Ó broda, ranjame um moeda lá

Por: César Fortes

Hoje estou feliz, pois está um lindo dia de sol. Vou passear um pouco para “desprajar” a vida.

Passei perto do bar “Lion Tauss e Lizy” e vi um grupo de pessoas numa janela, assistindo o jogo do F.C.Porto e Portimonense. Encostei atrás de um jovem e lá fui eu, também, espreitando o resultado. Não demorou nem dois segundos e o Porto marcou. E eu, que sou benfiquista, pensei em voz baixa:

Caramba pá. Já começa. Porto já “ptas ele”.

Os portistas gritaram:

Goooolo!

E do meio do grupo, um rapaz volta para mim e diz:

Ó brother ranjam 50 paus lá tcham comprá um grogue pa festejá esse golo de Porto.

Eu vendo para a cara de lata dele, respondi-lhe:

Adé brother. Porto ta marcá e bô ta otchá que justim mim, um benfiquista, é cti tá bem isdobe a festejá? Largame da mon! Bai espial na ote ponta.

Lembrei-me que tinha de ir comprar um queijo no supermercado Pilar Vermelho.

Na porta, encontrei um homem de meia idade, de cara forrada de barba e com um pé embrulhado com ligas, aguentando em duas muletas que me interpela:

– Ó brother, tchame dobe um fala lá. Com o devido respeito, bô tava podê ranjam um bolsa de massa pame fazê um “bodji”.

– Não, neste momento não consigo ajudar-te.

Eu já tinha ouvido que ele pede dinheiro na porta do supermercado de segunda a sexta-feira e, no sábado e domingo, ele anda sem muletas para cima e para baixo bebendo o que ele lucrou nos dias da semana.

Continuei descendo avenida da Holanda e um rapaz grita-me do outro lado do edifício da Telecom:

Manera nha brother? Esperame lá tcham dobe um novidade.

Eu que conheço toda gente, tinha certeza que este “brotha man” queria era engatar-me umas moedas. E lá ele continuou com o seu paleio:

Bô sabê, nhá amdjer que bô oiá nôs ontem teve um par de gémeos e ela tá na hospital há 15 dias.

Alguma coisa não bate certo. Se os vi ontem como é que ela está no hospital há 15 dias. Mas, deixei-lhe continuar a sua tentativa:

As crianças estão a toda hora a cagar e não há fralda que aguenta. Consegues arranjar-me 500$00 para comprá-los umas fraldas? Como pai, não consigo vê-los assim.

Um amigo meu já me tinha contado essa história desse rapaz que diz que lhe nasceu gémeos a toda hora. Pensei logo e lhe respondi:

Ó rapaz, bô tudo semana ti ta nascebe gémeos. Se continuá assim bô ta bem povoá Soncente de gémeos.

Ele olhou-me com cara de quem tinha comido uma “papa de farinha de trigo com malagueta” e seguiu o seu caminho.

Perto do liceu Ludgero Lima encontro outro homem com cara dos seus “cinquenta e tal quase setenta” que vem ter comigo e diz:

Meu amigo fomos colegas na primária, jogamos futebol juntos no campo de Bela Vista. Ranjam 100 paus lá pam bai aquecé corpo.

Acho que me estás a confundir.Tu eras da turma B. Tu eras da turma de Adão e Eva.

Ele olhou-me com cara de “fambil” e disse-me:

Ok, brother. Estode na bô lugar que mta fcá na de meu.

Acho que ele queria dizer era “fcá na bô turma que mta fcá na de minha”. Como já não queria irritá-lo mais, continuei o meu passeio até a praça de Dr. Regala onde encontro um rapaz que, chamando-me pelo nome diz:

M’tava gostá de ser bô guarda costas se bô quiser. Ranjá um gajo lá um 100 paus, de favor. Depois bô ta descontal na vencimento.

Pessoal tá criativo, pá.

Respirei fundo e continuei a minha caminhada. Fui em direção a praça Dom Luiz e encontrei um jovem que, de longe, grita-me:

Ó nha amigo, mfazé anos hoje. Bô ca ta dame um moeda pam comprá nhá prenda?

Ó rapaz, bô já bô dá velho sem dá novo. Todos os dias fazes anos.

Ele não ficou muito contente e partiu em direção a praia de Cachorro.

E eu fui à Praça Nova onde encontrei duas meninas “bnitinhas prop” e uma delas diz-me:

Bocê tava podê ranjame 500$00 pam bai comprá um ramede?

Sim, podemos passar numa farmácia e pago o remédio. Tens a receita?

