Artesãos negam abrir portão do Quintal das Artes e CMSV aceita marcar reunião para consenso

Os artesãos associados do Quintal das Artes e a Câmara de S. Vicente marcaram uma reunião para esta tarde com o intuito de chegarem a um consenso sobre o uso futuro desse espaço e colocar uma pedra sobre a polémica instalada entre as partes. Esta foi a opção encontrada para acalmar os ânimos, após os artistas terem negado redundantemente abrir o portão para permitir o início das obras do novo assentamento para as peixeiras. Uma medida contestada pelos artistas, que discordam do projecto apresentado pela autarquia. Alegam que as suas actividades profissionais passarão a ficar muito limitadas e alertam para o risco de contaminação do pescado devido ao uso de materiais poluentes.

Esta manhã o clima esteve bastante tenso em frente ao Quintal das Artes. Perante a determinação dos artesãos em manter a porta trancada, a CMSV enviou elementos da Polícia Municipal para o local e pediu reforço da própria Polícia Nacional. Após horas de impasse, as autoridades ameaçaram arrombar o portão, mas as partes acabaram por acordar em fazer um encontro pelas 14 horas e 30 minutos no Paços do Concelho com o fito de chegarem a uma plataforma de entendimento. Em princípio, a reunião deve contar com a presença da Associação das Peixeiras de S. Vicente, uma das partes interessadas no assunto.

Antes, no entanto, Maiuca Gomes assegurou à reportagem do Mindelinsite que não iriam abrir o portão se a CMSV teimasse em avançar com o projecto sem ouvir os 15 artesãos que actualmente utilizam o espaço. “Queremos o diálogo para podermos abrir a porta de forma consciente”, disse o artesão, que estava  na rua a representar os colegas que ficaram dentro do quintal. Maiuca deixou claro que o grupo está a lutar para preservar as suas actividades sem as limitações que passarão a existir com o projecto elaborado pela CMSV.

“A nossa proposta era que mantivessem o plano que nos apresentaram no primeiro momento. Com o novo projecto vão afectar a nossa liberdade de trabalhar porque vão barrar os nossos ateliers. Além disso já não poderemos dar as nossas aulas de percussão e tão pouco o grupo Flores do Mindelo poderá construir aqui as suas alegorias”, comenta Maiuca Gomes, que levanta ainda a questão do perigo que a venda de peixe nesse espaço pode representar para a saúde pública. Aliás, a seu ver, juntar peixe e arte no mesmo espaço não é boa ideia.

Para Alcindo Vasconelos, a situação reinante é resultado de uma comunicação deficiente entre a CMSV, a associações dos artesãos e a associação das peixeiras. “Temos de sentar-nos à mesa e conversar”, defende o presidente da Associação dos Artesãos do Quintal das Artes. Recorda que antes da tempestade Erin, a Câmara de S. Vicente abordou os artesãos para falar do projecto de assentamento das peixeiras no Quintal das Artes devido as obras de reabilitação em curso no mercado de peixe. Salienta que os artistas acabaram por aceitar a ideia no primeiro instante, mas depois viram que seria uma péssima ideia juntar as duas actividades. Além da limitação que os artistas iriam sofrer na sua cadeia de produção e até de venda, levantam a questão do risco de contaminação do pescado.

Questionado se os artesãos aceitam ir para outro espaço, Vasconcelos responde que esse antigo edifício é o melhor sítio onde podem ficar. Relembra que o Quintal das Artes está actualmente inserido na rota do turismo devido ao trabalho executado pelo grupo de artesãos, pelo que sair dali iria trazer mais perdas para esses profissionais.

Associação de peixeiras em posição “desconfortável”

Toda esta polémica, segundo Eloisa Mota, colocou a Associação de Peixeiras de S. Vicente numa posição desconfortável. Primeiro porque, diz, estão por fora da obra que a CMSV pretende fazer no espaço. Segundo porque as peixeiras não veem também com bons olhos misturar pescado e artesanato.

“Estamos a sentir-nos desconfortáveis e já solicitamos uma reunião geral, com a CMSV, Banco Mundial e os artesãos para falarmos abertamente sobre a situação”, diz a presidente da associação de peixeiras Eloisa Mota lembra que o acordado com o Banco Mundial é que as peixeiras não iriam deixar o mercado enquanto não fosse construído um reassentamente digno. Salienta que as peixeiras tiveram essa precaução porque antes da pandemia da Covid-19 aceitaram sair do mercado com a promessa de que seria realizadas obras e ficaram desamparadas até hoje.

As vendedeiras, acrescenta Eloisa Mota, já realizaram várias intervenções no mercado, como, por exemplo, a colocação de arcas, mas assegura que a maioria está neste momento a vender pescado nas ruas da cidade do Mindelo. Na sua perspectiva, elas não deveriam sair do mercado sem uma opção clara e válida.

Relembra que, quando foi colocada a hipótese de passarem para o Quintal das Artes disseram que era errado retirar os artesãos para irem ocupar o espaço. “Mas disseram-nos que os artesãos não seriam expulsos, que haveria uma arrumação para acolher toda a gente. Neste momento não sabemos com segurança como a situação se encontra porque não tivemos ainda nenhum encontro com os artesãos. Aliás, estamos a solicitar um encontro geral para que todas as partes fiquem bem informadas do que se passa”, relata a porta-voz das peixeiras de S. Vicente. Na sua perspectiva, a venda de peixe poderia passar a ser feita na Torre de Belém, réplica que fica junto ao mercado de peixe. Deste modo, diz, o assunto ficaria resolvido.

Para o artista Silvério Delgado, a CMSV deve ajudar os artesãos a manter a sua actividade como tem vindo a acontecer ao longo destes mais de 20 anos que utilizam o espaço, sem transformar o quintal num posto de venda de peixe. Sublinha que o espaço tem potencialidade turística, que pode desaparecer com essa medida. Além disso, iria afectar a capacidade criativa dos artistas. Daí apelar a uma atitude mais sensível da parte da autarquia, para que seja uma parceira dos criadores da arte na cidade cultural do Mindelo.

A reportagem do Mindelinsite tentou ouvir os elementos da CMSV presentes à porta do Quintal das Artes, mas disseram que não tinham autorização para falar com a imprensa.

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