O deputado Amadeu Oliveira instou a plenária da Assembleia Nacional a aceitar o pedido de levantamento da sua imunidade parlamentar solicitado pelo Tribunal da Praia para continuar a ser julgado pelo suposto cometimento de 14 crimes de ofensa à honra contra os juizes Benfeito Mosso Ramos e Fátima Coronel, ambos do Supremo Tribunal de Justiça. Oliveira pede que a autorização do Parlamento seja concedida com a maior brevidade uma vez que o julgamento deve ser retomado já amanhã pela juíza Ivanilda Varela.
Aliás, foi a própria magistrada do 3. Juízo-Crime que formulou à Assembleia Nacional o pedido de levantamento da imunidade parlamentar do arguido, facto esse comunicado pelo Presidente da AN no dia 26 de maio ao deputado eleito pela lista da UCID.
Amadeu Oliveira, que já havia garantido que nunca iria se esconder atrás do biombo da imunidade parlamentar para impedir a continuação do seu julgamento, diz no documento enviado ao Parlamento – com conhecimento ao presidente da UCID e das bancadas do MpD e PAICV – esperar uma decisão célere ao pedido de levantamento da imunidade “não vá a AN ser posteriormente acusada de estar a dificultar e a obstaculizar a justiça”.
Oliveira volta a lembrar que está a responder pelo eventual cometimento de 14 delitos contra dois magistrados do STJ e este próprio tribunal e confirma ter feito “duras criticas” contra o “sistema da não-justiça” implantado em Cabo Verde, “com destaque para fraudes processuais cometidos pela seção criminal do STJ”. Como enfatiza, é nesta seção onde estão inseridos os juizes supostamente ofendidos, na medida em que as fraudes processuais por ele denunciadas eram de tamanha gravidade que se impunha uma denúncia pública forte, firme e determinada, “com uma linguagem adequada para o povo entender a gravidade da situação”.
Isto, segundo Oliveira, para impedir que a própria Seção Criminal do STJ continuasse a cometer grandes “barbaridades jurídicas contra cidadãos inocentes”, a ponto de deixar “pobres coitados” anos a fio na cadeia por manifesto desprezo pelos direitos mais fundamentais das pessoas. “Nesta ordem de ideias, tornou-se necessária a utilização de uma linguagem para ser compreendida pelo povo sem grandes esforços interpretativos, donde se justificou usar expressões como ‘aldrabice’, ‘aldrabãozeco’, ‘corja de juristas de má consciência’ e ‘actuação ao estilo do crime organizado’. Para se descrever e caracterizar as ações e omissões ilícitas desses juizes prevaricadores”, explana o deputado.
Oliveira explica ainda que, apesar de apenas Mosso Ramos e Fátima Coronel terem tomado a iniciativa de instaurar processos-crimes contra a sua pessoa, a verdade é que as suas críticas foram direcionadas para mais de uma dezena de magistrados, designadamente contra: os juizes do STJ Anildo Martins, Manuel Alfredo, João Gonçalves, Teresa Évora; duas juízas do Tribunal da Relação de Sotavento (Zaida Lima e Rosa Vicente); os juizes de Comarca Afonso Delgado, Ivanilda Varela – que está agora a presidir ao seu julgamento -, Nidianino Romerito e ainda Bernardino Delgado – actual presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial – e Ary Santos, membro do CSMJ.
“Porque o signatário Amadeu Oliveira também terá afirmado que há indícios que nos levam a crer que poderà existir uma espécie de ‘crime organizado instalado no sistema judicial de Cabo Verde e que determinados magistrados vão cometendo crimes no exercício das suas funções jurisdicionais, confiados que o sistema instalado nunca ou tardiamente vai reagir ao ponto de assacar responsabilidades…” Por isso, para Oliveira, torna-se forçoso submete-lo a julgamento e demonstrar os factos e as circunstâncias que o motivaram a fazer tamanha denúncia.
Devido a contundência das suas palavras, alguns juizes foram forçados a reagir, mas, segundo Oliveira, teoricamente para defender os seus “bons nomes e reputação”, como se, diz ele, a imagem pública dos magistrados tivesse mais valor do que a liberdade de presumíveis inocentes e a dignidade de pessoas de bem. Deste modo foi processado por Benfeito Ramos e Fatima Coronel e pelo próprio STJ, este representado no processo pelo Ministério Publico.
O arguido lembra que, de 20218 a esta data, o seu processo passou pelas mãos de 4 juizes sem que nenhum deles tenha levado o julgamento até ao fim. Primeiro foi o magistrado Alcides Andrade – que acabou por pedir escusa -, depois a juíza Sara Ferreira – que se declarou incompetente para substituir Alcides Andrade -, mais tarde Ângela Rodrigues – que também se declarou incompetente nos mesmos moldes – e agora a magistrada Ivanilda Varela – que está a presidir a audiência na Comarca da Praia.
No documento, Oliveira volta a aflorar toda a controvérsia em torno da escolha do Juizo-crime competente para assumir o seu caso e a polémica indicação de Ivanilda Varela para ajuizar o julgamento, o que foi inclusive contestado pelo arguido na primeira audiência. Aliás, o julgamento de Oliveira tem sido marcado por diversas “peripécias”, a começar pela sua detenção pela PN no dia 20 de fevereiro, para ser obrigado a comparecer perante o tribunal.
Apesar de contestar a atitude da juíza Ivanilda Varela de pedir o levantamento da sua imunidade, quando há outros procedimentos a serem antes respeitados pelo tribunal, Oliveira instou o presidente da AN a submeter o seu caso à apreciação da plenária em regime de urgência, para continuar a ser julgado. Oliveira diz entender que a AN deve sempre autorizar e aceder aos pedidos formulados pelas instâncias judiciais, posto que ele não se candidatou a deputado nacional para beneficiar da imunidade parlamentar, como quem quer fugir das garras da justiça.