O arquitecto Peter Chermayeff regressou à cidade do Mindelo para certificar o renascimento das cinzas do “Oceanário do Mindelo”, um projecto que concebeu em 1999, mas que ficou na gaveta com a chegada ao poder do PAICV, por alegada falta de financiamento. Vinte anos depois, e quando tudo apontava para a morte definitiva dessa obra orçada na altura em 10 milhões de dólares, o ministério da Economia Marítima e a Câmara de S. Vicente decidiram insuflar nova vida ao sonho, depois de o Embaixador Carlos Veiga ter assegurado o envolvimento do autor num contacto efectuado nos Estados Unidos.
“É uma honra estar de novo aqui porque este lugar tem algo mágico”, confessou Chermayeff referindo-se à baixa da cidade do Mindelo, ontem à tarde na cerimónia de relançamento do seu antigo projecto. Vinte anos decorridos, o arquitecto norte-americano quer agora assinar algo mais ambicioso, um marco arquitectónico que ultrapassa a réplica da Torre de Belém e as águas da Praia d’Bote. Peter Chermayeff propõe um projecto capaz de transformar a área circundante num polo cultural, económico e turístico. A sua ideia é envolver a zona da Vascónia, perto de dji d’Sal, a Praça Estrela e a rua São João, além, é claro, da própria extensão da Avenida Marginal. Aliás, Chermayeff defende a transformação da Marginal numa zona pedestre.
“Este projecto não é apenas para mostrar o vosso papel na conservação do oceano, mas uma celebração da vossa própria essência enquanto povo. Quero que seja um lugar onde as pessoas possam vir para conhecer Cabo Verde, um lugar onde os turistas queiram fazer questão de conhecer”, assegura esse idealista, que ficou radiante por saber que boa parte dos terrenos necessários para a expansão do plano ainda pertence ao Estado e que pode contar com a colaboração da autarquia e do Governo para dar corpo a esse novo conceito.
Como diz Chermayeff, o propósito de S. Vicente é aumentar o nicho do turismo de cruzeiros com a construção do Terminal do Porto Grande. Levar com que os milhares de visitantes que chegam todos os anos queiram sair dos navios e visitar a cidade. No entanto, adverte, é preciso criar atracções. Uma delas pode ser o oceanário, mas esse arquitecto entende que será possível edificar algo mais significativo: transformar a baixa da cidade num centro cultural de excelência, onde as pessoas podem ver as espécies marinhas no aquário gigante e ao mesmo tempo desfrutar de exposições, espectáculos musicais e saborear pratos nacionais e do mundo.
Para o arquitecto, esse sonho pode ser realizado porque as autoridades estão sintonizadas numa só voz nesse propósito primordial que é levantar o oceanário. Como confirma o autarca Augusto Neves, a Câmara de S. Vicente está disposta a colaborar naquilo que for preciso para a concretização do projecto. “Para mim, este é um momento ímpar, poder ter cá um arquitecto desse gabarito e com todo este entusiasmo. Este projecto será uma realidade porque vamos trabalhar em parceria com o Governo para que este e outros grandes empreendimentos sejam concretizados”, assegura o edil mindelense, para quem Chermayeff tem ideias “fenomenais” que irão revolucionar a baixa da cidade do Mindelo, como por exemplo o aproveitamento da zona da Vascónia, da Rua S. João e Praça Estrela. “Vamos agora partilhar as suas ideias com outros intervenientes para podermos fazer disto um grande polo turístico e centro económico.” A perspectiva, segundo Neves, é que as obras tenham o seu arranque antes do término do mandato do actual Governo.
Cativado pelo entusiasmo de Peter Chermayeff, o ministro José Gonçalves faz questão de salientar que essa iniciativa é mais do que a retoma do projecto do oceanário. Trata-se, enfatiza, do renascimento de uma nova centralidade urbana, um polo sociocultural com forte ligação ao mar. Como salienta o governante, a baixa do Mindelo está algo degradado, pelo que o projecto irá catapultar as suas potencialidades, tendo como principal atractivo um oceanário assinado por um arquitecto cujo nome está associado a quase uma dezena dos oceanários mais famosos do mundo.
Arrancar a obra ainda neste mandato
O Oceanário do Mindelo é um projecto concebido em 1999, quando António Jorge Delgado era ministro da Cultura, e, conforme este arquitecto de profissão, a obra foi orçada na altura em 10 milhões de dólares, perto de um milhão de contos. No entanto, ficou apenas na maquete com a mudança de governo.
Com a nova dimensão que se pretende dar ao projecto, Delgado acredita que o valor do orçamento possa duplicar. “O conceito inicial e a forma do oceanário serão mantidos, mas será uma obra que vai estimular as ciências ligadas ao mar e ao mesmo tempo fazer desse espaço envolvente um novo polo”, enfatiza o ex-ministro, que está “feliz” com a retoma do projecto. Questionado se fez alguma pressão nesse sentido, Delgado nega redondamente a sua intervenção. Algo que parece improvável. O certo é que, para Delgado, Cabo Verde não pode falhar de novo com Peter Chermayeff, ou seja, voltar a engavetar o projecto. Para ele, isso seria intolerável.
Esse cenário, a acreditar no Secretário de Estado Paulo Veiga, não pode ser sequer cogitado. Como relembra, Chermayeff foi abordado nos Estados Unidos pelo Embaixador Carlos Veiga, aceitou alimentar de novo esse sonho, deslocou-se à cidade do Mindelo, pelo que resta ao Estado amarrar esse compromisso. “Com certeza que não iremos falhar. A obra terá de começar neste mandato, se passar para a alçada de um novo governo este terá que cumprir acordos que, entretanto, estarão celebrados”, diz Paulo Veiga. Para ele, as coisas irão andar agora mais rápido porque já um projecto de base, orçado em 10 milhões de dólares. No entanto, acrescenta, será efectuado um novo estudo de viabilidade porque a obra agora proposta inclui outras valências como a construção de um calçadão e o reordenamento da zona envolvente da réplica da Torre de Belém.
Kim-Zé Brito