Atenção! Preparem-se para o que aí vem…

Christian Lopes

O que é que eu antejo para os próximos meses? Em política, nada é por acaso. As palavras, os silêncios, as medidas anunciadas e até os gestos aparentemente espontâneos fazem parte de um roteiro cuidadosamente escrito, que é o da comunicação estratégica. E em Cabo Verde, à medida que nos aproximamos de um novo ciclo eleitoral, essa engrenagem começa a girar com mais intensidade.

O Orçamento do Estado para 2026, que será apresentado nos próximos dias, promete ser mais do que um simples documento técnico: poderá tornar-se numa boia de salvação política. É nele que o Governo tentará equilibrar contas e expectativas, mas também reconstruir narrativas, recuperar confiança e reposicionar-se perante o eleitorado. O último orçamento de uma legislatura é sempre o mais político de todos, e também o mais simbólico.

No caso do MPD, por exemplo, o desafio é evidente. Após um período de desgaste, falhas de comunicação e perda de ritmo político, o partido precisa de transformar o Orçamento numa mensagem de ação e esperança, capaz de inverter perceções negativas e recuperar o eleitorado que começou a dispersar. Não é apenas uma questão de políticas públicas. É, sobretudo, uma questão de comunicação política eficaz.

E como sempre acontece em anos pré-eleitorais, veremos obras aceleradas, inaugurações a torto e a direito, anúncios de investimentos e, quem sabe, anúncio de voos transatlânticos. Tudo a tempo de reforçar a ideia de dinamismo governativo. Acontece com todos os partidos políticos.

Por parte do atual PAICV, veremos um discurso mais popular e mais direto, com propostas apresentadas em linguagem simples, apelando à emoção e à proximidade. Algumas parecerão exequíveis, outras inevitavelmente serão de execução duvidosa, mas farão parte da estratégia de mostrar presença, empatia e alternativa.

Não será uma guerra, mas será um tudo ou nada político, em que ambos os grandes partidos procurarão marcar terreno para os próximos cinco anos.

Já a UCID deverá apresentar uma visão estratégica de médio prazo para o país, mas, essa proposta corre o risco de passar despercebida, porque Cabo Verde continua profundamente marcado pelo bipartidarismo. Ainda vivemos numa cultura política em que a lógica “verde ou amarela” domina o debate, e onde o voto em branco, a abstenção e as terceiras vias ainda não têm expressão significativa.

Os partidos sabem que o eleitorado se move tanto pela emoção como pela perceção. Por isso, as sondagens mensais assumem um papel determinante. Permitem medir o pulso ao eleitorado, identificar tendências e corrigir o rumo. São como um termómetro que indica se a narrativa está a funcionar, isto é, se o discurso convence, se a mensagem mobiliza, se o eleitor acredita.

Uma queda nas sondagens pode levar a um reajuste de discurso, a um gesto simbólico de aproximação, ou até a uma decisão surpreendente, como um indulto presidencial estrategicamente calculado.

Imaginemos, por exemplo, que o Presidente da República, José Maria Neves, decide conceder um indulto ao advogado Amadeu Oliveira. Seria apenas um ato jurídico ou também um movimento político capaz de gerar ganhos simbólicos e mediáticos? Na política, o simbolismo é tão poderoso quanto a ação. E as sondagens seriam o primeiro espelho dessa repercussão.

Outro caso curioso é o da aproximação visível entre Janira Hopffer Almada e Francisco Carvalho, que dificilmente será casual. À primeira vista, um simples gesto interno; mas, na leitura política, uma jogada de prudência ou mesmo de cálculo. Na política, alianças e distanciamentos são sinais que se lêem como capítulos de uma mesma história.

Tudo isto se enquadra numa lógica simples: a política é, em larga medida, comunicação. E a comunicação é estratégia. Por isso, os partidos reforçam equipas de assessoria, contratam especialistas em imagem e comportamento eleitoral, testam discursos e slogans, e monitorizam permanentemente as reações públicas. O que o eleitorado vê, e o que sente, é o produto final de um trabalho interno meticuloso, onde se cruzam dados, psicologia, economia e narrativa.

Mas há outro elemento que marcará o ciclo que se avizinha: o populismo em todas as frentes. Um populismo que, goste-se ou não, faz parte da política moderna. Ele surge quando o eleitor exige respostas imediatas, e os partidos procuram satisfazê-lo com soluções rápidas, muitas vezes mais comunicacionais do que estruturais. O populismo, em certa medida, é inevitável, mas o risco é quando se transforma em manipulação, levando ao descrédito das instituições e à perda de confiança na política como instrumento de transformação. 

Isso também se explica por uma certa falta de preparação cívica e política de parte do eleitorado, que muitas vezes confunde empatia com competência e promessa com solução. Sem uma cidadania mais crítica e informada, o populismo encontra terreno fértil para crescer.

Em Cabo Verde, tal como em muitas democracias jovens, a comunicação política ainda é muitas vezes reativa, feita ao sabor dos acontecimentos. Mas, à medida que o sistema amadurece, vai-se tornando mais estruturada. E é isso que veremos nos próximos meses: uma disputa não apenas de ideias, mas de narrativas. 

A batalha eleitoral de 2026 começou, de facto, muito antes da campanha inicial. E como cidadãos atentos, o nosso papel é justamente este: descodificar a política, explicar ao público o que está por trás dos anúncios, das medidas, dos silêncios e das manchetes.

Mostrar que, mais do que promessas, a política é um exercício de perceção e de tempo.

E que, muitas vezes, quem comunica melhor, governa mais tempo.”

Uma santa semana a todos vós.

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