Cientista Político, Político Cientista ou Político?

Por: Tomilson Neves

Na contemporaneidade, discussões acerca das ciências políticas devem despertar indagações e interesses dentro do campo académico. Esta temática, permeada por uma complexidade intrínseca, tem o dever de suscitar não só debates calorosos como abordar questões cruciais que impactam diversas esferas da sociedade, assim como pesquisas que enriquecem e contribuem para a evolução da área do saber.

A minha opinião é fruto de uma longa reflexão e uma análise da minha trajectória académica. É uma visão subjectiva quanto à ciência e à área de atuação que deveria ser o objeto de estudo, e não à “profissão”. Em relação à área profissional e o mercado de trabalho que envolve o cientista político, especificamente com relação ao caso de Cabo Verde.

O objetivo da explanação não é esgotar o tema, tampouco elaborar um ensaio, é sim, emitir uma franca opinião sobre o assunto proposto. Afinal, a Ciência Política e a profissão de cientista político são, para todos os efeitos, excepcionalmente importantes porque desempenham um papel crucial na compreensão e no aprimoramento dos sistemas políticos, promovendo a participação cívica informada e contribuindo para o desenvolvimento de políticas públicas eficazes e, por tais razões, não devem concentrar-se apenas ao redor de um ou outro lócus de atuação, mas expandir-se, conquistar espaço, isto é, conquistar editais.

Em Cabo Verde, a Ciência Política é referenciada diretamente à Política em si, ou seja, qualquer Cientista Político é visto aos olhos da maioria como sendo político. O que, de certo modo, não deixa de ser verdade, pelo fato de que a maioria dos jovens recém-formados parte para as estruturas partidárias e/ou para o exercício de funções ligadas directamente à Política.

Diante dessa realidade, surge a interrogação sobre o impacto desse fenómeno nas academias e nas pesquisas académicas em Ciência Política, outrossim na definição e execução das responsabilidades do cientista político. Este questionamento surge perante a necessidade de uma reflexão sobre o papel e as perspectivas dessa área do saber em Cabo Verde, considerando não apenas seu contexto político, mas também seu potencial contributo para o desenvolvimento da sociedade cabo-verdiana.           

É imperativo considerar que o cientista político estuda o funcionamento, a teoria e os resultados da política, o político cientista aplica métodos científicos na prática política e os políticos exercem os cargos políticos e lidam directamente com a implementação de políticas e a tomada de decisões. Atendendo que todos são importantes para o papel da evolução da ciência e da política nacional. A preocupação que se faz sentir é: como será a ciência política, sabendo que a maioria dos “ditos” cientistas políticos buscam a carreira política em vez de serem cientistas políticos?

O papel do político é vital, mas deve-se ter em conta de que várias das teorias são arcaicas e de que precisamos reformular novos conceitos e demostrar que esta é uma nova era, e, por conseguinte, precisamos criar novas teorias, traçar novos caminhos para o bem da ciência política e para o crescimento e desenvolvimento da política em si. É desta forma que poderemos moldar o nosso sistema político.

Em um mundo em constante transformação política é preocupante a escassez de estudos contemporâneos que buscam compreender as dinâmicas emergentes e os desafios enfrentados pelas sociedades, mais concretamente as de Cabo Verde. A falta de análises formais de peritos compromete nossa capacidade de responder de maneira eficaz aos dilemas políticos do século XXI.

Robert Putnam em um dos seus discursos disse: “O estudo e a análise actualizada são essenciais para entendermos os desafios políticos contemporâneos e desenvolvermos soluções eficazes para eles.”

É importante ressaltar que esta não é uma crítica aos cientistas políticos envolvidos na Política, é sim para com as constantes negligências do meio inserido, e com as idiossincrasias académicas.

As perguntas que pairam no ar são:

  1. Estão as academias a transmitir a real mensagem para os estudantes?
  2. Qual é o futuro dos cientistas políticos cabo-verdianos?
  3. Como se classificam e se posicionam os cientistas políticos cabo-verdianos contemporâneos e quais as suas contribuições?

Neste momento, é imperativo transcender os discursos reconfortantes típicos das salas de aula e enfatizar a existência de uma demanda real que necessita ser atendida por profissionais capacitados. Não podemos confiar exclusivamente na absorção pelo universo académico de todos os profissionais, nem depositar fé na sorte individual de cada um, pois isso poderia resultar na formação de indivíduos marginais ao sistema.

Motivados pela realidade concreta, evidenciada pelos editais de emprego ou pela falta deles, os cientistas políticos devem empenhar-se na busca pelo reconhecimento profissional, em vez de se preocuparem apenas com questões abstractas e disputas teóricas, cujo efeitos, por vezes, são infrutíferos. É pertinente questionar se essa formação esta de fato preparando os estudantes para uma carreira específica.

Afinal de que adianta fazer a formação em Ciência Política e enveredar para uma área distinta?

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