É a primeira mulher em Cabo Verde, com formação especifica, a desempenhar as funções de Segundo Piloto na marinha mercante nacional. Mas a ambição da jovem Samira Oliveira, neste universo ainda dominado por homens, é muito maior: quer ser a primeira mulher Comandante de navio do pais. Até lá, vai desempenhando as funções de Segundo Piloto no navio Praia d’ Aguada.
Em entrevista ao Mindelinsite, Samira explica fez a sua formação académica no Centro de Instrução Almirante Brás de Aguiar em Belém do Pará, no Brasil. “Fiz o curso de segundo piloto, que é o mesmo que uma licenciatura em Ciências Náuticas. Ainda no Brasil, fiz um ano de estagio no Mar. Trabalhei em um navio tanque, o que foi muito bom. Regressei a Cabo Verde em 2017. Demorei um pouco para regressar porque fiz, paralelamente, uma licenciatura em Engenharia Naval. Hoje tenho duas formações e com estagio completo”, diz.
Em Cabo Verde, conta, trabalhou em São Vicente durante um ano no navio Thames, que draga praia-mar. Trata-se de uma embarcação com bandeira nacional, vinculado a agencia Verde Line. Depois de um ano, prossegue, voltou ao Brasil em gozo de ferias e regressou agora em 2019. Está a pouco menos mês no quadro de pessoal da Cabo Verde Interilhas.
“Estou a trabalhar no navio Praia d’ Aguada como segundo piloto. Ou seja, fico abaixo apenas do Comandante e do Imediato. No navio, zelo pela segurança e salvatagem, ou seja, cuido dos equipamentos de baleiro e outros. Também faço serviços de combate a incêndio e tento manter tudo operacional. Sou ainda responsável por guiar o navio, junto com o Comandante e o Imediato”, enumera.
Paralelamente, de acordo com Samira, faz manobras para atracar e destacar o navio, e ainda tirar o quarto de serviço, ou seja, pilotar o navio. “Presto serviço também na enfermaria onde aplico primeiros socorros, sobretudo se o comandante estiver impossibilitado”, pontua, deixando claro, no entanto, que a sua ambição é chegar a comandante.
Esta é aliás a sua próxima meta, faltando para tal apenas mais tempo no mar e concluir a segunda fase do curso, que demora apenas mais alguns meses. É que, segundo Samira, na primeira fase fez o curso de Segundo Piloto mas, para evoluir, terá de passar, primeiro a Imediato e, depois, a Comandante. “Terei de regressar ao Brasil para fazer mais algumas cadeiras para concluir a minha formação. Seria mais três meses de formação pelo menos. É semelhante aos cursos de curta duração que os marítimos fazem no ex-Isecmar, só que, no meu caso, terei de completar a segunda etapa no Brasil”, esclarece.
Universo masculino
Samira Oliveira admite que em Cabo Verde ainda é difícil trabalhar nesta area, que é dominada por homens. Segundo a nossa entrevistada, as dificuldades são ainda maiores porque alguns homens não aceitam mulheres no comando. “As dificuldades são ainda maiores para os homens que têm muito tempo no mar. Não aceitam bem receber ordens de mulheres. Mas acredito que, com o tempo, vão-se acostumar”, antevê.
Por agora, esta jovem vai comemorando o facto de não ter enfrentado problemas de maiores no Praia d’ Aguada. Mas lembra que a situação foi diferente no navio Thames, onde enfrentou alguns constrangimentos porque os marinheiros não aceitavam as suas ordens, o que a obrigou a aplicar as regras. Menos dificuldades teve no Brasil, tendo em conta que trabalhou numa frota com uma mulher como Imediato. Numa outra o comandante era uma mulher.
“Sei que estou a desbravar caminho, até porque sou a primeira mulher a desempenhar as funções de segundo-piloto. Tive informações de outras duas mulheres aqui no país que fizeram formações nesta área, uma em náuticas e outra em maquinas e que chegaram inclusive a fazer o estagio, mas acabaram por abandonar. Neste momento sou a única, mas estou confiante, até porque neste momento uma outra jovem está a fazer uma formação de maquina.”
Questionada sobre os motivos que poderão ter levada as outras mulheres a desistirem, Samira diz acreditar que seja porque esta é uma área profissional difícil, sobretudo para as mulheres-maēs. “Os horários são muito complicados. É preciso muito tempo para conseguir o desembarque, ainda que a lei diga que um marítimo deve trabalhar três meses no mar e beneficiar de um mês em terra. Em Cabo Verde ainda se cumpre a lei com rigor devido a carência de pessoal.”
Mas nada que desanime esta jovem que se diz apaixonada pelo mar, principalmente por pilotar navios, desde criança. “Não sei de onde veio todo este amor pelo mar. Na minha família não tem marítimos. Tenho nove irmãos, mas nenhuma mostrou vontade de seguir esta profissão. Entrei na Escola Militar no Brasil e, depois, fiz uma adaptação de um ano e fui para a marinha. Sinto-me realizada, mas ficarei melhor depois de chegar a Comandante”, conclui esta jovem, que é casada com um marítimo, mais precisamente um oficial de maquinas brasileiro, o que, admite, facilita porque é um conhecedor da área.
Constânça de Pina