Por: Armindo Gomes (Jurista)
O PAICV, embora partido menos votado no pleito eleitoral no Município de São Vicente, estranhamente lidera a oposição na Câmara através do Vereador Albertino Graça. Esse partido, com a ajuda da UCID, instalou uma geringonça na Assembleia Municipal e agora quer convencer os incautos que a tentativa de anarquia que pretenderam instalar na Câmara poderá destituir o Presidente Augusto Neves do cargo para que ele foi eleito pelo veredito popular através do sufrágio livre e universal.
Considerando a tese de que a razão está do lado de Augusto Neves, certamente a oposição cometeu um error iuris. Todavia, entendo que esse erro jurídico não deixa de ser um expediente dilatório para adiar o problema sine dia. A solução inicial creio que seria o recurso ao Tribunal competente para pedir a anulação do ato administrativo efetuado e considerado ilegal e até inconstitucional. A última saída que foi a denúncia à Procuradoria da República e tudo o que foi feito atrás, penso, não deu em nada nem irá dar – “a montanha pariu um rato”.
O PAICV, embora partido menos votado no pleito eleitoral no Município de São Vicente, estranhamente lidera a oposição na Câmara através do Vereador Albertino Graça. Esse partido, com a ajuda da UCID, instalou uma geringonça na Assembleia Municipal e agora quer convencer os incautos que a tentativa de anarquia que pretenderam instalar na Câmara poderá destituir o Presidente Augusto Neves do cargo para que ele foi eleito pelo veredito popular através do sufrágio livre e universal. Augusto Neves não dá sinais de cedência em nenhuma direção, nem perante uma inspeção que assombrou a sua Câmara inesperadamente e que se alinhou pelo mesmo diapasão do PAICV/UCID. Estes dois partidos perdedores das eleições autárquicas querem decidir o destino da ilha do Porto Grande.
Certamente, duas questões podem ser colocadas neste imbróglio: primeira – como será a governação da Câmara até o término do mandato? A resposta é taxativa – até o fim deste ano, o governo da câmara continuará tranquilamente a trabalhar sem a oposição pois todos os instrumentos de gestão para o ano 2022 foram aprovados desde finais de 2021. No resto do tempo até o fim do mandato, a Instituição será gerida no sistema de duodécimos, mesmo sem a aprovação dos orçamentos e do plano de atividades para os dois próximos anos; Segunda – toda esta trapalhada não prejudica a imagem de Augusto Neves, do MpD e de São Vicente? A resposta é obvia – claro que sim. Porém, há uma linha vermelha que não pode ser ultrapassada sob o risco de Augusto Neves deixar de presidir a Câmara e transferir para a oposição o poder que lhe foi conferido nas urnas pelos Mindelense.
No tocante ao MpD, caberá ao partido abrir espaço de dialágo com as lideranças desses dois partidos e, caso houver vontade política e bom senso, eles têm a obrigação de ultrapassar essa situação por via negocial.
Finalmente, resta esclarecer o erro júris dos defensores da alegada ilegalidade e inconstitucionalidade do acto administrativo efetuado pela Câmara Municipal, que originou a aprovação de duas deliberações no dia 02 de janeiro de 2002, e a consequentemente alegada inconstitucionalidade superveniente do Estatuto dos Municípios aprovado pela Lei n˚134//IV/1995, de 03 de Julho.
Ora, vejamos: reza o art˚48 dos referidos Estatutos do Municípios que “As deliberações dos órgãos municipais são tomadas por pluralidade de votos”. A rácio legis desse artigo atribui a possibilidade de uma deliberação camarária ser aprovada com maioria simples dos votos expressos. Interpretando este preceito legal, somos a concluir que, numa votação na Câmara em que estejam sobre a mesa três propostas: A – B – C, para serem apreciadas e decididas com a participação de todos os nove membros da Câmara, e 4 votarem a favor a proposta A, 3 votarem a proposta B e os outros 2 votarem a proposta C; a proposta A – com quatro votos – sai vencedora na votação. Assim, a deliberação a ser tomada vai no sentido de se aprovar a proposta A com quatro votos favoráveis.
Prossigamos com uma hipótese extrema: um Vereador apresenta à Câmara uma proposta para análise, discussão e votação. Dos nove membros presentes nessa sessão, 8 abstiveram-se e o proponente votou a favor; essa decisão de um único é válida e constitui uma deliberação para todos os efeitos legais tal como uma votação proferida por maioria qualquer. A oposição e os pseudo iluminados criaram uma inexata ideia de separar quórum para reunir, de quórum para deliberar.
Sendo o conceito de quórum: o número de membros necessário para um órgão coletivo pode se reunir, certamente um órgão coletivo poderá reunir, e não deliberar. Todavia não estaremos a falar de quórum quando o legislador define uma maioria para se poder deliberar ou aprovar uma decisão. Alguns autores consideram que, quando se fixa uma maioria para se votar, estamos perante quórum para votação. Nada mais erróneo.
Seguramente, quórum, maioria e deliberação são conceitos diferentes e não se confundem. As deliberações são decididas por maiorias, proferidas e apuradas pelo voto dos participantes numa reunião. As votações podem conduzir a aprovação ou não aprovação das questões submetidas ao escrutínio dos membros do órgão coletivo. As aprovações das deliberações são conseguidas por maiorias e estas podem por pluralidade de votos, também designado maioria simples, maioria absoluta e maioria qualificada, sendo que esta última pode ter valores e parâmetros diversos.
A inconstitucionalidade declarada pela oposição e seus acólitos, agindo como se de Tribunal Constitucional se tratasse, constitui mais um error júris. Ora, vejamos: invocam inconstitucionalidade por violação do artigo 121˚, n˚1 da Constituição, que prescreve que: “Os órgãos colegiais podem funcionar com a presença de pelo menos um terço dos seus membros, mas deliberam com a presença da maioria dos seus membros.” Porém, da interpretação sistemática da nossa Lei Fundamental depreende-se que este artigo só se aplica aos órgãos de soberania nacional, isto é, os órgãos colegiais previstos no art˚119˚da nossa Lei Magna em questão, que são: a Assembleia Nacional, o Governo e os Tribunais coletivos.
A Constituição na sua parte V regula a ORGANIZAҪÃO DO PODER POLÍTICO (artigos 119˚ a 269˚). No título VI dessa parte estão estatuídas as normas constitucionais sobre o Poder Local, prescritas nos artigos 230˚ a 239˚. São esses os preceitos materialmente constitucionais que traçam os princípios orientadores do Poder Local, sendo que as atribuições e organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos são reguladas por lei, conforme reza o artigo 238˚, n˚1 da Lei Fundamental do Estado. A lei ordinária que regula as questões atrás referidas é fundamentalmente a Lei Quadro da Descentralização Administrativa (Lei n.˚ 69/VII/2010 de 16 de Agosto), os Estatutos dos Municípios (Lei n.˚134/IV/95 de 03 de Julho) e os Estatutos dos Eleitos Municipais (Lei n.˚ 14/91, de 30 de Dezembro.
Resumindo e concluindo: inventar inconstitucionalidade onde ela não existe não resolve o problema do impasse verificado na Câmara Municipal de São Vicente.
Mindelo Outubro de 2022.