Por Albino Sequeira
O Estado corresponde a uma comunidade de cidadãos politicamente organizada, mas também a uma estrutura organizada de poder e ação — que se manifesta através de órgãos, serviços, relações de autoridade, estrutura que se destina a garantir a convivência ordenada entre os cidadãos e manter a segurança jurídica. O Estado consegue fazê-lo porque regula vinculativamente a conduta da comunidade, ou seja, cria normas e impõe a conduta prescrita, inclusivamente a si próprio. Neste sentido, a estrutura organizativa a que chamamos Estado deve obediência ao direito — isto é, cria direito e vincula-se a ele —, não sendo outro o sentido da expressão “Estado de direito”.
Não existe, portanto, a ideia de poder legítimo sem a ideia de direito, pois o direito legitima o exercício do poder, na medida em que o controla e modera. Por isso, a expressão “Estado de direito democrático” significa que o exercício do poder público está submetido a normas e procedimentos jurídicos (procedimentos legislativos, administrativos, judiciais) que permitem ao cidadão acompanhar e eventualmente contestar a legitimidade (i.e, a constitucionalidade, a legalidade, a regularidade) das decisões tomadas pelas autoridades públicas, o que significa que o exercício do poder se baseia na participação popular.
Aquela participação não se limita aos momentos eleitorais, mediante “sufrágio universal, igual, direto e secreto”, mas implica também a participação ativa dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais, o permanente controlo/escrutínio do exercício do poder por cidadãos atentos e bem informados, o exercício descentralizado do poder e o desenvolvimento da democracia económica, social e cultural — ou seja, a responsabilidade pública pela promoção do chamado Estado social: a satisfação de níveis básicos de prestações sociais e correção das desigualdades sociais.
Face ao que precede, sendo Cabo Verde um Estado de Direito Democrático decidi escrever este Artigo sobre as Relações do Presidente da República com os Demais Órgãos de Soberania.
O Presidente da República é o garante da unidade da Nação e do Estado, da integridade do território, da independência nacional e vigia e garante o cumprimento da Constituição e dos tratados internacionais.
Dessa forma, nos termos da Constituição, ele “representa a República de Cabo Verde”, interna e externamente.
Uma vez eleito para garantir a estabilidade política, promover e assegurar a unidade nacional, e o bom funcionamento das instituições democráticas, jura por sua honra desempenhar fielmente o cargo, que lhe é confiado pelo povo, defendendo, cumprindo e fazendo cumprir a Constituição da República de Cabo Verde.
A eleição do Presidente da República garante-lhe o exercício das suas funções sustentadas nas competências que lhe confere a Constituição.
No desempenho do seu Cargo, nos termos da Constituição, é considerado o Comandante Supremo das Forças Armadas.
Na assunção da ocupação da Presidência da República de Cabo Verde, preside ao Conselho da República, ao Conselho Superior de Defesa Nacional e ao Conselho Superior das Ordens Honoríficas.
Ouvido o Conselho da República, os partidos políticos com assentos parlamentares e nos termos da lei eleitoral, o Chefe de Estado marca as datas das eleições democráticas no País, tanto do Presidente da República como dos Deputados da Assembleia Nacional.
Quanto à relação da Presidência da República com os demais órgãos de soberania é estabelecida constitucionalmente pelo princípio da separação de poderes e interdependência daqueles órgãos. Isto é, cada órgão de soberania tem os seus poderes e não podem interferir nas competências destes, podem sim, cooperar entre si para manter a estabilidade do País.
Neste ângulo, cabe-lhe nomear o Primeiro-Ministro, escutando as forças políticas com assento na Assembleia Nacional e tendo em conta os resultados das eleições. E, de seguida, nomear ou exonerar os restantes membros do Governo sob proposta do Chefe do Governo. Pode, ainda, presidir ao Conselho de Ministros, caso for solicitado pelo Primeiro-Ministro.
No caso de aprovação de uma moção de censura ao Poder Executivo, ouvidos os partidos com assento na Assembleia Nacional e o Conselho da República, o Presidente pode demitir o Governo, caso se torne necessário para assegurar o funcionamento do País, não colocando em causa o funcionamento das instituições públicas.
Acrescenta-se nas competências do Presidente da República a nomeação do Presidente do Tribunal de Contas, sob proposta do Governo, de igual modo nomear o Procurador-geral da República, sob proposta do Governo. E, ainda, nomear e exonerar, sob proposta do Poder Executivo, o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas e o Vice-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas, quando exista.
Relativamente às relações do Presidente da República com a Assembleia da República, ele pode:
1- Dissolver a Assembleia Nacional, nas seguintes condições; a) rejeitado duas moções de confiança ao Governo ou b) aprovado quatro moções de censura ao Governo. O Parlamento poder ser ainda dissolvida em caso de crise institucional grave, consubstanciada no facto de se mostrar praticamente impossível assegurar, de outra forma, o regular funcionamento das instituições democráticas, devendo o ato ser precedido de parecer do Conselho da República.
2 — Promulgar e mandar publicar as leis, os decretos-legislativos, os decretos-leis e os decretos-regulamentares.
3 — Vetar os diplomas aprovados na Assembleia, no prazo de trinta dias contados da receção para a promulgação, caso entenda que haja inconstitucionalidade nos documentos aprovados, para fazer valer a Constituição.
Quanto às Relações do Presidente da República com os Tribunais, o Presidente da República designa o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de entre os juízes que o integram, sob sugestão dos seus pares; nomeia um juiz para o Conselho Superior da Magistratura Judicial; nomeia o Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial, sob proposta dos membros deste órgão; indigita sob proposta do Governo o Presidente de Judicatura de Contas; requere ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da Constitucionalidade ou da legalidade das propostas de referendo ao nível nacional, e solicita ainda àquele órgão, a apreciação preventiva da constitucionalidade dos Tratados Internacionais e a fiscalização da conformidade das normas jurídicas.
O Presidente da República é um elemento simbólico e cerimonial do Estado.
As competências, os requisitos para eleição do Presidente da República, os seus âmbitos nas relações internacionais são definidos pela Constituição, Regulamentos, Estatutos e Código de Conduta.