Por: António Santos
O incêndio na Serra da Malagueta, em Santiago, que provocou nove mortes, demonstrou claramente a ineficácia do Sistema Nacional de Proteção Civil cabo-verdiano, assistindo-se a um “empurrar de culpas” entre autarquia local e o poder central.
Fico triste pelos últimos acontecimentos que demonstram, de uma forma perentória, que a segurança das populações, assegurada pelas proteções municipais e centrais, em que vez de progredir, tenha regredido, o que é lamentável.
Em comparação aos primeiros anos da Proteção Civil, nos finais dos anos noventa, assistiu-se a um retrocesso, tanto em termos de formação de recursos humanos como em termos de aquisição de equipamentos.
Participei na primeira formação em Proteção Civil realizada em Cabo Verde, numa sala do Palácio do Governo. Foi uma experiência louvável e gratificante para um jovem recém-chegado da formação na Alemanha. Comigo estavam o António Marino Dias , Alberto Fernandes e Valdemiro Alves.
O curso foi dado pelo então presidente da Nacional Proteção Civil de Portugal, que fez questão de sublinhar que os autarcas são os “primeiros responsáveis pela proteção civil em cada concelho”. Aliás, até contou um episódio que se passou com ele. Num incêndio num determinado conselho português, o presidente do município exigia a presença da proteção civil nacional, esquecendo que a primeira pessoa da proteção civil do conselho era a pessoa que criticava o serviço nacional.
De facto, tanto em Cabo Verde como em Portugal os autarcas são os primeiros responsáveis pela Proteção Civil concelhia. Neste momento, como aconselha o Presidente da República, José Maria Neves, o que interessa é refletir e dar mais condições para que a Proteção Civil tenha mais meios para combater os incêndios.
Apesar de estar de acordo com o senhor Presidente da República, não posso deixar de lamentar que, durante todo este tempo, não tenha aparecido nenhum dos presidentes das Câmaras destes dois concelhos, o que demonstra um total desconhecimento e desorganização.
Tudo isto demonstra que não existem planos emergência. Também é lamentável que os ministros da área só apareceram um dia depois dos acontecimentos do dia 2 de abril.
Meus senhores, temos de prevenir, planificar e praticar simulacros. Não é “depois da casa assaltada que metemos trancas à porta”, para remediar o irremediável. Decorrido quase um mês desse triste acontecimento, não houve nenhuma demissão nem no Governo, nem na Proteção Civil e, uma vez mais, ficou claro e patente que não existem planos emergência, equipamentos etc.
Por isso é que estou de acordo com a posição do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) ao responsabilizar o Governo pelo incêndio no Parque Natural Serra Malagueta (PNSM) e ao afirmar que este sinistro “demonstrou igualmente a ausência de meios no país”.
“É preciso assacar responsabilidades e fazer justiça, para honrar aqueles que morreram, para responder ao clamor das populações, para devolver a autoestima dos cabo-verdianos e para salvar o Estado de Direito. A tragédia de Serra Malagueta deixou escancarado um país sem as condições para enfrentar crises desta natureza”, acusou o PAICV na sua declaração política da primeira sessão parlamentar de abril, lida pela deputada Carla Carvalho.
Da mesma forma que o PAICV, também eu digo, que temos de dizer, que um Governo que não consegue proteger as populações nos propósitos por que foi instituído, deve agir em consequência.
Também estou de acordo com o Presidente da República, José Maria Neves, quando este pede uma “aprofundada avaliação” do Sistema Nacional de Proteção Civil após este incêndio.
É, realmente, necessária uma aprofundada avaliação de todo o Sistema Nacional de Proteção Civil, de modo a identificar eventuais fragilidades e constrangimentos que prejudicam o seu desempenho e propiciar medidas de política orientadas para a melhoria global do sistema.