O poder político advém da autoridade ou a força que conferimos a outrem, através do voto, para exercer, em nosso nome, ações, tomada de decisões, representação e um conjunto de forças advenientes das leis em um Estado de Direito Democrático, como pretendemos que seja o nosso. Pois, política é poder. Dela fazem parte a negociação, a persuasão, a sedução e a crença que pode ajudar a melhorar a vida da coletividade. Contudo, há paradoxos.
Por: Nelson Faria
Idealmente queremos acreditar que esse poder é outorgado por reconhecermos nos proponentes escolhidos empatia, inteligência social, valências nas características pessoais dos indivíduos e, também, o entendimento de que o poder é um privilégio, temporário, que possibilita servir e melhorar as vidas dos outros. Todavia, nesta perspectiva, igualmente, os paradoxos, as contradições, são mais que evidentes.
Chegados ao poder, não são raros os casos em que o detentor acha ter algo parecido com uma força vital, infinita, se calhar um novo Deus, que o empurra para atingir seus objetivos pessoais e de grupos, que faz com que corra mais riscos sobre a notoriedade do carácter que lhe fez ascender ao poder, agindo, geralmente, de forma egoísta, impulsiva e agressiva. O poder torna as pessoas mais propensas a agirem como sociopatas, reduzindo seus níveis de empatia e reforçando comportamentos socialmente inapropriados. Assim nos dizem os autores especialistas no estudo do poder, Dacher Keltner e Heni Ozi Cukier.
Dizem ainda que a experiência do poder impulsiona o indivíduo para uma de duas direções: Abuso de poder, às vezes até involuntariamente, impulsividade e ações antiéticas ou o comportamento benevolente que promove o bem maior. O poder não transforma, não muda a moral e a ética. Ele tira os freios, alavanca aquilo que já existe. Ninguém torna o que não é porque chegou ao poder, a não ser que já tivesse essa propensão. Portanto o egoísmo, a arrogância, e a sobranceria, a falta de empatia não advém do poder, mas sim do indivíduo.
Pior se torna quando não há controle, freio e limitação desse poder. Pior é quando o indivíduo já se confunde com o poder e dono dele, ignorando o seu verdadeiro dono, eventuais outras forças de controle, quem o elegeu e representa, e, mesmo, os seu pares. É neste sentido que sou inteiramente contra a continuidade de exercício do poder Municipal por mais de dois mandatos, podendo cada mandato ser de cinco anos cada, à semelhança do que já acontece com a limitação sobre a Presidência da República, o órgão maior de representação da nação cabo-verdiana. Inteiramente contra a criação de confusão das instituições com as pessoas, do endeusamento de quem apenas fez bem o seu trabalho e da criação de dinossauros, tubarões, malfeitores e autocratas.
Embora conhecendo a nossa realidade, sabendo que os métodos, as artimanhas e definição de escolhas dos indivíduos para exercício dos poderes está prenhe de jogos de interesse, não necessariamente o público, quiçá, nem das forças políticas em alguns casos, é tempo de ser corrigido os erros visíveis da nossa sociedade sob pena do poder e da sociedade perderem credibilidade. Sob pena de nunca chegarmos ao patamar de Estado de Direito Democrático almejado e os interesses da coletividade serem secundarizados, senão menosprezados e caminharmos para a perda da paz social que tanto prezamos.
Creio que o “pormaior”, é mesmo a necessidade de escolhas de indivíduos proponentes ao poder detentoras de perfis adequados, que “não deixam o poder subir a cabeça”, que não percam lucidez e o objetivo do seu exercício, que o façam com verdadeira humildade, com humanidade, com empatia, com foco nos outros, a que se serve enquanto poder, incluindo e integrando todos, mesmo os desafetos, empoderando pessoas com liderança servidora e compassiva, pois, é possível exercer o poder, qualquer que seja, de forma leve e tranquila, em harmonia com o meio.