços. Acredito num modelo em que cada ilha tenha capacidade de desenvolver as suas vocações. Há ilhas que realmente precisam de mais atenção e, se podem conseguir isso através da Regionalização, então que seja. Repare que a própria Lei diz que é um processo que exige capacitação técnica e estabelece como a Regionalização vai se processar. Eu não tenho prolema com a descentralização, acho justo. Todos os elementos da Pro-Praia entendem que se deve avançar com a Regionalização, mas acho que algumas ilhas devem merecer uma fase de transição como Brava e S. Nicolau. O processo traz alguma autonomização sobre a cobrança e receitas, mas há concelhos que não conseguem ainda gerar riqueza.

MI – Em S. Vicente pede-se agora a Autonomia. Como vê essa exigência quando não se conseguiu sequer aprovar a Lei da Regionalização?

JJ – O municipalismo não vincou ainda, passamos a falar da Regionalização e agora da Autonomia. Esse tal poder próximo da população pode ser exercido pelo município. Há quem queira ir depressa demais, ciente de que a sua ilha pode andar com os próprios pés e há pessoas que estão a ser convencidas disso em S. Vicente e Santo Antão. Ao analisar esse assunto cheguei à conclusão que a minha ilha também é capaz de caminhar com os seus pés.

Não vivo em S. Vicente, mas acho que devem pensar bem sobre essa autonomia. Se vermos bem, o Sokols defende a regionalização política, que se aproxima da autonomia porque permite eleições para os órgãos de decisão e atribui poder legislativo. Preciso conhecer detalhes para depois dizer se fomos a favor ou contra a Autonomia.

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