O Governo reforçou ontem em comunicado a sua determinação em tentar anular o acórdão do Tribunal Arbitral, que condenou o Estado de Cabo Verde a pagar uma avultada indemnização à CV Interilhas, empresa concessionária dos transportes marítimos inter-ilhas desde 2019. Conforme o Executivo, está a decorrer o prazo para levar o caso à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça, como direito que assiste às partes, caso entenderem que a decisão proferida padece de ilegalidades que determinam a respetiva anulação judicial.
“O Governo não se conforma com o sentido decisório constante da decisão do Tribunal Arbitral, que entende não ter respaldo na prova produzida, bem como nas alegações formuladas pelas partes”, assegura o poder central, confirmando assim as primeiras reações do ministro Olavo Correia sobre o imbróglio quando confrontado com o conteúdo do acórdão no Parlamento. O Governo sublinha no comunicado que fará tudo no quadro da lei em vigor para defender o interesse público – e garantir de forma continuada o serviço de transporte marítimo – suportado por uma assessoria técnica especializada.
A nota faz uma retrospectiva do contencioso instalado entre o Governo e a CVI desde 2019, lembrando que, no âmbito da execução do contrato de concessão, tem acontecido divergências de natureza diversa entre o Estado de Cabo Verde e a concessionária. Casos que, salienta, têm motivado a assunção de “posições firmes” por parte do Governo no que concerne à execução do mencionado contrato.
Em concreto, conforme o Executivo, a equipa técnica responsável pelo acompanhamento da concessão tem vindo a manifestar divergências de entendimento no que concerne aos custos elegíveis peticionados pela concessionária. Este desentendimento, diz, tem vindo a fundamentar a retenção de montantes cujo pagamento é exigido pela concessionária a título de indemnização compensatória. “E, note-se, esta retenção foi feita legitimamente porquanto subsistiam dúvidas, de acordo com os pareceres técnicos apresentados sobre o assunto, bem como tendo em consideração os relatórios de auditoria externa independente, que foram oportunamente transmitidas à concessionária, quanto à exigibilidade dos referidos pagamentos.”
O Governo enfatiza que foi possível acabar com as dúvidas com a celebração, em 2023, de um aditamento ao contrato. Neste âmbito, o valor da indemnização compensatória acabou fixado em 6,6 milhões de euros por ano. Este montante, assegura o Executivo, é manifestamente inferior ao que a CVI vinha exigindo nos anos anteriores e que estiveram na base das divergências. “Assim, a partir de 2023, não há valores retidos, pelo que, independente das divergências que resultaram da celebração do contrato em 2019, as partes estão vinculadas ao cumprimento das obrigações constantes do aditamento de 2023”, considera o Palácio da Várzea.
Inconformada, a CVI, revela o comunicado, decidiu notificar o Estado, através de uma interpelação admonitória, elencando os montantes que no seu entendimento estariam em dívida: 16 milhões de euros. Sem entendimento possível, a CVI acabou por requerer, em 2024, a constituição de um tribunal arbitral, que determinou em junho de 2025 o pagamento pelo Estado de montante superior, que pode chegar aos 40 milhões de euros.
A CVI reclama perdas pelo descumprimento da regra de exclusividade no transporte inter-ilhas, mas, para o Governo, essa exclusividade cinge-se apenas ao serviço público concessionado de transporte marítimo. Por outras palavras, não abrange os operadores que previamente à assinatura do contrato já eram titulares de licenças de operação, nem o transporte que não integra a concessão de serviço público.
O poder central diz respeitar todas as decisões jurisdicionais, mas reserva o direito de discordar do entendimento do tribunal arbitral. Salienta, aliás, que a decisão não foi unânime, tendo sido emitido voto de vencido por um dos árbitros, que se pronunciou em sentido contrário sobre diversas condenações. O mesmo, enfatiza o Executivo, elencou de forma exaustiva os erros em que o referido tribunal incorreu na sua decisão.
Inconformado com o sentido do acórdão, por entender que não tem respaldo na prova produzida e nas alegações formuladas pelas partes, o Governo vai apresentar um recurso ao Supremo Tribunal de Justiça.