Inspirada em Janira H. Almada, líder do PAICV, confessa, formou-se em Ciência Política e Relações Internacionais assumindo-se hoje uma mulher apaixonada pelo mundo da política. A politóloga Maria Correia, mais conhecida por Zeza, tem traçado na mente o seu percurso político. Como afirma, quer começar a sua carreira em Santo Antão, sua ilha natal, e alcançar depois o patamar nacional. Nesta viagem, ela gostaria de ser acompanhada por outras mulheres. Nas autárquicas, integrou a lista de Odailson Bandeira para Ribeira Grande e aplicou na prática os seus conhecimentos académicos. Agora quer ver a política cabo-verdiana “invadida” por mulheres competentes, pois acredita que elas são naturalmente mais sensíveis e podem “humanizar” esse mundo dominado pelos homens.
Por: Kimzé Brito
Mindel Insite – Qual a formação de uma politóloga e o papel que desempenha?
Maria “Zeza” Correia – Quando falamos de uma politóloga a expressão traz logo à mente alguém que desempenha um papel apenas no aspecto político. Mas não é isso. Formei-me em Ciência Política e Relações Internacionais, logo o meu curso não se restringe à política. Tem diversas saídas profissionais como analista, diplomata, relações internacionais e ainda dá as ferramentas para desempenhar funções políticas com mais autonomia, como por exemplo ser deputada, Presidente da Assembleia Regional ou Nacional…
MI – Se a sua formação é em Ciência Política e Relações Internacionais porquê se apresenta como politóloga?
MC – Porque todo aquele que faz esta formação no fim do curso é considerado um politólogo, isto é, um estudioso da política.
MI – Dado o esclarecimento, gostaria de saber se, enquanto cidadã, autodefine-se como uma política?
MC – Não me considero ainda uma política porque agora que começo a entrar nessa área de forma activa. Quero começar e incentivar outras mulheres porque gosto de política. Desde quando estudava o décimo segundo ano as minhas colegas e professores já viam a minha tendência. Costumava dizer que queria ajudar Cabo Verde e via a Janira Almada como um exemplo. Quero ser como a Janira porque ela é um modelo para mim. Formei-me em política inspirada nela.
Quero ser como a Janira Almada (líder do PAICV) porque ela é um modelo para mim. Formei-me em política inspirada nela.
MI – Que tipo de relação tem com Janira Almada, a presidente do PAICV?
MC – Ela é um ídolo…; tive a oportunidade de a conhecer em Santo Antão pelas eleições autárquias porque fiz parte da lista de Odailson Bandeira, candidato do PAICV para Ribeira Grande. Conhecemo-nos na apresentação da candidatura, fizemos uma foto, o que foi para mim um grande momento. Ela “lá” em cima e eu “cá” em baixo. Eu disse-lhe: “quando crescer quero ser como você!” Ela olhou para mim sorridente, com toda a humildade, respondeu: “Vais ser, com certeza!”
Estreia nas autárquicas em Santo Antão
MI – Fez parte da lista do PAICV nas recentes campanhas, isto significa que já exerceu uma actividade politico-partidária?
MC – Sim, foi a minha primeira experiência. Foi um orgulho estar na lista de Odailson, um jovem que tem dado tudo por Santo Antão enquanto deputado nacional. Ele não se cansa de andar as mais de 200 zonas da Ribeira Grande, mostrando que cabe ao político ir ter com o seu povo, e não o contrário.
MI – Fez formação académica e teve oportunidade de ir para o terreno nestas campanhas. Qual foi a diferença que sentiu entre a teoria e a prática?
MC – Na universidade, a maior parte do conhecimento é teórico, mas houve um exercício que me marcou porque fiz de Presidente da AMSV por um dia. Foi um trabalho escolar e na altura a presidente da Mesa era Celeste Fonseca. Com toda a minha ousadia perguntei-lhe se tenho capacidade para a substituir um dia. Ela disse claramente que sim.
Ao fim e ao cabo, a teoria e a prática não foram tão diferentes porque nunca fui uma aluna restrita à matéria. Procuro factos e ir além da teoria. Às vezes ensaio em casa como se fosse um teatro porque quero ser uma grande politica e incentivar outras mulheres.
Aplicar a comunicação política
MI – Como usou os conhecimentos teóricos durante campanha?
MC – O meu primeiro contacto no terreno foi na zona de Garça. Foi onde comecei aplicar a comunicação política. Como dirigir-me aos eleitores. Lembro-me de ter conhecido um jovem que tinha uma ma imagem dos politicos e que se sentia desanimado, sem perspectiva. Fui ter com ele e coloquei-me no seu lugar. Mostrei-lhe a minha trajetória até conseguir o meu diploma universitário. Toquei a sua sensibilidade, falei o que ele precisava ouvir e ele sentiu-se mais confiante.
