A Cimboa, instrumento musical monocórdico mais antigo em Cabo Verde, trazido provavelmente pelos escravos africanos, no decurso do tráfico negreiro, acaba de ser elevado à categoria de Património Cultural Imaterial Nacional, conforme a Portaria nº50/2022 de 18 de outubro. O instrumento era utilizado antigamente exclusivamente no acompanhamento do batuque, mas hoje está na morna, coladeira, funaná, zouk, entre outros, dependente apenas do talento musical do executante.
Na nota justificativa, o Ministério da Cultura e das Industrias Criativas diz que a camboa é constituída por uma cabaça ‘boli”, designação dada aos frutos de diversas plantas da família das Cucurbitáceas, de casca dura, normalmente formados por duas partes globosas de tamanha desigual, sendo a inferior maior que a superior. As duas partes são unidas por uma secção mais estreita que, depois de esvaziados do seu conteúdo, são utilizados como recipientes ou no fabrico de diferentes objectos.
O braço da cimboa, prossegue, deve possuir pelo menos um palmo da mão. Contudo, aquilo que determina o tamanho da cabaça e do seu braço é o comprimento da crina de cabalo e o facto do executante ter de segurar o instrumento com o seu antebraço. Simultaneamente, este segurar o braço e fazer as notas músicas pressionando com o dedo sobre a crina ao longo do braço da camboa. “Os três componentes – a cabaça, o braço e a crina de cavalo – têm de ter medidas harmoniosas ou proporcionais.”
Na cabaça, pontua a nota, fazem-se dois buracos desiguais por onde se introduz o braço da camboa, que é feito de madeira de pinheiro ou de tendente. “Na preparação da madeira para se fazer o braço, corta-se um pedaço de pinheiro ou de tendente e coloca-se no chão. Cobre-se o pedaço de pau com palha seca e acende-se o lume, por dois ou três minutos. Retira-se do lume e deixa esfriar. Depois, retira-se a casca e coloca-se o pau ao sol para secar, para evitar o bicho de madeira”, descreve, acrescentando que esta técnica é chamada localmente de “borodja po”.
Na extremidade mais grossa e longa do braço, ajunta, faz-se um orifício, onde se coloca a chave (karabedja) ou caravela, que é feita de uma ripa de mogno de cerca de sete centímetros e tem a forma cônica. Esta serve para afinar a crina de cavalo, que é afixada numa ranhura feita na extremidade da chave e numa outra idêntica que é feita na extremidade mais estreita e curta do braço da cimboa. “Na parte superior faz-se um corte, onde é forrado com pele de cabra ou de carneiro, de preferencia de idade juvenil, que funciona como membrana vibratória da caixa de ressonância”, detalha.
Depois de forrar a cimboa, sobre a pele coloca-se um pequeno cavalete, feito de cabaça, que serve para sustentar a crina de cavalo, a fim de produzir o melhor som. Este possui ainda função de enviar a vibração da crina para a caixa de ressonância “O som da cimboa sai por um orifício ornamentado com vários desenhos que se fazem na cabaça, que tem de ficar no lado direccionado ao ouvido do executante”, acrescenta, reforçando que o embelezamento da cabaça é reforçado com o verniz sintético, que serve também para proteger a cimboa do bicho-da-manha.
Na actualidade, diz ainda a nota justificativa, poucos são os tocadores e fabricantes de cimboa, destacando o mais velho, Tomás Mendes Cabral, mais conhecido “Nhu Eugenio Mendi”, de 83 anos, nascido em Chão de Junco, que aprendeu com o falecido Amândio Borges, mais conhecido por “Toi di Paulo, da vizinha Mato Brasil. Ainda Domingos da Ressureição da Silva, mais conhecido por Pascoal, de 62 anos, que teve como mentor o mestre Manu Mendi, falecido em 2008. Arlindo Sanches, Mário Lúcio Sousa e Gil Moreira são os precursores e mantém viva esta tradição.
Em 2022, através do projecto “Cimboa – património para o desenvolvimento sustentável”, financiado pelo Procultura – Palop – TL, realizou-se um inventário, que apontou para a necessidade da sua salvaguarda. Assim o Governo, através do Ministério daCultura, decidiu classificar a Cimboa como patrimônio cultural imaterial de salvaguarda urgente. Cabe agora ao Instituto do Patrimônio Cultural elaborar um plano de salvaguarda emergencial, designadamente um plano estratégico de valorização de detentores e garantia da sustentabilidade da cimboa, no contexto histórico e sociocultural.