O Carnaval do Mindelo, pela extraordinária concentração popular que mobiliza, pode gerar por dia 2.770 abordagens nos desfiles pelas equipas de emergência médica, provocadas por situações como intoxicação alimentar, ingestão exagerada de bebidas alcoólicas e agressões, com cerca de 34 evacuações de sinistrados para o hospital Baptista de Sousa. Esta é a estimativa de um levantamento provisório produzido pela Associação Julia Life para a elaboração de um plano de emergência do Carnaval do Mindelo, baseado em eventos internacionais similares e em dados recolhidos junto de diversas entidades em S. Vicente.
“Isto significa que o hospital precisaria ter 34 camas disponíveis para receber casos de urgência e estar pronta para dar suporte imediato de vida a esses pacientes”, reforça Carlos Feliciano Almeida, enfermeiro urgentista formado na escola Saint Pie X, na Bélgica. Este responsável da Associação Julia Life enfatiza ainda que alguns casos iriam exigir o acompanhamento dos pacientes ao HBS por agentes da Polícia Nacional por suspeita de cometimento de crime.
O documento, que começou a ser elaborado há mais de 10 anos, prevê esse nível de atendimento médico diário com maior enfoque nos assaltos dos mandingas e no dia do desfile oficial. Para garantir capacidade de resposta, o levantamento, que ainda precisa obter mais informações, aponta a montagem de postos médicos estrategicamente ao longo da rota dos desfiles, equipados tanto para atendimentos de primeiros socorros quanto para intervenções avançadas de suporte de vida.
As equipas médicas seriam compostas por respondentes de primeiros-socorros, enfermeiros, médicos de emergência e grupos móveis de urgência, complementados por pessoal de suporte e logística. “De frisar que, nesses tipos de situações, as equipas médicas dispõem, em média, de apenas sete minutos para efectuarem a abordagem e fazerem o diagnóstico”, salienta este gestor de sistemas de saúde.
As estruturas criadas, segundo Carlos Feliciano, deveriam funcionar com base em convênios e protocolos de comunicação, garantindo um fluxo contínuo e a rápida transferência de casos críticos. O comando e a coordenação seriam garantidos por um centro operacional integrado estabelecido no terraço do Palácio do Povo, equipado com câmeras, drones e sistemas de rádio para monitoramento e gestão dos incidentes em tempo real.
“A gestão de eventos de massa requer a implementação de um Sistema de Comando de Incidentes (ICS), que possibilita a coordenação centralizada das atividades operacionais e logísticas durante o evento. O ICS permite que as diversas agências – saúde, polícia, bombeiros e emergências médicas – atuem de forma integrada, minimizando gaps na comunicação e garantindo uma resposta rápida aos incidentes críticos”, clarifica esse especialista. O planejamento de serviços de saúde e emergência para o Carnaval do Mindelo, enfatiza, deve ser encarado como uma operação complexa e multidimensional, que integra aspectos clínicos, logísticos, tecnológicos e financeiros.
“Este projecto reforça a necessidade de colaboração entre os setores público e privado, bem como a importância de um planejamento financeiro rigoroso, que considere todos os custos diretos e indiretos envolvidos na operação”, diz Carlos Feliciano, que salienta a necessidade de realização de simulações e treinamentos do pessoal afecto para que haja uma resposta eficiente.
Repensar o circuito da morada para casos de emergência médica
Um dos pontos essenciais para o sucesso da intervenção médica nos casos urgentes é a garantia das linhas de entrada e de saída das equipas de emergência. No caso da Rua de Lisboa, cujas artérias ficam todas apinhadas de gente, a situação pode ser mais crítica em caso de ocorrência de um acidente grave, segundo a citada fonte.
“Temos de repensar a situação ao longo do circuito dentro da cidade. Não sou contra as pessoas colocarem cadeiras nas vias, mas está-se perante um problema de acessibilidade geográfica. Logo, precisamos reanalisar e definir as saídas de emergência”, chama atenção esse especialista, salientando que as equipas de socorro devem poder intervir e permitir a fluidez do Carnaval. No entanto, na sua opinião, as bancadas que têm estado a ser colocadas ao longo da rota do desfile oficial são um factor negativo para as operações de emergência.
O documento ainda não está finalizado razão porque não foi apresentado à Câmara de S. Vicente, à Polícia Nacional, às seguradoras Ímpar e Garantia e à Liga dos Grupos Oficiais do Carnaval de S. Vicente. O estudo, realça a citada fonte, contempla situações que envolvam turistas, que venham a precisar de evacuação para o exterior, daí a necessidade de intervenção das empresas de seguro.
O autor está à espera de recolher outros dados para finalizar esse instrumento, que considera essencial para a segurança dos foliões