Estás a desconfiar de mim?

Mim não. E bô, bô ti ta desconfiá de mim?

E lá foi ela um pouco desapontada. Parece que o dinheiro era mais para outro tipo de remédio.

Na praça, apanhei um taxi em direção ao cais para buscar uma encomenda. E quando o taxi pára, um homem aparece rapidamente, abre-me a porta, e, ao sair, ele pede-me dinheiro.

Adê broda, só pa abrim um porta já bô ti ta pedime dner? Assim nô ca ti ta bem podê.

Depois do caso, consegui uma boleia para a zona de Campim. Vejo cinco homens a caminho de Cova de Inglesa com uma grelha, uma cana de pesca, um balde e uma frigideira. E um deles enche-se de coragem e diz-me:

Ó irmão, ranjá nôs um 200$00 lá pa nô comprá uns cavala pa nô grelhá.

E respondi-lhe:

Como, bsot ca te bai pescá na mar? Ou bsot ta pescá é na terra?

Olhou-me com cara de “tambarina margoso” e continuou o seu caminho.

Continuei a andar e, perto do quartel dos bombeiros, encontro outro jovem com uma cara esgazeada, que me diz:

Ó senhor, tcham dá bocê um fala. Mim ca ta pedi ninguém dinher.

Ok, quer dizer que bô cá te bem pedime.

Não. Já tenho um arroz agora preciso de uma massa pa fazê um caldeirada na Covi.

Mas para comprar a massa tem que ter dinheiro. E como disseste, não irias pedir-me dinheiro. Eu não tenho dinheiro para dar-te.

Ele partiu desapontado com a sua própria frase.

E na avenida do cemitério estava a passar um funeral. Parei por um instante. Do meio da multidão sai um rapaz que me cumprimentou como se me conhecesse:

Ó senhor, bocê tava podê ranjame 200$00 que mta precisá pa bai fazé um sopa, pam tra boca de defunto?

– Não trouxe a carteira comigo. Fica para a próxima.

Ele apressou os passos e foi pedindo no meio da multidão. Já nem respeitam um funeral.

Lá continuei o meu caminho. Fui numa caixa multibanco perto do supermercado Fragata de Monte Sossego para tirar dinheiro para fazer uma compra e vi que um “broda” estava a observar-me de longe. Esperou-me tirar o dinheiro e foi atrás de mim. Como não sou parvo, andei rapidamente e entrei no bar do Clube Desportivo de Monte Sossego. Na saída ele veio ter comigo e disse-me:

Boa tarde, César. Mte bem dzeb um coisa mas mta até que vergonha. Bô tava podê ranjam lá 1.000$00 que mta mestê?

Mosse, se bô tava dzem antes mtava ranjobel. Mas m’entrá nesse bar grinhassim pa pagá Lena 1.000$00 que mtava ta devel. Jam ca tem mais.

Ele foi um pouco zangado, talvez por ter perdido o seu tempo atrás de mim. Ele queria engatar-me 1.000$00. Tudo?! Ele tava na troça, nem?

Cheguei em casa. E, quando era meia noite e alguns minutos, eu e o meu amigo Poi de nhô Mone estávamos sentados na pracinha em frente à minha casa. Neste momento passa um rapaz com cara de segunda-feira e diz-nos:

Boa noite, amigos. Estou com uma dor de dente que não me deixa dormir.

Aproveitei para lhe responder:

Yah brother. Dor de dentes é tramado mesmo. Porque não aproveitas e vais ao hospital?

Ele colocou a mão na boca fingindo sofrer e com a outra mão dizendo não, ele respondeu:

Mti ta espiá é se bsot tava dame 100$00 pam bai quemal cum grogue.

Eu e o Poi percebemos logo que, afinal, aquela história era uma manobra de engate. Uma dor de dente de grogue. Respondemos logo:

Grinhassim es bar ta tude fetchode. Bai té hospital es ta dobe um ramed.

Ele meteu as mãos no bolso e continuou o seu caminho, percebendo que, de nós dois, macacos velhos, não sairia nem um tostão. O pior é que ele nos conhece desde a adolescência e já deveria saber que deste mato não sai nem um coelho quanto mais dinheiro.

Ó Pói nô bai detá quê mundo cá ta bom.

Rimos como no tempo de liceu. Demos um abraço e ele foi em direção à casa dele.

Estou até com receio de ir dormir para que ninguém no meu sono vá ter a triste ideia de me pedir dinheiro ou dar-me um cravo.

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