A Comissão Política Nacional do PAICV acusou o MpD de desorientação no sector dos transportes marítimos. Joao do Carmo reagia ao anúncio do aumento de 25% nas tarifas de carga feita pela concessionaria dos transportes marítimos a partir de outubro, entretanto suspenso até que sejam dadas por terminadas as consultas setoriais em sede da Direção Nacional de Políticas do Mar. Inconformado, João do Carmo pergunta para quem o Governo está a governar.
Este membro da CPN do PAICV, que falava à imprensa em São Vicente, cita a lei n.º 24/X/2023, que aprova o Código Marítimo de Cabo Verde, mais precisamente o artigo 467.º Regime de preços , que define quer o preço quer do bilhete para os passageiros, quer para o transporte de mercadorias. “Todo o processo legal está definido na lei. Mas o governo ignora a lei. Nenhuma concessionaria pode definir o preço das tarifas por si só”, refere, justificando com o n.1 deste mesmo artigo que diz que “o regime de preços do serviço público de transporte marítimo inter-ilhas deve ser estabelecido pela entidade com funções de regulação económica para o setor, tendo em consideração, os custos de exploração e os princípios de transparência, não discriminação e acessibilidade dos usuários.”
“Com vista a garantir a acessibilidade dos preços do serviço público, podem ser previstos sistemas de preços especiais ou diferenciados com base em critérios geográficos e categoria dos serviços ou dos usuários”, reforça com o número dois, para acrescentar que “os preços não devem exceder os parâmetros máximos estabelecidos na legislação geral de preços que, ao caso, resulte aplicável.”
Com base neste artigo, afirma, está-se perante uma matéria de exclusiva determinação do Estado, através da entidade que o representa, no caso em concreto, da Entidade Reguladora Económica do Setor Marítimo. “Nunca, em caso algum, o preço a ser praticado para o serviço público de TMII deve ser determinado, imposto e implementado ao belo querer da concessionária do serviço. Caso inédito em Cabo Verde e no mundo”, pontua, realçando que o PAICV tem dito, sucessivamente no Parlamento, que uma das primeiras coisas que se deve fazer uma economia livre é a regulação econômica.
Repasse do poder
De acordo com este político, até a data, prevalece a Portaria nº 19/2006 de 14 de agosto de 2006 que regula o preço a ser praticado para os TMII de mercadorias. Por isso, não é aceitável que o governo venha a repassar a transportadora o poder de “revogar” uma portaria e deliberar o preço, que deve praticar para o transporte de mercadorias no âmbito de prestação de um serviço público. “A preocupação assente é que o Desgoverno repassou poderes à concessionária do serviço de transporte marítimo inter-ilhas, poderes excessivos, até ao ponto de determinação por si só, os preços para o serviço público. No entanto, com base no artigo 467º, a entidade reguladora econômica tem a responsabilidade de estabelecer e regular os preços, garantindo que eles sejam justos, transparentes e acessíveis para os usuários. Isso é comum em muitos países para garantir que os serviços públicos essenciais, como o transporte, sejam prestados de maneira equitativa.”
Do Carmo concorda que a Portaria nº 19/2006 deve ser alterada, mas, por regulamentos específicos relacionados ao Código Marítimo de 2023, lembrando que o governo tem o poder de atualizar e modificar as regulamentações à medida que as circunstâncias e as necessidades mudam. “É importante que os cidadãos e as partes interessadas acompanhem essas mudanças e expressem suas preocupações por meio dos canais apropriados, como o diálogo com as autoridades competentes e a participação em processos de consulta pública, se for o caso. Isso pode ajudar a garantir que as políticas e regulamentações sejam equitativas e atendam às necessidades da população.”
Critica, no entanto, a não realização de uma Consulta Pública ao dizer que o governo ignora a população em geral, ignora as autoridades do sector, os utentes/clientes, enfim, um desgoverno total. Cita, por outro lado, o artigo 468º do Código Marítimo de Cabo Verde (CMCV), que estabelece que os prestadores do serviço público de transporte marítimo inter-ilhas têm direito a uma compensação económica pela exploração desse serviço. “O valor dessa compensação é determinado por portaria aprovada pelo membro do Governo responsável pela Administração Marítima. Mantem-se uma grande preocupação com a falta de transparência ou a magnitude da compensação económica garantida aos prestadores de serviços de transporte marítimo inter-ilhas de acordo com este artigo. A questão da compensação económica em serviços públicos é frequentemente debatida e pode variar de acordo com os interesses, regulamentações e objetivos do governo”, constata.
Para Do Carmo, é importante que os cidadãos e as partes interessadas acompanhem de perto como essa compensação é determinada e aplicada, e que participem nos processos de consulta pública, se houver, para garantir que essas políticas atendam aos interesses públicos e sejam transparentes. “Urge que a compensação econômica estabelecida no Código Marítimo de Cabo Verde, que sabemos na prática é excessiva ou inadequada, que seja considerada envolver em discussões públicas sobre o assunto ou buscar orientação junto a órgãos de governo e organizações da sociedade civil que trabalham na área de transporte marítimo e regulamentação económica em Cabo Verde. Essas ações podem ajudar a influenciar políticas e regulamentações futuras”, pontua.
Segundo o político, as preocupações do PAICV sobre o rumo que o país está a tomar aumentam a cada dia porque há retrocessos em vários domínios, sendo que no sector dos transportes marítimos está-se de mal a pior. “O PAICV nos seus 15 anos de governação, no sector marítimo, criou todas as condições para tivéssemos uma Agência Marítima Portuária com poderes e independência total para fazer a regulação técnica e económica. Uma das primeiras medidas do governo do MpD, em 2016, foi a extinção da AMP. Sabia o que iria fazer com o concurso internacional dos transportes marítimos e a concessionária escolhida faz o que bem entende neste sector”, finaliza.