Por: Nelson Faria
1. Quando se comemora 46 anos de independência e a nossa realidade gira à volta da procura de Heróis, melhor, procura-se amar a Deuses acima da racionalidade, do bom-senso, da paz social e do sistema democrático, não fico tranquilo. Naturalmente, se assim acontece é porque o percurso não foi inimpoluto e não está em ponto óptimo. Longe disso. “Alguma coisa errada não está bem, não correu bem” até esta data.
Se calhar, muitas coisas, se calhar, já atingimos o limite das coisas erradas… Mas serão resolvidas pela dogmatização de uma verdade absoluta vinda apenas de um pretenso Herói /Deus? Serão resolvidas pelo populismo exacerbado de partes convenientes? Não creio. Contudo, parabeniza-se a coragem deste momento por colocar em evidência o que vai e está mal nos atos da justiça e passos do Homem… Para os 46 desejo que o sistema democrático seja melhorado e revigorado em todas as suas vertentes, justiça inclusive.
2. Quis o destino que na comemoração destes 46 anos de independência estivéssemos a passar por situação de pandemia mundial da COVID-19 com consequências sanitárias e económicas nefastas. Da situação sanitária, creio que a ação governativa foi assertiva num primeiro e no terceiro momento. Sendo o primeiro momento o do surgimento da doença e casos em Cabo Verde. No segundo, o das eleições autárquicas, e, sobretudo, legislativas, ninguém esteve bem. A luta pelo poder, a ganância do poder, ainda vale tudo, até colocar em causa a saúde pública. Mau sinal para quem o quer e quem o apoia neste formato.
Neste terceiro momento, com a redução de casos, com vacinação massiva, é evidente que há melhor controlo da situação epidemiológica, porém não isentos de novos surtos com novas variantes. Também somos parte do mundo que vivemos. Ah, e já agora, o cidadão tem feito a sua parte para se proteger, quer nos cuidados a ter quer na procura da vacinação? Pois, não temos somente direitos. É preciso garantir que também cumprimos os nossos deveres neste contexto. As vacinas foram criadas para o bem. Que seja esta a perspetiva de todos e que tenhamos cuidado com as fake news que vacinam mal a cabecinha de muitos.
3. Se do plano sanitário parece que já controlamos a pandemia, com as devidas reservas, no plano económico e social parece-me de mais difícil controlo. As variáveis e fatores estruturantes não confluem a favor, os números, as informações e a realidade económica e social são o que são. Dúvidas? Basta ver as previsões de crescimento económico, aumento de desemprego e situação da dívida pública. Vai ser preciso saber ser resiliente em momentos que sacrifícios serão necessários. Que não falte boas lideranças, boas consciências e capacidade de reinventarmos além das criticas, agruras, reclamações, além das adversidades da realidade… E o que temos feito enquanto sociedade?
4. Aos 46 anos de independência realiza-se o Censo geral da população… Qual tem sido a atitude de parte dos cidadãos relativamente a este inquérito? É, outra vez, não temos apenas direitos, temos também deveres. O dever cívico de colaborar para nos conhecermos melhor é essencial. Penso que só assim, com dados e informação real, atual, poderão ser traçadas políticas assertivas que sirvam o país. Que nos conheçamos melhor aos 46 anos de independência, com a nossa colaboração.
5. Aos 46 anos de independência não procuro heróis porque estes já os tivemos a quando da independência. Não procuro deuses, nem semideuses. Não procuro verdade absoluta de uma única perspetiva. Valem os Homens imperfeitos, com bondade, com amor, com boa orientação para o bem-comum, com sentido de justiça, com sensatez. Quero a proteção do sistema democrático, suas instituições, que elas também façam e cumpram a sua parte, quero a paz e coesão social, mormente nesta circunstância, quero que Cabo Verde se realize e, dentro da nossa imperfeição, alcancemos o que melhor serve o país, a cada uma das ilhas e a todos os cidadãos.
Sempre e para sempre: amo Cabo Verde. Viva Cabo Verde!