“A nossa justiça é atacada por várias razões, mas não pela falta de ética dos magistrados do MP”, considera o PGR

Os magistrados do MP vão finalmente dispor de um Código de Ética, a ser aprovado amanhã numa conferência internacional a decorrer no Mindelo.

Os magistrados do Ministério Público vão passar a reger a sua conduta formalmente por um Código de Ética, o primeiro a ser aprovado pela classe profissional. Uma proposta do documento já foi elaborada e será debatida hoje e amanhã durante a Conferência Internacional sobre a Ética e a Integridade dos Magistrados do Ministério Público, que decorre na cidade do Mindelo. O documento deverá ser assinado amanhã pelos 41 magistrados reunidos em S. Vicente nesse evento promovido pela Procuradoria-Geral da República, em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (ONUDC), no quadro do programa global CrimJust financiado pela União Europeia.

Questionado pelo Mindelinsite sobre o facto de só agora este documento passar a existir, o Procurador-Geral da República assegura que o assunto tem vindo a ser debatido internamente faz algum tempo e sublinhou que um código do gênero implica uma análise profunda porque não é algo que o Ministério Público pode impor aos magistrados. “Cada coisa tem o seu tempo certo, mas o facto de termos funcionado todo este tempo sem um Código de Ética não quer dizer que tenhamos registado comportamentos antiéticos dos nossos magistrados. A nossa justiça é atacada por várias razões, mas não pela falta de integridade dos Procuradores da República”, frisa José Landim, para quem a adopção do código acaba por ser a formalização de algo intrínseco à postura dos magistrados cabo-verdianos.  

O documento, prossegue o PGR, vai reforçar a conscientização dos Procuradores e entra em vigor logo após a sua assinatura. José Landim adianta que já existe uma proposta trabalhadada com a assistência da ONUDC, tendo por base a experiência da Bolívia, cujo conteúdo foi consensual. Trata-se de um código, segundo esta fonte, muito parecido com outros existentes em vários países. Um dos pontos a ser esclarecido ainda hoje será determinar a quem compete tomar a iniciativa da elaboração do referido documento, se ao Conselho Superior dos Magistrados do Ministério Público, à Procuradoria-Geral da República ou aos próprios magistrados.  

A ideia, segundo o PGR, é que quem concorde subscreva o código. José Landim faz questão de frisar que a violação dos princípios éticos não traz, só por si, consequências jurídico-penais ou disciplinares. Lembra que há leis em vigor que enquadram os Procuradores e que, se forem violadas, acarretam responsabilidades de carácter disciplinar e/ou criminal.

Segundo a ministra da Justiça, o debate sobre a necessidade ou utilidade de um código de conduta para magistrados há muito ocupa o sector jurídicos, com maior ou menos entusiasmo, “mas com argumentos de interesse a qualquer cidadão atento e interessado no assunto”. Evitando tomar parte e partido na matéria, Joana Rosa entende que a actuação dos magistrados deve obrigatoriamente fundar-se num conjunto de valores e princípios que constituam um “referencial de integridade, de ética e de identidade socioprofissional”. Para ela, tudo isso deve resultar de um debate no interior das magistraturas como condição para a auto-vinculação a esse conjunto de princípios e valores.

“Assim, por determinação legal e dever do nobre ofício, aos magistrados do Ministério Público espera-se e confia-se que atuem e decidam invariavelmente segundo critérios de integridade, honestidade, equidade e transparência, procurando promover a confiança no sistema de justiça”, salientou a ministra no seu discurso de abertura da conferência internacional do Mindelo. Joana Rosa frisou ainda que os magistrados devem actuar sempre com independência em relação a interesses de qualquer espécie e em relação às suas convições políticas, religiosas, filosóficas ou outras, o mesmo princípio valendo para a sua conduta na vida.

Por seu lado, a coordenadora sénior da ONUDC considerou de extrema importância o facto de a PGR ter colocado na agenda a aprovação do código ético para os magistrados. Sobre a conferência, Cristina Andrade lembrou que a ONUDC preconiza o reforço das capacidades dos magistrados do MP no âmbito do programa CrimJust, que conta com financiamento da União Europeia. Salienta que o programa é parte de uma iniciativa mundial de combate a fluxos ilícitos. Para a ONUDC, sublinha, dar combate a esses fluxos é uma exigência sobretudo nos países de trânsito de tráficos internacionais e uma forma de se travar a criminalidade organizada.

Conforme o programa da conferência, hoje de manhã a magistrada Killy Fernandes iria apresentar o tema Ética e Integridade dos Magistrados do MP no contexto cabo-verdiano. Para o período da tarde estão previstas a apresentação do programa CrimJust “Avanços e Desafios Futuros do programa: Ética e Integridade Interinstitucional, Direitos Humanos e Perspectiva de Género” pelo coordenador António Valderde, e ainda a experiencia comparada entre o Código de Ética do Ministério Público da Bolívia por Luís Choque, chefe da Unidade de Transparência do MP desse país.

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