MI – A sua primeira experiência de campo surgiu durante esta pandemia. Era aquilo que sonhava? Como a pandemia influenciou na tua atividade de campanha?
MC – De uma certa forma teve influências negativas. Se estivéssemos numa altura sem Covid seria diferente. Num comício poderia transmitir melhor a minha mensagem. Por outro lado, tivemos a oportunidade de entender melhor as dificuldades que as comunidades enfrentaram antes e durante a pandemia. Para mim, o que vale mais foi a oportunidade que tive de conhecer melhor a realidade da Ribeira Grande. O meu sonho era ganharmos a Câmara, não por vaidade pessoal, porque a politica não deve ser usada para atingirmos objectivos individuais ou partidários, mas sim para trabalhar para a população.
MI – Quer ser activista política e estimular outras mulheres a entrar na politica. Porquê esta preocupação?
MC – A política cabo-verdiana foi sempre dominada pelos homens. Gostaria de saber o motivo!? Agora há mais mulheres na política devido a Lei da Paridade, mas quero que as mulheres tenham mais consciência de que podemos fazer aquilo que os homens fazem. As mulheres já sofreram discriminação na política, tratadas como incapazes. Se somos iguais pergunto porquê os homens tomaram a dianteira de muita coisa importante?!
“Guerra dos sexos”
MI – Acha que as mulheres precisam disputar o seu lugar na política com os homens?
MC – Aqui não se trata de uma guerra dos sexos, queremos ser complementares e não oponentes.
MI – O que uma mulher faz de diferente na política em comparação com um homem?
MC – Como disse antes, temos o lado da sensibilidade humana muito apurado.
MC – O homem não é também sensível?
MC – Sim, mas a nossa sensibilidade é mais apurada talvez devido ao instinto materno. Mas, os homens têm também as suas cartacterístiscas importantes, por exemplo são mais carismaticos. Se juntarmos tudo isso poderemos ter uma politica mais equilibrada. E não nos devemos esquecer que estamos num pais democrático.
MI – É costume dizer-se que a presença da mulher “humaniza” mais a politica. Concorda?
MC – Sem dúvida e volto a frisar a questão da sensibilidade feminina. Somos mais sensíveis aos problems das famílias, principalmente quando há crianças que sofrem.
Dar “ordens” em casa e na política
MI – Acha que é menos provável uma mulher tornar-se ditadora do que um homem?
MC – Como responder…; diria que sim. Em casa temos a mania de querer mandar, dar ordens sobre como a casa deve estar arrumada, etc. Mas isso não é ditadura ou autoritarismo, apenas queremos ver as coisas organizadas. Será assim também na politica para vermos as coisas funcionarem correctamente.
Se formos para a politica para assumir o poder e resolvermos os nossos problemas é muito provável que sejamos corrompidos. Mas a politica deve ser usada em prol das comunidades e de um país.
MI – Diz-se que o poder tem a força de corromper o ser humano. A mulher será um caso à parte?
MC – Acho que isso depende do carácter da pessoa. Se formos para a politica para assumir o poder e resolvermos os nossos problemas é muito provável que sejamos corrompidos. Mas a politica deve ser usada em prol das comunidades e de um país. Se um politico é eleito pela população, com que direito vai aproveitar essa situação para se enriquecer?
MI – A política tem uma imagem negativa na sociedade e, por arrastamento, podemos concluir que o homem é o principal culpado, porque domina a classe politica. Acha que a mulher será diferente se passar a gozar de um grande poder politico?
MC – Volto a insistir que isso depende do carácter de cada pessoa.
“Comandar” homens
MI – O que pode mudar numa mulher no poder pelo facto de saber que vai ter que “comandar” homens?
MC – Há sempre aquele receio do julgamento dos homens sobre a nossa capacidade. Mas, como somos cientes das nossas qualidades, estou certa de que saberemos lidar com os homens, mostrar a nossa inteligência, sensibilidade e espirito democrático.
MI – Qual o seu grande objectivo politico?
MC – São muitos (risos). Já recebi convites em S. Vicente para concorrer para a presidência da JPAI e para integrar a lista do PAICV nas autárquicas, mas não aceitei porque quero começar a exercer a minha carreira política em Santo Antão, minha ilha. Quero acabar com muita coisa errada a começar pela Ribeira Grande. Lá vejo que as pessoas, por detrás do sorriso e do olhar tenro, escondem muita tristeza, medo e lágrimas. É como se estivessem sob um regime ditatorial. Por isso sonho um dia ser presidente da Câmara ou da Assembleia e mostrar ao povo que não deve temer os políticos. Deve ser o contrário, porque quem manda é o povo. Depois de alcançar o meu objectivo local quero galgar o patamar nacional, mas não quero ir sozinha nessa luta. Quero estar rodeada de outras mulheres.