Aprender a conviver com o Bicho é antes de mais aprender a viver sem Ele

Somam e seguem diariamente os casos de contágios pelo novo coronavírus na cidade da Praia/Santiago Sul. Infelizmente, e contrariamente à Boavista onde tudo indica uma relativa contenção da propagação. Relativa, visto que muito pouco se tem testado nessa ilha para além dos testes de controlo dos identificados positivos. Estaria sensivelmente mais tranquilizado com as boas noticias que nos chegam da Boavista se efetivamente tivesse conhecimento de uma campanha de testes mais alargada por toda a ilha. São os nossos territórios, são as nossas gentes que sofrem. E é preciso agir pois em conformidade, salvaguardando uns e outros do pior.

Não se trata de buscar culpas. Esse não pode nem deve ser o mote da ação de nenhum de nós neste momento de pandemia. O país reagiu rapidamente, o PR interviu assertivamente e sobretudo medidas foram atempadamente decididas pelo Governo e acompanhadas manu militari pelas demais Entidades responsáveis. Isso, meus senhores, está devidamente salvaguardado caso isso seja motivo de preocupação para alguns. Mas como sempre se fez questão de frisar, a Democracia não foi engavetada com o confinamento e muito menos a nossa capacidade de analisar, refletir e positivamente opinar.

Medidas foram tomadas? Sim! Foram estas eficaz e rigorosamente seguidas no terreno por quem de direito? É caso para se ter alguma reserva, sabendo de casos concretos vários de falhas que devemos classificar de graves, como por exemplo, a 40ena interrompida sem testes num dos hotéis da BV, a 40ena interrompida depois de testes mas ainda sem resultados noutro hotel da mesma ilha, o paciente positivo “esquecido” durante 12 dias numa casa com mais de 10 familiares na mesma ilha da BV, tempo de mora para se ir buscar os infetados sem medidas de contingência, lista longa mas não exaustiva. 

Todas estas sem exceção, falhas potenciadoras de contágio comunitário nas populações o que se veio a verificar para grande infelicidade dessas mesmas populações. E agora mais do que nunca, com a revelação da falta total de cumprimento das regras sanitárias mínimas exigidas no caso do Hospital da Trindade, diga lá o Diretor do HAN aquilo que quiser e bem entender. Pelo menos este teve a hombridade de colocar o cargo à disposição, coisa que ficará mais que provavelmente sem seguimento, visto que se tem que proteger a corte do risco de contágio…

O mais importante, dito isto, é celebrar as melhorias na ação que se vêm observando e mais do que tudo o facto de que de facto este vírus não está aqui na Tapadinha a fazer os estragos que vem provocando por esse mundo fora, pese embora o número significativo de infetados já identificados no país, com a Capital a ultrapassar neste dia a fatídica cifra dos 200 infetados por Covid-19.

É caso para se dizer sim que é preciso que aprendamos a conviver com o Bicho, como vêm repetindo à exaustão as Autoridades da Saúde (um pouco em jeito de deitar a toalha ao chão) mas igualmente alguns Autarcas e Dirigentes da Ilha de Santiago, puxando a corda para o seu arco, pensando Economia, simplesmente na Economia e certamente não na Saúde. Fugindo como o diabo da cruz, da evidência linear em como não existe Economia sem Saúde.

Eu do alto da minha ignorância científica na matéria vou-me repetindo à exaustão: aprender a conviver com o Bicho é antes de mais aprender a viver sem Ele, batalhar para que os territórios cabo-verdianos a salvo, por ora, da Covid-19 assim se mantenham pelo maior tempo possível. E que o meu país possa tirar proveito desse facto incrivelmente benéfico e salutar que é ter toda a Região Barlavento e duas ilhas da Região Sotavento livres de Covid-19 (digo toda a Região Barlavento em consciência visto que a Ilha da Boavista foi açambarcada administrativamente e assim artificialmente transformada numa ilha de Sotavento).

Enquanto lá fora os Dirigentes que conseguiram essa proeza, mesmo que numa pequena parcela dos seus territórios, gritam Aleluia para quem quiser ouvir (vidé a Dinamarca e o território composto pelo arquipélago das Ilhas Faroé), por estas bandas se reclama da circulação inter-ilhas em pleno período ascendente da epidemia e se brada aos céus a segurança que oferece a medição da temperatura dos viajantes, informando tranquilamente que a partir das ilhas com casos de Covid-19 serão feitos obrigatoriamente testes rápidos também. Só pode ser brincar com coisas sérias, ao mesmo tempo que nos advertem que casos de Covid-19 aparecerão forçosamente em todas as ilhas. Será então assim um facto consumado? Que nós nessas ilhas devemos aceitar de bom grado? Todo o esforço feito, todas as privações que continuam e tendem mesmo a se acentuar terão sido em vão?

Eu sou daqueles que desde o início (e ainda vamos a tempo) fui favorável a um cordão sanitário a Santiago Sul. Que não impede em nada o relacionamento económico entre as duas regiões da Ilha, mas impede sim a contaminação generalizada de Santiago que poderia sim ter toda a Região Santiago Norte melhor contida. Mas como os próprios Autarcas de STN não o desejam vou mesmo ficar por aqui nesse quesito. O que não posso deixar de aqui colocar como preocupação é a absoluta necessidade de, e porquanto a situação epidemiológica nessas ilhas não estiver devidamente salvaguardada, ou seja, em fase efetivamente descendente, se interditar completamente a circulação de pessoas entre as ilhas da Boavista e Santiago e o resto do país. Que se mantenham as duas Ilhas em 40ena obrigatória!

Já imaginaram a afronta no nosso SNS com casos de Covid-19 espalhados por todo o território nacional? Seja qual for portanto a decisão do PR relativamente ao EE vigente nessas duas ilhas por ora, e até prova do contrário, tem que permanecer vigente a interdição de circulação delas para o resto do país! O bom senso assim o dita, o rigor na luta pela contenção da epidemia assim o exige!! E que se faça realmente tudo aquilo que estiver ao alcance das Autoridades para que a situação epidemiológica nas duas ilhas e particularmente no Concelho da Praia possa no mais breve trecho possível entrar numa fase de contenção que lhes permita suspirar e respirar de alívio. Porque a afronta dessas populações, imagino, deve ser muita… 

Será isso duro e difícil para as duas ilhas, sem dúvida. Assim como o será igualmente para o resto do país vivendo nós numa organização estatal hyper centralizada como é a governação.cv . Mas é o preço que todos temos de pagar pela salvaguarda do país, é o preço igualmente a pagar de algum afrouxamento por parte das pessoas no cumprimento das medidas de restrição que nos vêm sendo impostas de há quase dois meses a esta parte.

E é sobretudo a oportunidade para o país de, e se apoiando nestes territórios que permaneceram livres do covid-19, traçar novas estratégias de desenvolvimento económico centrado nos territórios, a partir destes e não o inverso como vimos assistindo desde que Cabo Verde é Nação. Oportunidade para repensarmos o país na sua dimensão de Nação Ilhas e de Povo Ilhéu! Orgulhemo-nos de termos territórios livres da pandemia! Comuniquemos o país ao mundo através desses filtros igualmente! E sim porque não, trabalhemos para que assim se mantenham… Uma ilha a ganhar, seja ela qual for, é Cabo Verde a ganhar!!!

Alexandre Xazé Novais, 12 de Maio de 2020.

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