O auditório Onésimo Silveira encheu-se de gente na tarde de ontem, sexta-feira, para testemunhar o lançamento do livro “Teixeira de Sousa, um ilhéu de causas”, da autoria de Jorge Tolentino. A apresentação da obra coube ao reitor da Universidade do Mindelo, Albertino Graça, que, numa longa explanação, esmiuçou a vida do escritor, falou das suas obras literárias e do seu trabalho enquanto médico e presidente da Camara Municipal de São Vicente.
De acordo com Albertino Graça, o livro é um testemunho bibliográfico que resulta de um trabalho de pesquisa feito pelo autor Jorge Tolentino Araújo sobre este escritor da Claridade. “Esta é uma palestra em forma de livro é, nas palavras de Arcília Barreto, uma verdadeira preciosidade, destacando nele três aspectos: a forma de caracterização do homem Henrique Teixeira de Sousa, o realce mais revelador e marcante da sua postura social, politica e profissional e a contribuição para a criação e sedimentação dos valores humanos e éticos do escritor”, frisou.
Fazendo uma retrospectiva histórica, Graça lembrou que desde o século XIX que o exercício da medicina em Cabo Verde se caracteriza pelo humanismo e abnegação dos seus profissionais, lembrados em mornas, estatuas, hospitais e ruas. No caso de S. Vicente, cita a título de exemplos Baptista de Sousa, Maria Francisca, José Fonseca, Francisco Regalla, de entre outros. Segundo o apresentador, Henrique Teixeira de Sousa integra esta plêiade de médicos cabo-verdianos, que se notabilizou na sua acção decidida e competente aquando da epidemia de cólera em 1974.
“Infelizmente, se no caso do Dr. Baptista de Sousa, S.Vicente tem um Baptista de Sousa para perpetuar a sua memória, o mesmo não se pode dizer em relação a Teixeira de Sousa”, declarou Graça, após fazer uma analogia e distinção entre os pontos comuns e que separam os médicos Baptista de Sousa e Teixeira de Sousa. Este aproveitou ainda para destacar as singularidades deste medico natural da ilha do Fogo, um cabo-verdiano que, afirma, congrega em si um conjunto de causas.
“O perfil de Teixeira de Sousa como homem, cidadão e médico atesta o seu alto nível ético, social e cultural, técnico e cientifico, interligado a uma praxis interventivo quotidiano, que prova que tanto o politico, o administrativo e a saude devem servir ao bem estar do povo cabo-verdiano, sendo estes não um privilegio mas um direito”, pontua, realçando que Tolentino aborda no livro este caracter de Teixeira de Sousa a partir de uma perspectiva biográfica, que é um contributo para um incentivo para a leitura não só do homem, mas também dos conhecimentos em vários domínios.
“O autor maneja com eficácia os recursos necessários para atrair a atenção do leitor, enquanto texto híbrido, misto, tenção entre um regime de verdade e de liberdade criativa, que acolhe e expressa a ideia de uma vida, a de Teixeira de Sousa, na qual existe a necessidade de compreensão e sobretudo de reflexão”, reforçou, realçando que nos textos se pode captar a trajetória pessoal de Teixeira de Sousa, numa sequencia de vida que pode inspirar e libertar o leitor da sua própria existência.
Na sequência, este mergulha nas influências recebidas pelo biografado, com destaque para o Movimento Claridoso, Certeza, pelo neo-realismo português representado por Manuel Ferreira e as ideias de uma nova emigração. Fala da sua carreira médica, mas também enquanto presidente da Camara de São Vicente com discursos contra o poder colonial, mas também inovador, sendo a prova mais marcante a aprovação, na década de 60, do Primeiro Plano Director da Cidade do Mindelo. “Era um cabo-verdiano que luta por melhor dia para a sua terra, para o seu povo”, acrescentou, dizendo por isso concordar com a proposta de ser realizar um colóquio sobre Teixeira de Sousa porque, a seu ver, urge resgatar a obra do escritor para a historiografia de Cabo Verde.
Jorge Tolentino agradeceu a presença no “encontro de amizade e de homenagem” a Henrique Teixeira de Sousa, e ao amigo Albertino Graça por ter aceitado o convite para apresentar a obra. Lembrou ainda que Teixeira de Sousa nasceu em 1919 na ilha do Fogo e completou há três anos o seu centenário. Lamenta no entanto que este não tenha sido um acontecimento nacional e também em SV de maior magnitude, o que lhe deixou alguma magoa. “Senti que foi uma falha extremamente grave porque o que fez por esta ilha, enquanto medico, nutricionista, delegado de Saúde e presidente da CMSV foi enorme. Ele assumiu ao mesmo tempo, recebendo pelas funções enquanto medico e delegado de Saúde, mas não como edil. Estas foram exercidas graciosamente”, detalhou o autor.
Para Tolentino, esta obra é uma tentativa de ser, primeiro, um acto de justiça em relação a Henrique Teixeira de Sousa. Em segundo lugar, um pequeno guia para a vida e obra do escritor, não enquanto ficcionista, romancista ou contista, a parte mais conhecida tendo em conta que grande parte da sua obra é estudada no sistema de ensino desde sempre, mas sobretudo uma chamada de atenção para o outro lado da sua vida, enquanto medico, nutricionista e homem público na frente do municipalismo em Cabo Verde. “Terá sido ele o primeiro autarca modernizador de São Vicente? Não. Mas foi ele quem mais longe levou o propósito de transformar esta ilha e a cidade do Mindelo com preocupações muito claras, no sentido da modernização da cidade e inclusão das camadas mais desfavorecidas”, disse destacando ainda a sua preocupação com a tríade: água, electricidade e saneamento.
Testemunharam ainda o lançamento desta obra o Presidente da Republica José Maria Neves, eleitos municipais, representantes dos serviços desconcentrados, estudantes e docentes, corpo directivo da Universidade do Mindelo, de entre outros. Quanto ao autor do livro, Jorge Tolentino, é formado em Direito pela Universidade de Coimbra e já desempenhou várias funções designadamente as de Ministro da Defesa, da Cultura, dos Negócios Estrangeiros e da Presidência do Conselho de Ministro, e ainda embaixador em muitos país. Actualmente ocupa o cargo de Chefe da Casa Civil.