A Escola de Samba Tropical explodiu na Rua de Lisboa na noite de segunda-feira com um desfile exuberante, ritmo vibrante e coreografias bem sincronizadas, após uma sucessão de problemas técnicos que provocaram um atraso de mais de duas horas. E por pouco não se deixou apanhar pelo tempo, reproduzindo assim o seu samba-enredo “A humanidade e o tempo – Oli futur ta bem panhób” . Valeu a pena, no entanto, porque o grupo soube compensar. Apresentou um enredo inspirado, com muito brilho e glamour, naquele que já está a ser considerado o melhor desfile da escola. David “Daia” Leite concorda que o grupo sonhou alto este ano para poder apresentar um espetáculo digno do Carnaval de S. Vicente
O presidente da Escola de Samba Tropical contou que foi muito difícil colocar este carnaval na rua por causa dos muitos problemas que antecederam o início do desfile, nomeadamente um black out no gerador, fio elétricos no caminho dos carros alegóricos, falhas de som e pouca luz na rua 5 de julho. Mas Daia diz esperar que o brilho e a beleza apresentados tenha compensado o atraso. “Aproveito para pedir descsulpas e para agradecer ao povo de S. Vicente que nos ajudou a ultrapassar as dificuldades enfrentadas na Praça Nova. Este nosso desfile só foi possível porque as pessoas nos incentivaram a avançar. Sonhamos alto e espero ter agradado o povo desta nossa ilha”, declarou.
Apesar dos percalços, Daia acredita que Samba Tropical esteve à altura e apresentou um desfile que fez jus às aspirações do grupo. “O retorno das pessoas é gratificante. Desde que entramos na Rua de Lisboa que fomos parabenizados e ouvi de muitas pessoas que este foi um dos nossos melhores desfiles. Sou suspeito, mas concordo. Trouxemos 1.200 foliões, distribuídos por 20 alas. Tivemos de aumentar o número inicial de 17 para 20 porque apareceram outras pessoas a pedir para fazer alas. Avaliamos as propostas e aceitamos porque entendemos que tinham capacidade”.
Para o presidente da EST, o Carnaval de São Vicente ganhou uma dimensão muito grande e as infraestruturas precisam acompanhar este crescimento. Cita, a título de exemplo, o sistema de som que, do seu ponto de vista, precisa continuar a melhorar. “O nosso carnaval está enorme, mas ainda há aspectos a melhorar. Por exemplo, tivemos o problema do gerador. Para conseguir energia para um carnaval desta dimensão temos de ter geradores mais potentes. É preciso mais investimentos. Os grupos têm de investir mais. Desde que tenhamos condições é possível. Todos os grupos têm interesse em ter o seu próprio património. E isso é possível desde que tenhamos apoios.”
Questionado se a escolha da rua 5 de julho foi acertada, tendo em conta que não está preparada, ou seja, não tem sistema de som instalado e nem luz adequada, Daia garante que foi uma estratégia bem pensada porque permitiu ao grupo organizar-se para explodir na Rua de Lisboa. “Se tivéssemos tidos todos estes problemas na Praça Dom Luiz o nosso desfile seria uma lástima. E sempre partimos da rua 5 de julho, este ano tínhamos carros alegóricos imponentes e tivemos problemas com os cabos. Mas conseguimos organizar, corrigir e chegar à Rua de Lisboa a beirar a perfeição”, avalia o presidente, que promete continuar a apostar em carros alegóricos. “Queríamos trazer três carros alegóricos, sendo que o último iria trazer uma tecnologia fora de série. Iria flutuar. O dinheiro não deu. Não conseguimos.”
Mnininha d’Praça Nova
Alheios aos problemas, uma das foliões mais experientes do grupo, Dona Ginau, com os seus 84 anos, era só alegria. Ao Mindelinsite, fez questão de frisar que já participou de todos os desfiles do Samba, exceto um por motivos familiares. E pretende continuar. “Este ano, infelizmente não vou estar no asfalto porque tive uma fratura na coluna no mês de abril passado. Graças a Deus estou a andar e é um prazer enorme estar aqui como ‘mninha d’ Praça’, lembrando outros tempos. Quando me convidaram, rejeitei por causa dos meus problemas de saúde. Sabe, a idade não perdoa. Mas, quando me disseram que viria sentada, aceitei de imediato. No meu tempo, fui ‘mnininha d’ Praça’ com orgulho. Trajávamos saias de prega ou gode, não usávamos luvas. Mas, como é Carnaval, ninguém leva a mal.”
Presença assídua nos desfiles do Samba, a emigrante Romana Ramos, que trouxe uma delegação constituída por dez pessoas dos Estados Unidos, incluindo alguns políticos, justifica a sua presença pela alegria, energia, senso de liberdade e também para ajudar a fazer crescer o Carnaval de S. Vicente. “Este ano vim acompanhada. Estas pessoas são parte da nossa comunidade cabo-verdiana de Pawtucket. Somos dois terços da população desta cidade e temos uma relação muito boa. Antes dizia-lhes a brincar que esta era a minha festa de aniversário. E acreditavam. Depois comecei a explicar-lhe a nossa cultura e o nosso Carnaval e pedi para me acompanharem. Agora aconteceu.”
Romana Ramos diz acreditar que, com a vinda desta delegação encabeçada pelo Mayor de Pawtucket, abriram-se muitas portas, tanto para Cabo Verde como para os Estados Unidos, isto porque criou-se uma troca entre S. Vicente e o Carnaval e a Cidade de Pawtucket. “Acredito que vai nos ajudar e muito. Estão a tirar muitas fotos e fomos acompanhados por um jornalista da PBS, que é um dos grandes canais de TV nos EUA, que transmitiu este desfile. O mundo já sabe que estamos aqui no Carnaval”.
Esta emigrante, que é membro da direção do Samba, disse que os americanos estão maravilhados com S. Vicente, e já estão a organizar-se para regressarem no próximo Carnaval, agora em número mais robusto. “Viram mais do que estavam à espera. Foram bem recebidos e ficaram impressionados com o público, com o nosso carnaval e com a limpeza da ilha de São Vicente. Estão muito satisfeitos.”
De referir que, a par do desfile, a delegação dos EUA teve encontros com o presidente da CMSV e o ministro da Cultura. Hoje volta a reunir-se com o ministro das Comunidades e com o Primeiro-ministro.