A Secretária de Estado da Inclusão Social reconheceu ontem que Cabo Verde tem o grande desafio de implementar uma rede capaz de envolver de forma eficaz todas as instituições que lidam com a infância de forma geral para debelar as problemáticas que afectam os menores. Na perspectiva de Lídia Lima, esse objectivo está a ser atingido porque, diz, tem constatado um forte envolvimento das entidades.
“Temos, por outro lado, o desafio de reforçar os programas e projectos em andamento, nomeadamente no que diz respeito ao empoderamento das famílias. Temos vindo a capacitar os núcleos familiares para o mercado do trabalho, através do programa inclusão produtiva e de actividade geradora de rendimento”, frisou a governante. Especifica ainda que o Governo tem estado a ajudar as famílias a colocar os filhos dos 0 aos 5 anos de idade nas creches e no pré-escolar e, ao mesmo tempo, a reforçar as estruturas do ICCA para o acolhimento de crianças em situação de risco.
Segundo Lídia Lima, o Executivo tem dado respostas de forma concertada, nomeadamente através da assinatura de contratos-programa com as Câmaras Municipais e associações e pretende reforçar as medidas de proteção das crianças com apoio integral de acesso ao sistema de saúde e à educação.
A Secretária de Estado fez este pronunciamento à margem de uma mesa-redonda organizada ontem pela Aldeias SOS na Cidade do Mindelo intitulada “Responsabilização Parental – Uma perspectiva histórica de mudança”. Composto por 3 painéis (abarcando as áreas social, educacional e jurídica), esse foi um momento de avaliação das conquistas feitas no quadro das actividades levadas a cabo visando a responsabilização parental em Cabo Verde.
“Muitas ações já foram feitas e queremos com esta mesa-redonda obter mais subsídios sobre os passos futuros para continuarmos a trabalhar nas mudanças socias, com suporte jurídico, e levar os pais a assumirem plenamente as suas responsabilidades para com os filhos”, frisa Graça Gomes, para quem é preciso reforçar políticas de apoio às famílias, mas passar a exigir mais responsabilidade aos pais que negam assumir o seu papel educativo.
“Estamos a viver numa socidade com alguma turbulência. Se temos por um lado famílias que enfrentam dificuldades em assumirem as suas responsabilidades para com as crianças, por outro lado há quem tenha condições e não assume o seu papel de forma deliberada”, revela. Na sua percepção, é na juventude onde os problemas resultantes da falta de assumpção dos pais ganham mais impacto social. Isto porque, lembra, é uma fase em que os jovens estão sujeitas a muitas influências.
“Basta ver que tínhamos 761 menores a viver em união de facto em 2021 em Cabo Verde. Pessoas ainda sem a devida maturidade e que tomam uma decisão desta envergadura. Por outro lado, as estatísticas indicam que temos 55,9% das crianças a viver sem a presença dos pais”, ilustra. Além disso, diz, os dados revelam que havia 230 crianças chefes de família em 2021 e um grande número de processos judiciais de averiguação oficiosa de paternidade.
O jurista Belarmino Lucas acentua que os processos de responsabilização parental acontecem com frequência em Cabo Verde. Abrangem o reconhecimento do direito da criança em ter uma paternidade estabelecida, o que desencadeia ações de investigação de paternidade lideradas pelo Ministério Público. Ocorrem ainda, segundo Lucas, casos de violação da integridade física dos menores ou de falta de proteção.
“Temos em Cabo Verde um quadro legislativo bastante completo do ponto de vista do estabelecimento dos direitos dos menores, da garantia das crianças e dos adolescentes. Penso que o problema se coloca sobretudo no campo da efectivação dos direitos, em particular no que diz respeito à responsabilidade parental”, considera o causídico, que foi um dos oradores da mesa-redonda enquadrada nos 40 anos da Aldeias SOS. Na sua perspectiva, é preciso tornar os mecanismos de ação mais ágeis.
A responsabilização parental é uma temática que, na perspectiva de Jacinto Estrela, tem suscitado análises mais ou menos frequentes em Cabo Verde. E, para ele, esses debates devem continuar visando apurar os factores que influenciam essa problemática. “Estamos hoje a debater o que tem sido feito para se criar as condições para as famílias exercerem o seu papel. É preciso que haja ações para que a sociedade se sinta mais sensibilizada sobre esta matéria e aqui entra o papel da comunicação social”, entende o sociólogo, que mediou o debate.