Por: Odair José Lopes Dias
Assunto: Funcionamento ineficiente e danoso do serviço de despacho das encomendas/remessas dos emigrantes na Alfândega de São Vicente.
Exmos. senhores,
Na condição de emigrante cabo-verdiano, são-vicentino, venho por este meio denunciar esta situação que é recorrente e lamentável, à qual temo-nos deparado há vários anos, sem que quem de direito se digne a trabalhar na elaboração de um plano e executa-lo, a fim de melhorar o referido serviço.
Senão, vejamos:
Ponto 1
Invariavelmente, a entrega de cargas/encomendas na Alfândega do Mindelo depara-se com dificuldades extremas nas ditas épocas altas (meses de Junho, Julho, Agosto e durante a quadra festiva de Dezembro), devido a uma péssima organização, aliás, uma organização danosa para quem se esforça, sacrifica e trabalha arduamente dia após dia para ganhar o seu sustento e ainda tentar ajudar os nossos que nunca deixamos para trás.
O meu grande desejo, e certamente de todo e qualquer emigrante, é que tenham o mínimo de respeito e consideração para com aqueles que tanto têm dado ao país, que sem nós a nossa pátria querida estaria um autêntico caos económico-financeiro em praticamente todos os sectores, quer pelas remessas quer pelas encomendas, quanto mais num tempo crítico como este que vivemos, que também não tem sido fácil nestes lados.
Lembrem-se que somos três vezes mais os cabo-verdianos fora do que dentro do país. A nossa força, aquilo que fazemos pela nossa gente é inestimável, portanto, misericórdia, tenham o mínimo de compaixão pela nossa luta. Ao menos, bom senso. Tentem perceber a nossa perspetiva, não pelos vãos discursos de que se preocupam, mas pela empatia com o que sentimos, pensamos e queremos fazer.
Ponto 2
Percebi por vários meios que os diversos intervenientes no processo (Alfândega do Mindelo, Enapor e Agências) têm-se divertido a atirar as culpas uns aos outros em vez de trabalharem juntos e em concertação na resolução do problema.
A burocracia, o descaso, os atrasos reinam enquanto, cedo ou tarde, recebem o pagamento pelo péssimo serviço prestado, ou não prestado. O vosso desprezo ao emigrante trabalhador é gritante!!!
Para nós emigrantes, sistematicamente, é demasiado tarde! Acabamos por ir e regressar ao país de acolhimento sem receber e usufruir dos nossos bens/pertences. É mais do que hora de compreenderem que a vida do emigrante é extremamente dura, trabalhosa e por vezes penosa, para quando visitarmos a nossa terra natal sermos tratados desta forma.
Para mais, temos vindo a perceber que viajar para nossa pequena ilha está-se a tornar um luxo… Companhias de transporte monopolistas, usurpadoras, a quem não deveríamos dar mais nenhum cêntimo do nosso suor! Não tomem medidas, enquanto é tempo, para os deter de roubar os cabo-verdianos, e, certamente será consequente. Queira Deus que possamos daqui em diante conseguir alternativas e libertarmos desta forma de dependência.
Ponto 3
Continuando, quero esclarecer que mencionei no início que esta carta é também endereçada ao senhor Presidente da Câmara Municipal de São Vicente, Dr. Augusto Neves, mas, entretanto, com todo o respeito que lhe devo, foi para constar e dar conhecimento, pois, com este senhor não conto. NÃO MAIS!
Dirige a Câmara da nossa linda cidade durante anos mais do que suficiente para ver tal situação, ser conivente e conveniente, tudo a acontecer na sua “barba cara” e nunca fez nada para alterar tal situação, nem uma palavra de indignação. Despreza os emigrantes que tanto têm dado para São Vicente, quer nos grandes momentos festivos quer na vida quotidiana.
Sou a favor de uma menor influência possível da política na vida dos agentes económicos, mas quando se justifica uma tomada de posição política esta deve ser tomada e, caso seja necessária uma equipa de trabalho que lidere esta mudança, deve ser criada para ajudar a resolver!
Infelizmente, São Vicente é “comandada” por um senhor que tem mostrado pouca abertura às opiniões dos outros. Continua seguindo com as suas ideias, mostrando inúmeras vezes um certo desdém daqueles que o contrariam.
Com todo o respeito que lhe devo, dou-lhe um conselho: passou a hora do senhor prestar mais atenção e escutar o seu povo! Se calhar, passou da hora de ir embora. A população votou em si, nas condições conhecidas, para a servir e não aos seus “egos pessoais”.
São Vicente foi outrora uma ilha de prestação de serviços, e digamos de passagem, pelo que me lembro, eramos muito competentes no que fazíamos. De mansinho foram eliminando os serviços públicos da nossa linda cidade deixando-a no estado em que está atualmente, sem que alguém de direito tomasse a vanguarda de defender a nossa população, a nossa ilha e o seu património, histórico, cultural, patrimonial, institucional, instrumental e o mais importante, INTELECTUAL!
Ficamos demasiadamente dependentes, expostos a um desastre enorme para a nossa população cada vez mais pobre e sem soluções!
Ponto 4
Portanto, faço hoje um pedido especial ao senhor Ministro das Comunidades, a quem já tivemos oportunidade de expor esta e outras adversidades desnecessárias para os emigrantes cabo-verdianos, mas que temos deparado, para que faça um especial favor a todos nós: pegue de uma vez por todas esta questão em suas mãos e ajude-nos a sermos recebidos dignamente no nosso país, na nossa ilha, pelas nossas gentes.
Ponto 5 – Ao emigrante e sua gente, ao cabo-verdiano
Esta carta foi muitas vezes escrita no plural (Nós), e esperando não ferir suscetibilidades, peço à nossa comunidade emigrante, e a todo o familiar/parente/amigo do emigrante, se este texto condiz com as vossas ideias e convicções, partilhem-na vezes sem conta nos mais variados meios de que disponham com a menção “assino por baixo!”
Cordialmente, com estima e consideração, queiram aceitar V. Excias o meu protesto e os meus mais sinceros cumprimentos,
Luxemburgo, 12 de Julho de 2022