O arguido Armando Gonçalves, ex-chefe do departamento de manutenção da ASA, admitiu esta manhã em julgamento o envio de alguns dos emails ofensivos que motivaram uma queixa de injúria e difamação contra a sua pessoa intentada por Teófilo Figueiredo, ex-director do aeroporto internacional Cesária Évora. Por esta e outras razões é muito provável que venha a ser condenado pelo 1° juízo-crime do Tribunal de S. Vicente no dia 10 de Fevereiro, dia da leitura da sentença. Isto porque as alegações do próprio Ministério Público e dos advogados da acusação e defesa apontaram para a responsabilização do suspeito por este ter confessado parcialmente os factos constantes dos autos.
Todas as partes pediram ao juiz a aplicação da medida mais consentânea, mas, para o defensor do assistente, o Tribunal deve condenar e suspender a aplicação da pena por um longo período de tempo. Isto para que Teófilo Figueiredo e a sua família possam voltar a viver em paz e em segurança. É que, como Figueiredo informou ao Tribunal, teve de fugir para um país estrangeiro com a esposa e os filhos por temer pela segurança da família devido as sucessivas ameaças proferidas por Armando Gonçalves durante mais de um ano.
Como Figueiredo relatou na audiência, desde que Armando Gonçalves foi destituído do cargo em Maio de 2018 que passou a ser alvo de uma penosa perseguição e ataques sistemáticos à sua honra e consideração por parte do ex-responsável do departamento de manutenção do aeroporto de S. Vicente. Segundo esse gestor, o ex-subordinado não acatou com serenidade uma medida administrativa normal e jurou vingar-se da sua pessoa. Para o efeito, passou a fazer telefonemas constantes e ameaçadores a toda a hora e a publicar uma série de mensagens nas redes sociais e através de emails com acusações graves e caluniosas. Além disso concedeu uma entrevista à RCV na qual lançou suspeições de actos de corrupção cometidos por Figueiredo e o administrador Nuno Santos em alguns concursos de empreitada.
Tudo isso, segundo Teófilo Figueiredo, teve repercussões gravíssimas na sua vida pessoal, profissional e na sua imagem pública. “Eu não desejo aquilo por que passei ao meu pior inimigo. Foi mais de um ano de ódio contra a minha pessoa. Usou a minha fotografia e as de meus filhos nas redes sociais acompanhadas de imagens de caixões e de uma cruz. Passou a perseguir-me na rua e foi ao ponto de partir o para-brisa do meu carro à porta da minha casa e depois levou um amigo para mostrar o que tinha feito. Ele foi ao Facebook dizer que, se a justiça corrupta não funcionar, faria justiça pelas suas próprias mãos”, ilustrou Figueiredo, para quem está claro como água que Armando Gonçalves agiu dessa forma para se vingar por ter sido destituído do cargo de chefe de manutenção do aeroporto.
No seu depoimento, o arguido admitiu ter enviado a Teófilo Figueiredo algumas mensagens electrónicas ofensivas, mas não assumiu a responsabilidade pelo conjunto dos emails. Como explicou, a sua conta foi invadida pelo que admite a possibilidade de alguém ter aproveitado para enviado mensagens para Teófilo Figueiredo em seu nome. Questionado pelo juiz Antero Tavares sobre o motivo que o levou a atacar o seu ex-director, Armando Gonçalves enfatizou que na altura dos factos ficou com “muita raiva” de Figueiredo pela forma como foi descartado da função que vinha exercendo há 10 anos. “Na primeira reunião que ele fez com o pessoal no mês de Janeiro (2018) ele disse que iria continuar a trabalhar com a mesma equipa e que eu continuaria no cargo. Eu fui de férias, regressei e em Maio ele comunica-me que serei retirado da chefia. Em Janeiro eu iria continuar, em Maio sou destituído e perco de uma assentada 58 contos mensais de salário. Isto custou-me muito porque casei-me em Março, a minha mulher estava grávida e tinha compromissos com o banco. Tudo isso deixou-se desesperado e cheio de raiva”, confessa Armando Gonçalves.
Segundo este electricista, que foi nomeado para a chefia de manutenção em janeiro de 2008, é natural haver mexidas de gestão, mas o que o abalou foi a forma e o momento em que a medida foi tomada. Aliás, para ele, essa decisão foi estimulada pelo administrador Nuno Santos, com quem teve uma desavença enquanto era director do aeroporto de S. Pedro, em S. Vicente. Armando Gonçalves acredita piamente que Figueiredo cumpriu ordens ou indicações de Nuno Santos, já que a relação profissional entre os dois ficou abalada e deu até azo a um processo-disciplinar.
A relação entre Figueiredo e Gonçalves era normal, conforme ambos admitiram no julgamento. Inclusivamente, o electricista chegou a convidar o gestor para o seu casamento. No entanto, as coisas ganharam um rumo imprevisível a partir de Maio de 2018 com a medida de destituição.
Na sequência dessa decisão, que terá visado imprimir uma “nova dinâmica” no aeroporto de S. Vicente, Armando Gonçalves pediu a desvinculação da ASA, tendo chegado a um mútuo acordo com a empresa em Outubro de 2018. Entretanto, os problemas entre Gonçalves e Figueiredo agudizaram-se e, em Abril de 2019, o ex-chefe de manutenção decidiu apresentar uma denúncia de corrupção envolvendo supostamente Teófilo Figueiredo e Nuno Santos em determinados processos de empreitada na ASA. Este processo está a decorrer, mas para a defesa de Teófilo Figueiredo é certo que não há quaisquer provas acusatórias. E, segundo o jurista João do Rosário, assim que for resolvido esse caso, é certo que o seu cliente vai apresentar uma nova queixa contra Armando Gonçalves por falsas denúncias.
Tentativa frustrada de acordo
Tratando-se de um crime particular, o Tribunal tentou saber se havia alguma possibilidade de acordo entre as partes. A preocupação do juiz foi saber se o ofendido estava na disposição de retirar a queixa caso o arguido se retratasse e pedisse desculpas públicas por aquilo que fez. Isto tento em conta que Armando Gonçalves já havia assumido parcialmente a culpa.
Perante essa proposta, Teófilo Figueiredo deixou claro que o seu objectivo era defender a sua honra e bom nome e que estaria disposto a aceitar um acordo se Armando Gonçalves fosse capaz de se desculpar com a mesma intensidade e credibilidade com que usou os emails, as redes sociais e a comunicação social para o atacar durante mais de um ano.
Por sua vez, Armando Gonçalves reconheceu que o juiz estava a dar-lhes uma oportunidade para resolverem essa quezila e frisou que, tal como Figueiredo, ele também queria viver em paz porque tem passado por “momentos difíceis”. No entanto, deixou claro que não iria retirar a queixa de corrupção que apresentou no Ministério Público contra Teófilo Figueiredo. “Posso retratar alguns aspecto porque foram ditos em momentos de raiva, mas não vou retirar a queixa-crime por corrupção”, sublinhou Armando Gonçalves, que foi logo esclarecido pelo juiz que ele não poderia fazer isso nem se quisesse porque o caso passou a ser uma denúncia pública, que tem de ser esclarecida de qualquer jeito.
Mediante essa informação, Teófilo Figueiredo deixou claro que não iria aceitar acordo e o caso foi a julgamento. A sentença será proferida na próxima segunda-feira.
Kim-Zé Brito