Julgamento A. Oliveira: “Há seis anos que espero por este momento”

O advogado Amadeu Oliveira começou a ser ouvido na tarde de ontem no tribunal de São Vicente, logo após a leitura do despacho de pronuncia  pelas juizes Circe Neves e Maria das Dores. Fez questão de se identificar sozinho para o poder judiciário e, logo de seguida, mostrou-se feliz por, finalmente, ter a oportunidade de se submeter ao sistema judicial. “Há seis anos que espero por este momento”, declarou no inicio da sua preleção, que durou mais de uma hora e meia, tempo que aproveitou para, sobretudo falar do caso Arlindo Teixeira, mais precisamente para negar ter aproveitado da sua função de deputado para ajudar este seu constituinte a sair do país. 

Segundo Oliveira, está preso porque, supostamente, praticou actos como deputado, sendo esta a primeira falaria do despacho de pronuncia. Lembrou que foi nomeado defensor oficioso de Teixeira por nomeação do Estado, através do juiz Afonso Delgado, em agosto de 2015. Jurou defender o seu constituinte, sem olhar a meios e, se for preciso, morrer no cumprimento deste dever. “É absolutamente incoerente. Durante cinco anos defendi o Arlindo Teixeira, salvo por motivos de força maior em que, em três ocasiões, pedi a três pessoas para me substituir. Seis anos depois fui eleito deputado, mandato que exerci durante um mês e 20 dias. Como é possível apagar os cinco anos e pegar um mês para dizer que cometi crimes que podem me colocar na cadeia durante 19 anos?”, interroga.

Mais veemente, questionou o tribunal como poderia agir enquanto deputado, se nunca usou nenhum meio do Parlamento. Aliás, fez questão afirmar que recusou o passaporte diplomático, carros e sequer nunca recebeu ajudas de custo enquanto esteve na AN. “E tudo o que paguei  para  Arlindo Teixeira, que é um doente mental e fisico. Então como dizer que usei e abusei dos poderes de deputado, que deve comportar bem na sua vida pública e privada, se não o Ministério Público diz toma oito anos de cadeia”, assegurou, deixando claro que tudo o que fez foi na qualidade de advogado/defensor oficioso. 

Manipulação

Oliveira aponta outro ponto da acusação que não se sustenta, do seu ponto de vista. “Ao dizer que no decurso de um desentendimento, o seu constituinte trocou razões com a vítima e Teixeira espetou-lhe uma faca no peito, o MP está a branquear os factos. Teixeira estava de costas com os enteados e a namorada a descascar cana e a preparar uma encomenda para trazer para São Vicente porque cumpria o seu último dia de férias em Santo Antão, quando foi atacado pelo agressor, que o confundiu com um desafecto, Jack Sabina. Houve uma brutal agressão, que provocou uma fratura no cotovelo, luxação de um joelho, de entre outros. O agressor estava totalmente descontrolado”, relata, destacando mais uma falácia. “Fui detido por ter agido como deputado. Entretanto, estando preso na Cadeia da Ribeirinha, sou notificado pelo STJ para pagar as contas de Teixeira, que me considera o seu legitimo defensor.” 

Quanto aos alegados “ataques” aos juízes do STJ e à instituição, disse não retirar uma vírgula porque Teixeira foi condenado com falsidades e com inserção de inverdades no processo. E prometeu fazer prova de tudo o que disse ao longo do julgamento. Disse, por exemplo que é falso que o Tribunal Constitucional mandou libertar o seu constituinte e autorizou o STJ a fazer o que bem entender. Sobre este particular, explicou que o TC só faz fiscalização negativa, ou seja, destrói e declara nulo tudo o que o Supremo fizer de inconstitucional. “É inconstitucional qualquer tribunal analisar o processo de Teixeira sem ter atenção o n. 3 do artigo 261 do Código de Processo Penal. Toda a minha defesa baseou neste artigo que diz que nenhuma medida cautelar será aplicado ao arguido quando houver fundadas razões para crer que a falha foi cometida ao abrigo da culpa (legitima defesa). Mas, violando este artigo, o STJ aplicou mais três medidas de coação ao meu constituinte. Por isso a minha revolta.”

Acusações genéricas

Oliveira acusou, por outro lado, o Ministério Público de, ao longo do despacho de pronuncia, fazer um conjunto de acusações genéricas que não permitem a defesa, com o único intuito de o manter na cadeia. Ao ser confrontado pela juíza Circe Neves com declarações ao Mindelinsite a ele atribuídas e nunca negadas, de que poderia parar com os “ataques” aos juizes se setes mandassem soltar Teixeira e devolvessem um apartamento apreendido a uma idosa na ilha do Sal, o arguido diz não lembrar de ter feito estas declarações, mas não nega a autoria, alegado que estava em um momento de frustração e raiva. Negou no entanto, categoricamente, que o julgamento da Praia tenha sido suspenso porque se elegeu deputado. “O julgamento começou em 2018, fui eleito em 2020. Mas este é um processo que nenhum juiz queria aceitar. Houve cinco escassas. Todos desistiram.”

O julgamento foi suspenso às 20h e foi retomado hoje às 9 horas, com o juiz a confrontar o arguido com os demais pontos do despacho de pronuncia. Seguem-se perguntas do Ministério Público e da equipa da defesa. A audição das testemunhas ficou agendada para os dias 1 e 3 de setembro, sendo que os da Praia serão ouvidas através de videoconferência, a partir do Tribunal da Relação de Sotavento. 

Durante o julgamento, o Mindelinsite foi alertado para a disposição da sala de audiências, em que o MP está ao lado dos juízes, sendo parte do processo. Segundo este causídico, é exigido uma posição de igualmente entre a acusação e a defesa. Questionou igualmente a colocação do arguido, longo da sua equipa de defesa e a presença de guardas prisionais armados dentro da sala, o que é proibido.

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