A Presidência assegurou hoje em comunicado de imprensa que houve total transparência no tratamento do salário da Primeira-Dama, processo que, enfatiza, foi desencadeado em concertação com o Governo, ao mais alto nível. A partir deste ponto, o Conselho de Administração da PR assume que cada um deve assumir as suas responsabilidades na matéria. Assegura, entretanto, que vai aguardar “serenamente” o pronunciamento do Tribunal de Contas ao relatório da Inspeção-Geral das Finanças, antes de tomar qualquer decisão.
De acordo com a Presidência, após analisar o relatório, verificou que este identifica um conjunto de situações e sobre elas faz recomendações. Mas, em momento algum, aponta um cenário de “desregramento ou desconformidades generalizadas”, como, na sua perspectiva, se pretende fazer crer, numa alegada tentativa de se desgastar a imagem do Presidente, para fragilizar e condicionar a sua intervenção. “Os princípios da transparência e da criteriosa utilização dos recursos têm sido bandeiras na gestão da Presidência da República, com ganhos inegáveis não apenas no tocante aos Recursos Humanos quanto também em domínios igualmente importantes como é o da gestão patrimonial”, refere, realçando que foi a partir de março de 2022 que a Presidência da República passou a estar alinhada com o SIGOF – Sistema Integrado de Gestão Orçamental e Financeira.
Tratou-se, afirma, de uma decisão ponderada e definitiva, por iniciativa do Presidente da República, visando tornar direta e facilmente escrutináveis todos os seus atos da gestão. E, desde então, tudo o que diga respeito à gestão administrativo-financeira da PR, diz a nota, está exposto no sistema da gestão orçamental e financeira do Estado, sujeito à fiscalização das instâncias competentes. “Mesmo num contexto de autonomia administrativa e financeira, existe assim a intervenção de outras entidades no momento do pagamento das despesas, designadamente do lado do Governo, pelo que a existência de eventuais irregularidades sucessivas nunca poderia ser responsabilidade exclusiva da gestão da Presidência.”
Concertação e entendimentos com o Governo
O processo dos salários da Primeira Dama, diz, foi tratado com boa-fé e total transparência, num quadro de explicitação das motivações e de concertação e entendimentos com o Governo, ao mais alto nível, na lógica da lealdade institucional e lisura no relacionamento que deve existir entre os Órgãos de Soberania. “Todas as informações foram prestadas ao Primeiro-ministro sobre esta matéria e, na sequência, as questões de orçamentação foram cuidadas com o Ministério das Finanças”, observa, lembrando que Débora Carvalho já tinha o seu trabalho e vida profissional, e aceitou ver reduzidos os seus rendimentos para assumir a tempo inteiro as funções de Primeira Dama.
Defende, aliás, que, apesar de admitir alguma lacuna, existe um estatuto da Primeira-Dama em Cabo Verde, ao contrário do exposto no relatório da IGF à Presidência, decorrente de direitos que a prática continuada, desde 1975, foi traduzindo em costume do Estado. Isto, seja da criação, com a lei orgânica da Presidência da República em vigor desde 2007, do Gabinete de Apoio ao Cônjuge do PR, seja ainda do Decreto-Lei no 14/2017, de 30 de Março, que a integra no elenco de Titulares de Cargos Públicos isentos de rastreio dos aeroportos do país.
Neste quadro, refere o comunicado, a Presidência apresentou ao Governo, em março de 2022, um anteprojeto da nova Lei Orgânica da Presidência da República, que contêm dispositivos jurídico-administrativos, visando regular questões não reguladas ou deficientemente reguladas quanto à Primeira-Dama. “Sempre foi propósito e desejo da Presidência da República que a matéria fosse resolvida ao nível da Lei. As medidas entretanto adotadas foram anunciadas como sendo provisórias e todos os intervenientes nas diferentes fases, seja a do processamento dos salários, seja a do pagamento das obrigações perante o Fisco, seja ainda a das contribuições para a Previdência Social, tiveram como suporte a Diretiva no1/2023, do Chefe da Casa Civil”, lê-se no documento, aproveitando para questionar as razões porque o Governo não concedeu a atenção e a prioridade à proposta de diploma da Presidência, quebrando assim uma tradição de lealdade e cooperação institucionais.
Ao mesmo tempo que apresentou a proposta de diploma orgânico, prossegue, a Presidência da República inscreveu nos Orçamentos para 2023 e 2024 o necessário “respaldo financeiro” para a implementação da nova Lei Orgânica, incluindo os dispositivos atinentes à Primeira-Dama, Débora Katiza Carvalho. Neste sentido, as Notas Justificativas foram enviadas ao Ministério das Finanças em 2022 e em 2023, o que leva a PR a concluir que estão em causa recursos constantes de Orçamentos do Estado, discutidos e aprovados pelo Governo e pela Assembleia Nacional.
“Nas sessões da chamada arbitragem política as motivações de cada rubrica foram explicitadas, particularmente a atinente aos Recursos Humanos onde se incluem as verbas de suporte aos salários da Primeira Dama. Ou seja, tudo foi conduzido à luz do dia, num quadro de boa fé, de informação ao Governo, franco diálogo institucional, de entendimentos prévios e de submissão ao escrutínio de todos os mecanismos de controle financeiro do Estado.”
Ganhos institucionais
Defende a PR que o novo diploma orgânico vai trazer ganhos institucionais importantes, o que torna inexplicável, do ponto de vista do Conselho de Administração, a aposta do Governo em barrar a pretensão da Presidência de dispor de um novo diploma orgânico que, entre outros, eliminava o vazio legal relativamente a certos aspetos atinentes ao Estatuto da Primeira-Dama. Por outro lado, afirma, há problemas herdados em matéria de gestão dos Recursos Humanos, que foram resolvidos e não são referidas no relatório da Inspeção. Cita, a titulo de exemplo, o subsidio de transporte que, diz, era de desequilíbrio e de desrespeito pelo limite de 10 mil escudos estabelecido por lei.
Quanto ao montante atribuído ao Chefe da Casa Civil a título de renda de casa, sublinha, é o mesmo de há muitos anos a titulares anteriores do cargo. “Tivesse esse montante sido questionado em algum momento, em algum escrutínio, em alguma avaliação das contas de gerência, certamente que não se verificaria essa inércia no processamento, de gestão em gestão. Não se pode ignorar a prática reiterada durante anos para, em relação ao atual titular do cargo, considerar o montante ‘inadequado e desproporcional’…”, declara.
Já em relação ao exercício de funções pela Conselheira Jurídica, o Conselho de Administração diz manter os argumentos produzidos no Contraditório ao projeto de relatório, aguardando pelo pronunciamento do Tribunal de Contas.
Com relação aos contratos de prestação de serviços, explica que ainda no decorrer da Inspeção foram introduzidas as correções sugeridas pela equipa de Inspeção, pelo que acredita que esses contratos já estão conformes. Por tudo isso, e porque o relatório foi remetido ao Tribunal de Contas, como se impunha, a PR diz que vai aguardar serenamente pelo pronunciamento desse órgão.