Elly Paris: “Sofro de depressão há três anos e pensei em suicídio várias vezes”

Autora de sucessos como “Snap Boy”, “Kondê”, “Ninguém te mandá na mim” e “Así”, Elly Paris tem usado as redes sociais para falar da depressão, um mal que afecta a artista há três anos. Este problema, que costuma abordar com os seus mais de 56 mil seguidores – apenas numa das redes sociais -, levou esta jovem a pensar pôr termo à vida por diversas vezes. Com os testemunhos que passou a publicar, Elly Paris quer ajudar os jovens que sofrem de depressão e levá-los a procurarem ajuda. Mesmo com uma carreira em projecção, e o facto do seu maior sucesso ter alcançado quase um milhão de vizualizações, a cantora faz parte dos 10% da população mundial, segundo dados da Universidade de Harvard, atingida pela doença.

Por Sidneia Newton (Estagiária)

Mindel Insite – Tem usado as redes sociais para falar da depressão. Porquê neste momento é um tema que merece de si tanto destaque?

Elly Paris: Falo da depressão por sofrer desta doença ha três anos e percebo que as pessoas que estão a passar por esta fase precisam de se sentir representadas de alguma forma. Precisam perceber que não estão sozinhas. Quando descobri que sofria de depressão não vi ninguém a meu redor que falasse sobre o assunto e isso fez com que fosse muito mais difícil identificar o problema e saber que os meus sintomas eram na verdade derivados dessa doença.

MI – Quais eram os sintomas?

EP: Havia alturas em que parava de me alimentar, noutras comia muito. Tinha dias em que não conseguia me levantar da cama; outras vezes não conseguia dormir e noutras só queria dormir. Não tinha vontade de tomar banho, escovar meus dentes e nem conseguia pentear meu cabelo. Dominava-me uma vontade de morrer e ao mesmo tempo medo de morrer e perder a chance de lutar por mim. Sofria de ansiedade, coração acelerado, angústia… Sentia-me triste, uma dor profunda e sem razão aparente.

MI – Chegou a pensar em suicídio?

EP – Sim… sim! Várias vezes! Perdi as contas de quantas vezes cheguei a pensar pôr termo à vida. Pensava que, se era para viver com tanta tristeza, era mais fácil morrer.

MI – E o que a segurou nesta altura para não cometer um acto tão extremo?

EP – A minha família foi a principal razão para não me matar. Pensava na dor da minha mãe e da minha irmã ao me acharem morta e no trauma que isso poderia causar à minha irmã. Não queria que ela passasse por isso e desencadeasse este quadro que enfrento até hoje. E a música também foi uma das minhas âncoras. Agarrei-me a este sonho, até onde a minha carreira poderia me levar.

“Hoje tudo me faz chorar”

MI – As pessoas chegaram a confundir estes sintomas a que se refere como algo supérfluo, como leviandade ou preguiça, por exemplo?

EP – Até a data de hoje. Não entendem que isto ultrapassa a preguiça e que, mesmo estando acordada, não consigo me levantar. Dizem-me que o que sinto é “malandrice”! Que, por ser tão nova, tudo é “nhê nhê nhê” ou drama; que eu choro por tudo e que sou passional demais. Estes discursos fizeram-me sentir fraca e atrasaram a minha decisão de procurar ajuda especializada. Antes nada me abalava e hoje tudo me faz chorar.

MI – Acha que o facto de ser artista desencadeou este quadro?

EP – No mundo da música aconteceram diversas coisas que abalaram o meu estado emocional, mas não abalaram o meu amor pela música. Há imensas barreiras. Por um lado, muitas vezes sou rotulada na rua – xingada; por outro, aconteceram outras coisas negativas, como a desonestidade, o preconceito que nós jovens, por não cantarmos músicas tradicionais, somos alvos. Ao mesmo tempo, a minha vida artística interferia muito na minha vida pessoal. Abalava o meu lado social, por exemplo, como teria que ser a minha postura; impedia-me de fazer muitas coisas porque tinha muitos olhares sobre mim.

Na rua, interferia no modo como me expressava, o meu comportamento. As pessoas observam como me visto, como ando, o que faço, os locais que frequento. E sabemos como é a nossa sociedade. Há muita tendência para se inventar ou acrescentar coisas sobre a vida e a realidade dos outros. Havia e ainda há muita pressão que me abala. No entanto, apesar de todos os problemas, não foram estes os motivos da doença. Sinto que a minha carreira sempre evoluiu, pouco a pouco. 

MI – Lembro-me que há algum tempo, quando circulavam imagens íntimas de muitas mulheres nas redes sociais, foi uma das vítimas. Esclareceu na altura que o vídeo em que aparece uma mulher a dançar era realmente de si, mas que os outros eram de outras pessoas. Compreendo que isso a tenha abalado, mesmo tendo esclarecido os factos. Foi desde este tempo que passou a sofrer de depressão?

EP – Não foi a causa. Eu já estava a sofrer de depressão antes disso. Mas, é claro que isso abala qualquer um…

Separação com Djarilene

MI – A separação com Djarilene Paris, com a qual fez uma dupla de sucesso, foi causa ou consequência deste seu quadro?

EP – Também não teve a nada a ver com a situação. O que me levou a este estado foram causas pessoais que me perturbaram e que prefiro por enquanto não tratar em público.

MI – Costuma falar com seus seguidores sobre o problema. Qual tem sido o impacto para si e outras pessoas?

EP – Descobri que existem muito mais pessoas a sofrer de depressão do que algum dia poderia imaginar. Percebi que em Cabo Verde são mais as jovens a sofrerem da doença do que os homens. Havia esta necessidade de se identificarem. E graças aos meus testemunhos, dizem que começaram a perceber os sintomas que tinham e procuraram por ajuda. São muitos que passaram a desabafar comigo. Contam-me as suas histórias e tem sido uma relação de inter-ajuda entre nós.

MI – Ao mesmo tempo que faz terapia para este mal que a aflige, não pára de trabalhar. Conta-me sobre a gravação do seu novo video-clip?

EP: A música é de igual modo a minha terapia. Vou lançar o videoclipe denominado “Diabona”. Este trabalho reflete o jeito que me vejo, como pretendo ver-me no futuro e como gostaria que todas as mulheres se vissem também. Depois de conhecerem a letra, as pessoas podem pensar que sou intxada e que me acho top. Mas ela reflete como espero que todas as mulheres se sintam e espero que se apoderem da música, como se tivesse sido escrita por elas e sobre cada uma.

MI – O lançamento, já tem data?

EP – Dentro de um mês e pouco vai estar disponível.

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