Carnaval de Verão: Crianças partilham luz dos holofotes com musas experientes

As crianças conseguiram partilhar a luz dos holofotes com musas experientes do Mindelo e do Rio de Janeiro no desfile ontem à noite do Carnaval de Verão. Espalharam simpatia, cortesia e samba no pé pelo sambódromo e arrancaram fortes aplausos.

A escola do Samba Tropical prometeu ontem no desfile do Carnaval de Verão surpresas para o próximo enredo, uma delas a apresentação de andores com movimento. Neste término das formações ministradas por especialistas brasileiros, cujo trabalho final foi ontem apresentado num show nocturno assistido por milhares de pessoas, o presidente do Samba, David Leite, afirmou que este grupo emblemático já tinha algumas ideias e que agora, depois desta troca de experiência entre Cabo Verde e Brasil, podem ser colocadas em prática.

“No próximo ano queremos trazer algumas inovações, que já tínhamos nos nossos projetos, porém ainda estávamos a decidir como é que poderíamos executá-los, principalmente em relação aos nossos carros alegóricos. O formador especialista em movimento nos andores transmitiu-nos muita experiencia e no próximo ano poderemos ver melhorias neste aspecto”, assegura esse dirigente.

Samba Tropical, aliás, foi um dos grupos presentes ontem à noite no sambódromo do Mindelo, que envolveu desta vez menos foliões e ritmistas em comparação com os desfiles anteriores. Mesmo assim não faltam vivacidade nesse espectáculo que marcou as estreias da Porta-bandeira Selminha Sorriso e Mestre-Sala Claudinho de Souza (casal da Beija-Flor de Nilópolis) e da Rainha de Bateria Camila Silva. No entanto, os holofotes não estiveram centrados só nessas personalidades do carnaval brasileiro. Na verdade, as alas das crianças acabaram por cativar o público. Cada vez mais destemidas, mostraram a sua paixão pelo Carnaval e que o futuro próximo das figuras de destaque está garantido.

A rainha de bateria Camila, que inspirou as jovens na formação que ministrou, estreou-se nos desfiles pela “morada”, acompanhada das musas do carnaval mindelense. Cada uma, no seu gingado próprio, encantou a plateia por onde passava, roubando a atenção. A bateria, apesar da ausência dos mestres e tocadores do Estrela do Mar, Monte Sossego e do Mindel Samba, soube dar conta do recado. Os ritmistas mostraram capacidade de adaptação à música “E lode dali ê lode dala”, orquestrada com batucadas do estilo brasileiro e cabo-verdiano.

Andor giratório construído em cinco dias

O Carnaval de Verão, segundo Daia Leite, tem estado a evoluir a cada edição. Graças a esse evento, realça, os grupos têm podido explorar e melhorar diversas áreas. Nesta quinta edição, a terceira em parceria com Dudu Nobre, acrescenta o presidente do Samba Tropical, privilegiaram a formação de artistas dos estaleiros nas áreas da escultura, ferragem e figurinos. “Privilegiamos técnicos especializados nas áreas em que os nossos artistas precisavam de mais conhecimento. Os workshops decorreram lindamente, foi uma troca de experiência muito boa. É bom realçar que eles não vêm para ensinar nada, é uma troca de experiencia, assegurou Daia Leite.

O andor construído para o desfile deste verão foi feito em cinco dias, resultado da formação do especialista em ferragem Hélcio Paim, da escola Unidos da Tijuca. “A ideia era fazer uma peça giratória, com elementos leves. Construímos algo que representa a ilha – o mar e o sol. A estrutura desmontável representa um ouriço, mas também pode ser entendida como um sol”, explica. De acordo com o formador, o brilho e o movimento foram conseguidos através das técnicas que passou aos artistas no Mindelo, com materiais inoxidáveis e que, por serem desmontáveis, podem ser reutilizados nos carnavais seguintes. 

Este ano, a comitiva brasileira trouxe também a escultora Andreia Vieira para uma das formações solicitadas pelos artistas mindelense. Vieira confessou ao Mindelinsite que se incidiu sobre cortes dos materiais e melhoria do acabamento,numa semana “bem corrida, mas proveitosa”. Entretanto, fez notar que, enquanto no Brasil há um maior profissionalismo, em Cabo Verde tudo é feito com o “amor e dedicação” dos colaboradores.

A historiadora brasileira e carnavalesca Maria Augusta viu muita coisa em comum entre o Carnaval do Mindelo e o do Rio de Janeiro nesta semana em que esteve em S. Vicente. Alguns desses elementos, diz, são o ritmo, a dança, o corpo, a alegria e a importância que se atribui a essa manifestação cultural nas duas cidades. Os mandingas também são outro dos pormenores da ilha que fascinaram essa anciã, que chegou pela primeira vez à ilha do Monte Cara para transmitir a sua experiência em termos de construção de um enredo.

Valdir Gomes, ou Kavera, como prefere ser tratado, participa do carnaval d’soncent desde 2007 e este ano foi consagrado Mestre-sala pelo grupo Cruzeiros do Norte. Confessa que começou a aprender através de videos da internet e que aproveitou as formações para aprimorar os seus movimentos. “Nunca tive uma grande atenção sobre a figura do mestre de sala. Pensei que fosse só sambar, mas depois aprendi que este é responsável por um bailado. Além das formações, acrescentei um toque meu, a minha identidade”, afirma o jovem. Kavera lamenta as críticas que recebeu quando foi escolhido para assumir esta figura de destaque, contudo aproveitou-se destes murmúrios negativos como impulso para melhorar a sua performance e ganhar o carnaval. Por ter vencido como mestre de sala deste ano, em Março, foi presenteado com uma viagem ao Brasil e escolheu setembro como data da viagem, por ser altura que as escolas do Carnaval, naquele país, iniciam os seus ensaios.

Musa do Cruzeiros do Norte, Magali Costa tem aproveitado as formações enquadras no Carnval de Verão, que lhe permitiram corrigir os movimentos das mãos e o próprio ritmo das passadas. “Para mim, este evento tem sido muito oportuno porque permite-me aprender muito sobre os desfiles, já que a alegria e amor pelo Carnaval tenho de sobra”, sublinha a jovem, que é destaque do seu grupo há anos e promete estar mais “solta” no próximo desfile.

Uma das diferenças claras entre o carnaval do Brasil e o de Cabo Verde encontra-se na batucada. Pela primeira vez em Cabo Verde, o mestre Odilon Costa vê o “acasalamento” destes dois ritmos como algo difícil, mas admite que ficou surpreso com o resultado alcançado. Na sua percepção, o toque da bateria do Mindelo é “maravilhosa” e, como revelou ao Mindelinsite, foi preciso alguma perseverança dos tocadores mindelenses para conseguirem encaixar os dois ritmos e acompanhar a música.

Sidneia Newton (Estagiária)

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