A Comissão Instaladora da Ordem dos Psicólogos de Cabo Verde (CIOPCV) convocou hoje a imprensa para denunciar a caducidade do seu mandato de dois anos, sem que tenha conseguido realizar as suas primeiras eleições. Em causa, o alegado incumprimento por parte do Ministério da Saúde de várias promessas, de entre elas um protocolo assinado entre as partes, com efeitos imediatos, que previa a transferência mensal do montante de 208 mil escudos para realização das suas despesas.
De acordo com Denise Centeio, a CIOPCV foi criada, através da Resolução nº 105/2021, com competência para aceitar inscrições, produzir e manter atualizado o quadro geral dos psicólogos, orientar o exercício da Ordem, dar pareceres e informações a entidades públicas e privadas e proceder à convocação das primeiras eleições dos titulares dos órgãos. “Para a efectiva materialização destes poderes, em março de 2022 a comissão instaladora solicitou ao Ministério da Saúde apoio de natureza financeira e jurídica e, em resposta a 20 de outubro – cerca de sete meses depois -, assinamos um protocolo no qual ficou estipulado que a tutela iria transferir mensalmente, a título ode apoio para realização das despesas, o montante de 208.333 escudos, com efeitos imediatos”, explica.
Volvidos 13 meses, o MS já deveria ter transferido cerca de três milhões de escudos, mas até agora não receberam nada. Por causa disso, a CIOPCV não teve condições para arrendar um espaço para a sua sede, contratar um funcionário para apoiar nas tramitações administrativas, adquirir equipamentos e suportar despesas de comunicação, entre outros. “Ciente de que o apoio preconizado no protocolo pudesse apoiar a preparação das eleições, a CIOPCV insistiu com o MS e fez inúmeras tentativas de contacto, até que, no dia 26 de setembro, conseguiu uma audiência online com a ministra da Saúde. A CIOPCV expôs a sua situação e as suas necessidades. E a tutela indigitou um ponto focal para este processo e nos solicitou o mesmo na Praia. Adiantou-nos, entretanto, que o MS não poderia cumprir o protocolo porque a verba não havia sido contemplada no Orçamento do Estado”, refere a bastonária-interina.
Eleição sem listas candidatas
Entretanto, segundo Centeio, a ministra da Saúde assumiu o compromisso de oferecer outros apoios para possibilitar a realização das eleições, o que nunca aconteceu, não obstante o envio de um email com descrição do tipo de apoio, atendendo a solicitação de Filomena Gonçalves. A falta de resposta acabou por comprometer a realização das eleições previstas para 07 de outubro, afirma. É que, disse, sem meios para contactar os associados, fica difícil estimular os colegas a disponibilizar-se para participar do processo. “Durante estes dois anos, trabalhamos em condições lastimáveis. Não temos um espaço fisico que funcione como sede da Comissão. Temos cerca de 200 psicólogos inscritos e não foi possível realizar as eleições porque não houve uma lista de candidatos. Mas temos de compreender porque o exercício dos cargos é gratuito”, diz esta fonte. Enfatiza que se trata de um exercício muito trabalhoso e, sobretudo o primeiro mandato, apresenta muitos desafios. Na sua perspectiva, é algo que não constitui estimulo, especialmente se não houver condições para se chegar junto dos psicólogos e fazer o trabalho de sensibilização e de mobilização.
Diante deste impasse, Centeio explica que propôs ao MS a renovação do mandato dos membros da CIOPCV por um período de um ano, a fim de convocar novamente as eleições, mas até agora não teve retorno, sequer para saber se a proposta foi levada ao Conselho de Ministros. Por isso, a estranheza quando Filomena Gonçalves referiu, na sessão ordinária da AM de 06 de dezembro, que o ministério tem estado a trabalhar com a CIOPCV para a instalação da Ordem e para a realização das eleições. “Sr. Ministra, que trabalho? A CIOPCV não entende que, em dois anos, ter-nos acolhido em duas reuniões, por insistência nossa parte e sem frutos, seja trabalho”, desabafa, lamentando, por outro lado, a afirmação da ministra que o cancelamento das eleições seja responsabilidade da CIOPCV e dos seus profissionais.
“Sra. Ministra, não lave as mãos das suas responsabilidades. Mesmo diante das dificuldades, a CIOPCV trabalhou para a realização das eleições. A não apresentação de listas de candidatos reflete a fraca coesão da classe e a desmotivação dos colegas neste processo. Absolutamente compreensível diante do cenário ‘zero encontro cara a cara’. Presumivelmente, isso poderia ter sido contornado se o MS tivesse assegurado condições para a CIOPCV exercer as suas funções”, reforça. Esta aproveita, no entanto, para congratular com a afirmação de F. Gonçalves, que declarou 2024 o ano da saúde mental.
Para a bastonária-interina, a declaração da ministra e o anúncio da contratação de recursos humanos são uma lufada de ar fresco para as comunidades sem serviços de saúde psicológica acessível. Centeio chama, no entanto, atenção da tutela para, na contratação de RH, levar em consideração o rácio de psicólogos recomendado mundialmente de um para cada cinco mil habitantes, sendo que em Cabo Verde a realidade é de 0,25 psicólogos para cada cinco mil habitantes.
Esta responsável mostrou-se igualmente satisfeita com o anúncio de mais formação em saúde mental no país, mas advertiu para o aproveitamento dos recursos humanos qualificados, de modo que estejam ao serviço da população.
Em jeito de remate, apela para que, na senda do ano da saúde mental, a tutela mobilize esforços, junto de entidades, para a garantir Seguros de Saúde que comparticipem consultas de Psicologia, a fim de que a população com menos capacidade económica não esteja permanentemente em desvantagem e desigualdade no que respeita ao exercício dos seus direitos de saúde mental. “Este é o caminho para alcançar os objectivos de desenvolvimento sustentável e a cobertura universal da saúde.”