Portas di nha Korason é uma composição que resgata o tema da tolerância e da partilha entre os seres humanos. Uma canção que reflete sobre as possibilidades salutares que podem resultar de um compromisso universal com a arte e a música. Ela foi realmente composta nas ladeiras de Olinda e as ladeiras estão presentes nela. O lançamento é hoje no Youtube, no canal oficial de Tchida Afrikanu, pelas 13.30 horas de Cabo Verde.
Pelas conhecidas e barulhentas ladeiras de Olinda – hoje quase solitárias – após dois anos de pandemia da Covid-19, uma voz meiga e cativante, acompanhada por dois violões, escorre e invade agradavelmente os ânimos da população boêmia. Ecoa nas lembranças e lamentações daquelas pessoas que perderam alguém durante esta moléstia globalizada. Esta voz cantante entra pelas janelas entreabertas, penetra pelas frestas das portas cerradas e acaricia as lembranças daqueles que fugindo da solidão, resistem ao isolamento social.
Olinda é um coração pulsante. Convida-nos a abrir as suas portas e passear pelos seus quartos. Subir e descer as ladeiras de Olinda sempre foi multidão, alegria, sorrisos, lágrimas e beijos molhados. Olinda, Património Cultural e Histórico da Humanidade.
Esta canção é um selo de despedida de mais uma engenheira cabo-verdiana que retorna ao continente mãe, África. Nádia Lima cursou Engenharia Biomédica na Universidade Federal de Pernambuco, na cidade irmã de Olinda, Recife. Conhecemos-nos numa confraternização de estudantes e desde então passei a admirar a sua voz e musicalidade excepcionais. Convidei Nádia para participar da gravação do meu primeiro álbum musical Reggae no Deserto (2017). Ela canta a faixa que dá o nome ao disco.
Nádia confidenciou-me que a música sempre fez parte da sua vida, da vivência da sua família. Cresceu vendo o pai cantando nas rodas de amigos ou mesmo em casa no dia a dia. Ambiente propício que despertou o seu interesse principalmente pela admiração que sempre teve pelo pai, Mário Lima.
Nádia lembra-se de dois artistas de Cabo Verde com os quais aprendeu a cantar: Cesária Évora e Ildo Lobo. Ela conta que tinha DVDs e que com dez anos de idade, quando estava sozinha em casa, escutava a música e cantava com eles. A depender da música ela chorava ou alegrava-se. A partir daquele momento, Nádia se achou na música.
Marcelo Cavalcante é um jovem músico e compositor natural de Olinda. Conheci-o em 2008 quando ele realizava pesquisa sobre música cabo-verdiana enquanto participava de um projeto musical que resultou no álbum da Patrícia Solis Morabeza (2016). O músico e compositor confessa que a música de Cabo Verde é uma das influências que ele carrega no seu violão. Ele acaba de lançar seu primeiro álbum (In)produtivo (2021) que se encontra disponível nas plataformas digitais.
A relação do Marcelo com o violão é vitalícia. Vai para além da música. Faz parte mesmo da sua forma de se comunicar com o mundo. Na sua busca poética e filosófica da vida, o violão é como um barco que o ajuda a transpor as barreiras materiais e ir em busca das ancestralidades intrínsecas à sua história. Neste sentido, ele se regozija de ter encontrado a música de Cabo Verde neste mar de influências e questionamentos. Toda esta diversidade o impulsiona a descobrir outras linguagens inerentes ao violão.
Marcelo acredita que a música não o ajuda somente a se achar no mundo, mas também é essencial para que as pessoas se achem junto de outras pessoas e ambiências. Quando se transporta através da sua música e das suas composições o desafio é sempre transcender a normalidade do senso comum. E, na medida em que consegue levar outras pessoas nessa viagem maravilhosa de rasgar e tecer novos horizontes, sente-se executando a missão da sua vida. A música, na ótica de Marcelo, tem importante papel sócio político a desempenhar na educação da sociedade no geral.
Portas di nha Korason é um tema que resgata o tema da tolerância e da partilha entre os seres humanos. Uma canção que reflete sobre as possibilidades salutares que podem resultar de um compromisso universal com a arte e a música. A canção foi realmente composta nas ladeiras de Olinda e as ladeiras estão presentes nela.
A gravação ocorreu na Travessa do Rosário nº 69, no Estúdio do Rozario, Bonsucesso-Olinda. A captação, mixagem e master, bem como a edição das imagens, ficaram ao encargo do músico, produtor e luthier Jobeni Oliveira.”
Tchida Afrikanu